A primeira temporada de Stranger Things pegou todo mundo de
surpresa com sua trama nostálgica e seu universo que misturava terror, ficção
científica e uma trama juvenil de amadurecimento. Essa segunda temporada
consegue manter o nível da anterior, ampliando seu universo e desenvolvendo as
relações entre seus personagens. Aviso que alguns pequenos SPOILERS estão
presentes no texto a seguir.
A trama começa um ano depois dos
eventos da temporada anterior. Mike (Finn Wolfhard) sente falta de Onze (Millie
Bobby Brown) e tenta se comunicar com ela via rádio. Will (Noah Schnapps)
continua tendo visões sobre o Mundo Invertido e é acompanhado por sua mãe,
Joyce (Winona Ryder), e pelo delegado Hopper (David Harbour) ao Dr. Owens (Paul
Reiser), cientista que é agora responsável pelo projeto do governo que abriu o
portal para o mundo invertido e limpar a bagunça feita pelo Dr. Martin (Matthew
Modine) na temporada anterior. As plantações da cidade começam a apodrecer e
Hopper acha que os incidentes tem relação com o Mundo Invertido.
Assim como a temporada anterior a
série continua criando um simulacro preciso da década de 80, na arquitetura,
nos figurinos e também nos fenômenos culturais, explorando, por exemplo o
sucesso feito por filmes como O
Exterminador do Futuro e o primeiro Caça
Fantasmas em 1984. A música também é um elemento que traz grande carga nostálgica,
seja no uso de canções do período, seja através das composições originais que
constantemente se valem de sintetizadores e sons eletrônicos que eram moda na
época.
Apesar de não ter nada tão
urgente quanto a busca por Will no primeiro ano, esta temporada consegue
produzir um clima crescente de tensão conforme vai aos poucos apresentando os
fenômenos estranhos ocorrendo em Hawkins. Dos problemas das plantações,
passando pela estranha criatura encontrada por Dustin (Gaten Matarazzo) e o
controle cada vez maior que uma criatura sombria passa a ter sobre Will, há uma
sensação de temor por uma ameaça que está sempre à espreita. A trama da
temporada também amarra algumas pontas soltas da anterior, em especial a morte
de Barb (Shannon Purser) que tinha passado a primeira temporada sem
repercussão.
Millie Bobby Brown continua ótima
como Onze e sendo capaz de dizer muito mesmo falando pouco. A personagem
precisa lidar com sua frustração por mais uma vez se sentir em um cativeiro e
de não conhecer seu passado. Assim como é possível compreender a raiva da personagem
em se ver novamente isolada, também é compreensível o temor de Hopper em
relação a ela, principalmente nas reações violentas de Onze quando não consegue
o que quer. A personagem também é confrontada com a possibilidade de ceder à
sua raiva e usá-la para fins vingativos ao invés de proteger seus amigos. A
relação de pai e filha entre ela e Hopper é construída com bastante sensibilidade
conforme eles vão aprendendo a lidar com o melhor e o pior um do outro. Ela vê
no policial a possibilidade de
finalmente ter uma vida normal e ele vê nela uma segunda chance depois de
perder a filha (reparem que ele sempre está com uma das presilhas azuis da
filha no pulso).
Dustin e Lucas (Caleb McLaughlin)
vivenciam sua primeira paixão com a novata Max (Sadie Sink) e o roteiro é
esperto ao não tentar forçar um triângulo amoroso ou usá-la para meramente
semear a discórdia entre os protagonistas. A paixão dos dois por ela é tratada
com leveza e certa dose de humor, mas sem deixar de explorar o peso de ter o
coração partido. É interessante perceber a rejeição de Mike por Max, já que a
presença dela no grupo seria como admitir a morte ou a ausência permanente de
Onze, algo que o garoto claramente não está preparado para fazer.
A narrativa ainda encontra espaço
para desenvolver laços entre personagens que não esperávamos, como a inesperada
amizade entre Dustin e Steve (Joe Keery) e como ambos acabam criando um vínculo
em virtude de suas decepções amorosas e rendem alguns momentos bem divertidos,
como a cena em que Steve explica a "receita" do seu penteado.
O elo fraco acaba sendo Dacre Montgomery
(o Jason do recente reboot dos PowerRangers) como Billy, o irmão bruto de Max. Em uma série que tem tanto cuidado
com seus personagens é decepcionante que ele não tenha um arco próprio,
servindo de mero obstáculo para a irmã e sua presença poderia ser suprimida sem
nenhuma perda. Tudo bem que a narrativa até consegue nos fazer entender o
motivo de seu comportamento, mas em meio a tantos personagens interessantes ele
acaba fazendo pouco para dizer a que veio ou chamar atenção a despeito do seu
divertido visual de bad boy oitentista
com direito a um mullet enorme e
super brega (para os padrões atuais, claro).
O desfecho consegue amarrar bem
todas as tramas construídas ao longo da temporada, dando desfechos
satisfatórios e alguns cheios de emoção, em especial os que envolvem Onze, ao
mesmo tempo que abre novas possibilidades e relacionamentos para as temporadas
vindouras. Além disso também deixa claro que as ameaças do mundo invertido
estão longe de acabar.
Assim sendo, a segunda temporada
de Stranger Things consegue manter o
nível da primeira, expandindo seu universo, aprofundando seus personagens e
oferecendo uma competente trama cheia de nostalgia, suspense, bom humor e
jornadas de amadurecimento.
Nota: 8/10
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