quarta-feira, 1 de novembro de 2017

Crítica - Terra Selvagem

Análise Terra Selvagem


Review Terra Selvagem
Narrativas policiais comumente tratam do embate entre a razão e a violência. Westerns (ou faroestes) normalmente tratam sobre o embate entre o homem e um ambiente selvagem, brutal, seja ele fruto da ação humana ou da natureza. É possível perceber como podem existir interseções entre os dois e, na prática, e Terra Selvagem opera com essas duas coisas em mente. Funciona como um mash-up entre Millenium: Os Homens Que Não Amavam as Mulheres (2011) e Onde os Fracos Não Tem Vez (2007) e ainda que não chegue no altíssimo nível dos dois, consegue ser bastante competente.

A narrativa começa na reserva indígena de Wind River (que dá o título original do filme) no interior gelado do estado do Wyoming (o menos povoado dos Estados Unidos). O caçador Cory (Jeremy Renner) encontra o cadáver de uma jovem descalça na neve e como a reserva é terreno federal o FBI é chamado. A agente Jane (Elizabeth Olsen) examina o local e suspeita de assassinato. Como não conhece o território, Jane decide chamar Cory para ajudar na investigação com suas habilidades de seguir rastros.


As paisagens montanhosas e nevadas são igualmente belas e perigosas. A neve esconde predadores como pumas e sua imensidão fria é por si só um risco de vida para qualquer um que não esteja adequadamente equipado para caminhar por suas paisagens ermas. Nesse sentido, o ambiente é tal como o oeste selvagem dos faroestes, um lugar no qual as pessoas não vivem, mas sobrevivem e só aqueles realmente aptos conseguem superar seus perigos e intempéries. O diretor e roteirista Taylor Sheridan já tinha abordado a marginalização da população indígena em seu roteiro para o recente A Qualquer Custo, dirigido por David Mackenzie.

A desolação do ambiente reflete também a desolação nas vidas dos personagens. Quem vive ali ou deseja sair a qualquer custo ou já teve a vida marcada por perdas e crime. Há um olhar crítico sobre a estrutura governamental em torno das reservas indígenas, que tira os nativos de suas terras e os empurra a zonas ermas que ninguém mais moraria, largando-os para definhar em um ambiente sem recursos, sem assistência estatal e praticamente sei lei. O letreiro final deixa claro, talvez de modo excessivamente didático e pouco orgânico, o descaso governamental com as reservas indígenas ao fornecer a informação de que ninguém compila ou analisa os dados de desaparecimentos de mulheres indígenas.

Há um clima constante de melancolia e fatalismo, como se aquelas pessoas já tivessem se resignado aos seus destinos. Os protagonistas não buscam reverter o sistema, eles sabem que não há como, eles apenas buscam o mínimo de reparação pelo crime que investigam. Para Cory é uma chance de se redimir pelo que considera ter sido uma negligência sua que levou à morte de sua filha anos atrás. Jane, por sua vez, se mostra bem intencionada ao resolver tudo dentro da lei, mas aos poucos percebe que a situação está além da sua capacidade.

Quando ela permite que Cory persiga um dos culpados por conta própria no final ela sabe que está agindo à margem da lei, do peso e das consequências de sua escolha, mas sabe também que não há outra maneira. Do mesmo modo, Cory sabe que eliminar os responsáveis não muda nada do que aconteceu com sua filha ou com a garota cuja morte investigam, mas se ele entende que se não fizer nada tudo terminará em impunidade. O filme é inteligente ao não celebrar a escolha dos personagens, mas a trata com certa medida de pesar, como se aquilo representasse uma vitória da brutalidade e que não há saída para o ciclo de violência. Nesse sentido remete ao pessimismo de Os Imperdoáveis (1992), no qual o assassinato, mesmo quando pode ser justificado, não deixa de ser um ato degradante e desumanizador.

Terra Selvagem se mostra uma competente e desoladora mistura entre western e narrativa policial ao tecer uma trama que trata de sobrevivência e desespero em meio ao abandono e violência.


Nota: 8/10

Trailer

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