Depois de ver o ótimo Garota Sombria Caminha Pela Noite (2014)
estava curioso pelo próximo trabalho da diretora Ana Lily Amirpour. Com esse Amores Canibais parecia que a
realizadora conseguiria conciliar suas ambições artísticas com algo mais mainstream e facilmente vendável para o
público frequentador de multiplexes, mas infelizmente o filme falha nas duas
frentes.
A trama se passa em um futuro no
qual o governo dos Estados Unidos desenvolveu uma maneira bastante peculiar
para lidar com cidadãos indesejados. Eles são despachados para viver em um
deserto no Texas, isolados do resto do país e no qual as leis não tem validade
alguma, criando um ambiente brutal e hostil (pensem em Mad Max). Arlen (Suki Waterhouse) é uma dessas pessoas despachadas
para o deserto e chegando lá é capturada por uma tribo de canibais que cortam
seu braço e sua perna para comer. Mesmo com dois membros a menos, ela consegue
escapar e chega à cidade de Conforto. Meses se passam até que ela se recupere e
consiga uma prótese para sua perna, mas uma vez restabelecida, Arlen decide ir
atrás de quem a mutilou. Ela mata uma das canibais, mas fica com pena da
pequena garota que acompanhava a mulher e a leva consigo. O que Arlen não sabia
é que a menina é a filha de Miami Man (Jason Momoa), líder dos canibais, e ele
está disposto a qualquer coisa para recuperar a criança.
Por esse breve resumo parece que se
tratar de uma narrativa bastante movimentada, mas a verdade é que muito pouco
ocorre durante as duas horas de projeção. Isso em si não seria um problema, já
que narrativa lenta não é sinônimo de má qualidade, a questão é que mesmo a
lentidão e os longos silêncios tem muito pouco a dizer e a justificar a longa
duração do filme.
A opção por usar a montagem para
dilatar o tempo das cenas remete aos antigos westerns dirigidos por Sergio Leone e visam ressaltar o vazio e o
tédio daqueles espaços, bem como a tensão latente de que a qualquer momento a
situação pode irromper em violência. Ao invés de usar essas cenas longas para
criar essas sensações, o filme parece deslumbrado demais com seu próprio
universo e personagens, repetindo várias tomadas estilizadas da imensidão ou closes do traseiro da protagonista cujo
microshort tem o desenho de uma carinha sorridente que serve como contraste
para a aridez e hostilidade do lugar.
É como se o filme berrasse a todo
momento "Olha que imagens incríveis eu estou criando! Olha esse plano na
contraluz, não é bacana?" usando essa dilatação temporal de modo
autoindulgente e não como um recurso para favorecer a imersão. As tomadas da
carinha feliz na roupa da protagonista são tão exaustivamente repetidos que se
tornam um cacoete aborrecido ao contrário de um comentário irônico sobre a
situação da personagem.
Repetição exaustiva também se dá
na construção temática e narrativa do filme. O universo criado aqui tinha
bastante potencial para servir como metáfora para exclusão social e como os
governos simplesmente condenam (de uma forma ou de outra) os cidadãos que
considera inferiores e indesejáveis a viverem na imundície sem se importar com
o que acontece com eles. Havia muito o que explorar e muito a falar sobre isso,
mas com trinta minutos o filme já diz praticamente tudo que tinha a dizer sobre
aqueles personagens e aquele universo e os noventa minutos restantes se limitam
a repetir como tudo aquilo é violento e degradante, algo que já entendemos
desde o início da projeção.
Ocasionalmente são apresentados
conceitos interessantes como o líder comunitário vivido por Keanu Reeves em uma
mistura de Pablo Escobar e Muamar Kadafi. O personagem e suas constantes raves e distribuição de drogas servem
para mostrar como o entretenimento é usado pelos poderosos como forma de alienação
para controlar a população e como as drogas acabam sendo um refúgio e um alento
para essas pessoas famintas, solitárias e desesperadas. Do mesmo modo, o
ermitão silencioso vivido por Jim Carrey rende alguns momentos divertidos, em
especial por ser um personagem que vai na contramão do humor verborrágico e
histriônico do comediante. Ainda assim, esses poucos bons momentos não são
suficientes para afastar a sensação de que o filme vai do nada ao lugar nenhum
e quando os créditos começam a subir temos a impressão de que ele não nos disse
nada que já não tenha ficado evidente nos seus primeiros minutos.
Amores Canibais é bem filmado e bem intencionado, mas isso
não consegue compensar a natureza autoindulgente, rasa e repetitiva da fita que
simplesmente não tem estofo suficiente para sustentar suas duas horas de
duração. Talvez com meia hora a menos conseguisse ser mais conciso ou talvez
fosse melhor como um curta-metragem. Resta torcer para que o próximo projeto de
Amirpour consiga fazer jus ao seu potencial como realizadora.
Nota: 5/10
Trailer
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