terça-feira, 26 de setembro de 2017

Crítica - Amores Canibais

Análise Amores Canibais


Review Amores CanibaisDepois de ver o ótimo Garota Sombria Caminha Pela Noite (2014) estava curioso pelo próximo trabalho da diretora Ana Lily Amirpour. Com esse Amores Canibais parecia que a realizadora conseguiria conciliar suas ambições artísticas com algo mais mainstream e facilmente vendável para o público frequentador de multiplexes, mas infelizmente o filme falha nas duas frentes.

A trama se passa em um futuro no qual o governo dos Estados Unidos desenvolveu uma maneira bastante peculiar para lidar com cidadãos indesejados. Eles são despachados para viver em um deserto no Texas, isolados do resto do país e no qual as leis não tem validade alguma, criando um ambiente brutal e hostil (pensem em Mad Max). Arlen (Suki Waterhouse) é uma dessas pessoas despachadas para o deserto e chegando lá é capturada por uma tribo de canibais que cortam seu braço e sua perna para comer. Mesmo com dois membros a menos, ela consegue escapar e chega à cidade de Conforto. Meses se passam até que ela se recupere e consiga uma prótese para sua perna, mas uma vez restabelecida, Arlen decide ir atrás de quem a mutilou. Ela mata uma das canibais, mas fica com pena da pequena garota que acompanhava a mulher e a leva consigo. O que Arlen não sabia é que a menina é a filha de Miami Man (Jason Momoa), líder dos canibais, e ele está disposto a qualquer coisa para recuperar a criança.


Por esse breve resumo parece que se tratar de uma narrativa bastante movimentada, mas a verdade é que muito pouco ocorre durante as duas horas de projeção. Isso em si não seria um problema, já que narrativa lenta não é sinônimo de má qualidade, a questão é que mesmo a lentidão e os longos silêncios tem muito pouco a dizer e a justificar a longa duração do filme.

A opção por usar a montagem para dilatar o tempo das cenas remete aos antigos westerns dirigidos por Sergio Leone e visam ressaltar o vazio e o tédio daqueles espaços, bem como a tensão latente de que a qualquer momento a situação pode irromper em violência. Ao invés de usar essas cenas longas para criar essas sensações, o filme parece deslumbrado demais com seu próprio universo e personagens, repetindo várias tomadas estilizadas da imensidão ou closes do traseiro da protagonista cujo microshort tem o desenho de uma carinha sorridente que serve como contraste para a aridez e hostilidade do lugar.

É como se o filme berrasse a todo momento "Olha que imagens incríveis eu estou criando! Olha esse plano na contraluz, não é bacana?" usando essa dilatação temporal de modo autoindulgente e não como um recurso para favorecer a imersão. As tomadas da carinha feliz na roupa da protagonista são tão exaustivamente repetidos que se tornam um cacoete aborrecido ao contrário de um comentário irônico sobre a situação da personagem.

Repetição exaustiva também se dá na construção temática e narrativa do filme. O universo criado aqui tinha bastante potencial para servir como metáfora para exclusão social e como os governos simplesmente condenam (de uma forma ou de outra) os cidadãos que considera inferiores e indesejáveis a viverem na imundície sem se importar com o que acontece com eles. Havia muito o que explorar e muito a falar sobre isso, mas com trinta minutos o filme já diz praticamente tudo que tinha a dizer sobre aqueles personagens e aquele universo e os noventa minutos restantes se limitam a repetir como tudo aquilo é violento e degradante, algo que já entendemos desde o início da projeção.

Ocasionalmente são apresentados conceitos interessantes como o líder comunitário vivido por Keanu Reeves em uma mistura de Pablo Escobar e Muamar Kadafi. O personagem e suas constantes raves e distribuição de drogas servem para mostrar como o entretenimento é usado pelos poderosos como forma de alienação para controlar a população e como as drogas acabam sendo um refúgio e um alento para essas pessoas famintas, solitárias e desesperadas. Do mesmo modo, o ermitão silencioso vivido por Jim Carrey rende alguns momentos divertidos, em especial por ser um personagem que vai na contramão do humor verborrágico e histriônico do comediante. Ainda assim, esses poucos bons momentos não são suficientes para afastar a sensação de que o filme vai do nada ao lugar nenhum e quando os créditos começam a subir temos a impressão de que ele não nos disse nada que já não tenha ficado evidente nos seus primeiros minutos.

Amores Canibais é bem filmado e bem intencionado, mas isso não consegue compensar a natureza autoindulgente, rasa e repetitiva da fita que simplesmente não tem estofo suficiente para sustentar suas duas horas de duração. Talvez com meia hora a menos conseguisse ser mais conciso ou talvez fosse melhor como um curta-metragem. Resta torcer para que o próximo projeto de Amirpour consiga fazer jus ao seu potencial como realizadora.


Nota: 5/10

Trailer

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