terça-feira, 3 de outubro de 2017

Crítica - Chocante

Análise Chocante


Review Chocante
A nostalgia pelos anos 80 e 90 parece estar em alta no cinema brasileiro. Depois do competente Bingo: O Rei das Manhãs chega aos cinemas este Chocante, claramente inspirado por bandas do anos 90 como Dominó e Menudo. Se Bingo conseguia contar uma história competente sobre o fascínio da fama e a cultura oitentista, Chocante não consegue ser nada mais que um exercício vazio de nostalgia que não tem nada a dizer sobre a época que referencia além de um raso "lembra disso daqui?".

A trama se passa nos dias atuais quando um dos membros da antiga banda Chocante morre em um acidente insólito. Os membros restantes: Téo (Bruno Mazzeo), Toni (Bruno Garcia), Clay (Marcus Majella) e Tom (Lúcio Mauro Filho) se encontram no velório e começam a relembrar dos velhos tempos. Juntamente com a antiga presidente do fã-clube, Quézia (Débora Lamm), eles começam a pensar em retornar aos holofotes.

É um filme de praticamente dois tipos de piadas. A primeiro tipo consiste em criar situações para mostrar como eles estão velhos demais para tentar ser uma boy band. A segunda em mostrar como as vidas deles se tornaram patéticas com um deles sendo anunciante de supermercado e outro virando motorista de Uber (como se fossem profissões humilhantes). O filme passa boa parte do tempo alternando entre essas situações rasas e superficiais até que tudo se torne exaustivamente aborrecido e os 90 minutos de projeção pareçam mais três horas. Os diálogos são igualmente óbvios e vomitam sem sutileza os temas do roteiro. Um exemplo da conversa entre Téo e Tom na qual ele diz algo como "você quer ficar vivendo no passado para não ter que encarar o futuro" comunicando o espectador um sentimento que ele já deveria ter sido capaz de perceber nos personagens.

Em alguns momentos o filme se julga muito mais esperto que realmente é ao tentar criar reviravoltas para pegar o público de surpresa, mas elas são tão óbvias que é possível vê-las com anos-luz de antecedência como o fato de que Clay é gay ou que a briga em rede nacional que acabou com o grupo foi motivada por ciúme de uma namorada. Há a tentativa de criar alguns conflitos, mas eles variam entre a caricatura grosseira e o forçosamente incoerente. A tensão principal entre Téo e a filha parece ser o fato de que ele não sabe quais comidas ela gosta (que raio de adolescente não gosta de pizza?) e que ele não queira mostrar a ela seus vídeos da época da banda (o que não faz sentido já que ele quer voltar com a banda), tudo é pequeno demais para representar qualquer risco real para o personagem ou a relação com a filha.

Do mesmo modo a subtrama envolvendo Toni consiste na compra e venda de um táxi que não é muito bem explicada e soa mais confusa do que deveria, mesmo sendo tão simples. O conflito de Tom gira em torno dele mentir sobre os ensaios da banda para a mulher que é uma megera reclamona castradora tão caricata e exagerada que mais irrita do que faz rir. Já as cenas de Clay giram em torno dele enganar o chefe para ir para os ensaios, o que poderia render momentos engraçados nas cenas dele ensaiando suas desculpas diante do espelho, mas o filme alonga esses instantes mais do que deveria e perde o timing da piada.

Pedro Neschiling completa a banda como Rod, um ex-participante de reality show que entra no Chocante para substituir o membro falecido. O personagem serve apenas com uma crítica rasa a essas subcelebridades que passam o tempo todo fazendo vídeos e fotos para seguidores em redes sociais e lá pela terceira vez que vemos o personagem fazer isso (e ele só faz isso) a graça e a boa vontade com o filme e o personagem vão embora. Era de se imaginar que o arco do personagem fosse ser aceito pelo restante do grupo ou que eventualmente se tornasse um antagonista, mas nada disso acontece e ele simplesmente deixa a trama sem ter feito qualquer diferença. O personagem poderia ser completamente cortado da trama e não faria nenhuma diferença.

O mesmo pode ser dito do empresário vivido por Tony Ramos, cujo conflito potencial com a banda, o fato dele ter colocado o grupo para fazer show em uma escola, não é plenamente construído. A trama nunca deixa claro se o empresário é um tosco incompetente ou um escroque vingativo que quer ferrar com os protagonistas pelos milhões que perdeu quando a banda se desfez. Além disso, depois da cena da humilhação da banda imaginamos que o personagem de Ramos retornará para fechar essa subtrama, mas isso não acontece e nada disso repercute adiante. Aliás, com todo clima de nostalgia acontecendo atualmente com festas temáticas e tudo mais é bem difícil crer que mesmo por conta própria a banda não tenha conseguido marcar nenhum show "de verdade".

A exploração da memória e cultura dos anos noventa se limita a citações de celebridades do período como Marinara, Cristina Mortágua ou Cid Guerreiro, imaginando que a mera menção desses nomes obscuros é o bastante para fazer o público rir. O mesmo acontece com menções a programas e quadros televisivos como a Banheira do Gugu para os quais o filme mira sua câmera e nos indaga: "lembra disso?". Bem, eu lembro, mas e daí? O que o filme tem a dizer sobre isso? Nada, ele apenas quer que a gente se lembre disso e pronto.

Existem apenas duas piadas realmente boas no filme. Uma envolve delas envolve a participação especial de Anderson Leonardo, vocalista do grupo Molejo (maior que Beatles!), como ele mesmo participando de um reality show. A graça é mais pelo bom humor natural de Anderson do que pela qualidade do texto, que desperdiça a presença do divertido cantor. Se fizessem um filme inteiro com Anderson sentado fazendo caretas por 90 minutos o resultado seria provavelmente mais engraçado do que Chocante inteiro. A outra cena que realmente funciona envolve o jornalista Nelson Motta fazendo piada de si mesmo e sua presença praticamente obrigatória em filmes e documentários sobre música brasileira.

Mais sem graça que dançar forró com a irmã e com mais furos que um queijo suíço, há muito pouco o que se aproveitar nessa enorme oportunidade desperdiçada que é Chocante. O filme tinha potencial para ser um deboche divertido dos excessos e da breguice das décadas de oitenta e noventa, mas o resultado é bem decepcionante.


Nota: 3/10

Trailer

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