sábado, 11 de novembro de 2017

Crítica - La Manuela

Análise Crítica - La Manuela


Review - La Manuela
O que exatamente leva alguém a considerar um lugar como seu lar? Como se dá a construção dessa sensação de "pertencimento"? Mais importante que isso, o que fazer quando se torna impossível retonar a esse lar? Como um exilado lida com isso? São essas perguntas que o documentário La Manuela, dirigido por Clara Linhart.

O documentário acompanha a jornada de Manuela Picq, professora e ativista franco-brasileira que é presa no Equador durante um protesto de grupos indígenas. O governo equatoriano a acusa de imigração irregular embora ela esteja no país há quase uma década trabalhando como professora. Seus familiares e amigos começam a suspeitar que o questionamento de seu status de imigração pelo governo pode ser uma manobra política, tanto pelo envolvimento de Manuela com o movimento indígena como pela sua relação amorosa com Carlos, uma das principais lideranças do movimento.

A narrativa demora um pouco a encontrar seu rumo e decidir que história quer contar a respeito do que ocorre com Manuela. De início parece querer se debruçar sobre a família dela e sua busca por informações, mas precisa repensar sua abordagem depois que Manuela é solta e retorna ao Brasil depois de perder seu visto. A partir de então tenta abordar a questão indígena do Equador, tenta trazer uma crítica à esquerda latinoamericana que teria abandonado parte de suas agendas políticas para se manter no poder. O filme passa muito rápido por questões políticas e ideológicas relativamente complicadas e com isso acaba simplificando muita coisa. A narrativa, no entanto,  se "encontra" de fato quando decide se debruçar sobre a própria Manuela e como ela se sente frente ao seu exílio e a impossibilidade de retornar a um país que transformou em lar.

Em um desconcertante limbo, sem saber ao certo se sua condição será revertida ou se dá prosseguimento à sua vida e faz outros planos, o processo de Manuela em lidar com a impossibilidade de retornar ao Equador é quase como um processo de luto. A protagonista parece sempre deslocada, em falta de algo e por mais que ela tente seguir com sua vida e espere que isso se reverta, com o passar do tempo ela vai se dando conta de que não pode mais tratar a questão como temporária e começa a contemplar a possibilidade de não retornar para o Equador e seu companheiro em um bom tempo.

O momento em que esse entendimento parece atingir com mais força a personagem se dá justamente em uma conversa com Carlos via internet próxima ao fim do filme. Com poucos cortes o público acompanha as longuíssimas e angustiantes pausas e silêncios na fala de cada um, como se dois se dessem conta de que seus planos não irão se realizar em um futuro próximo, considerassem encerrar a relação, mas ao mesmo tempo não querem ter que dizer isso em voz alta porque isso tornaria tudo real e significaria se dar por vencido.

O filme traz uma sensação grande de proximidade com a protagonista e essa impressão de intimidade não se dá somente pela presença constante da câmera na casa de Manuela ou em momentos dela com Carlos, mas pelo constante diálogo entre Manuela e a diretora que evidencia a cumplicidade longeva que existe entre as duas amigas de infância. Conhecemos Manuela não pelos olhos de uma estranha, mas através de alguém que a conhece muito bem e isso acaba nos fazendo sentir igualmente próximos da protagonista.

A despeito de uma certa demora em decidir qual enquadramento será dado à questão, La Manuela se mostra um estudo cheio de afeto e melancolia sobre a experiência de exílio, mostrando como os vínculos e sensações de pertencimento a um lugar são estabelecidas.


Nota: 6/10

Esse texto faz parte de nossa cobertura do XIII Panorama Internacional Coisa de Cinema

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