segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

Crítica - Extraordinário

Análise Extraordinário


Review Extraordinário
Desde pequenos somos ensinados a tratar os outros como gostaríamos de sermos tratados, a não julgar a conduta dos outros sem conhecê-las e sabermos o que realmente estão passando e a valorizar as pessoas pelo que elas são e não por sua aparência. Extraordinário é um filme que visa nos lembrar de todas essas coisas e, embora não reinvente a roda, cumpre seu papel com muita sensibilidade.

A trama é protagonizada por Auggie (Jacob Tremblay), um garoto que nasceu com vários problemas de saúde e desde bebê precisou passar por várias cirurgias, deixando-o com o rosto deformado. Por um bom tempo ele estudou em casa, sob a tutela de sua mãe, Isabel (Julia Roberts), mas sua família acha que é hora dele ir para uma escola de verdade e começar a interagir com outras crianças. Como era de se esperar, nem todos os seus colegas o aceitam e ele começa a sofrer bullying.

É óbvio desde o início que eventualmente Auggie eventualmente será aceito pelos colegas e todos aprenderão valiosas lições de vida, mas sua força reside no modo como essa história é contada. Dividido em capítulos que recontam os eventos da trama sob a perspectiva de diferentes personagens, o filme constantemente solicita que repensemos o que achávamos saber sobre os personagens. Se inicialmente Miranda (Danielle Rose Russell) parece uma típica megera adolescente ao se afastar de Via (Izabela Vidovic) por achar que ficou popular demais para continuar andando com a antiga amiga, quando o filme adota a perspectiva de Miranda percebemos que ela é uma garota triste e solitária que se afastou da amiga por conta de uma mentira tola e que se arrepende do que fez.


Com essa estrutura o filme nos faz perceber que nós, enquanto espectadores, fazíamos exatamente o que a trama condena: estávamos julgando aqueles personagens sem conhecê-los ou saber das dificuldades de suas vidas. Ao induzir o público a atentar para sua própria conduta preconceituosa, a mensagem da narrativa ressoa ainda mais forte do que se apenas exibisse a jornada de superação de Auggie. Seria fácil reduzir pessoas como Miranda, Jack Will (Noah Jupe) ou mesmo o valentão Julian (Bryce Geishar) a tipos maniqueístas e unidimensionais, mas ao constantemente revelar o mundo sob o olhar deles, o filme os enriquece e permite que sejamos capazes de compreendê-los melhor.

A trama evita mostrar Julian como um mero garoto maligno, revelando que muito de sua conduta é meramente uma reprodução das ações desprezíveis de seus pais em casa. O texto também evita endeusar excessivamente os pais de Auggie, mostrando como o excesso de cuidados deles com o menino os faz negligenciar sua outra filha, Via, que muitas vezes se sente ignorada e solitária, tendo apenas a avó (Sônia Braga em uma participação pequena, mas cheia de afeto) a quem confidenciar.

O garoto Jacob Tremblay, que já tinha mostrado grande competência no excelente O Quarto de Jack (2015), faz de Auggie um garoto que se resignou a ser visto com repulsa, sempre com uma postura retraída e um olhar para baixo, evitando encarar seus interlocutores. É um garoto bastante vulnerável, que não sabe como reagir às provocações de seus colegas, se tornando cada vez mais fechado. Apesar da timidez, Auggie é um menino bem esperto e carismático, algo que Jack Will e os outras crianças que começam a se aproximar dele rapidamente percebe. Tremblay é excelente em retratar tanto o sofrimento quanto a alegria e ingenuidade infantil do personagem, sendo difícil não se emocionar com ele.

O restante do elenco também traz afeto e calor humano de um modo bem sincero, dos pais de Auggie vividos por Julia Roberts e Owen Wilson, passando pelo professor Browne (Daveed Diggs) e o diretor da escola, o Sr. Buzanfa (Mandy Patinkin), contribuindo para essa impressão sobre a importância de cuidarmos uns dos outros. Apesar de muitos momentos de emoção verdadeira, o filme ocasionalmente passa do ponto e pesa a mão na tragédia só para tentar levar o espectador às lágrimas. O melhor exemplo disso é o arco envolvendo a doença da cadela da família de Auggie, que não tem nenhum outro propósito na trama além de forçar o choro da plateia, inclusive poderia ser suprimido sem nenhuma grande perda na construção dramática e temática da narrativa.

Mesmo ocasionalmente flertando com um desenvolvimento mais apelativo, Extraordinário é daqueles filmes que nos fazem sair mais leves da sala de cinema. Um comovente e fofo exercício de alteridade que nos lembra da importância da gentileza, de cuidarmos uns dos outros e de não julgarmos pela aparência.


Nota: 8/10

Trailer

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