Em 1964 o astro das artes
marciais Bruce Lee enfrentou o monge shaolin Wong Jack Man em uma luta privada
testemunhada apenas por um punhado de pessoas. Os relatos sobre quem venceu o
embate divergem bastante e os dois lutadores apresentavam sua própria versão
dos resultados. É uma história interessante que sem dúvida poderia render um ótimo
filme, mas A Origem do Dragão não é
esse filme.
Se baseando na célebre luta, o
filme começa com a chegada de Wong Jack Man (Yu Xia) na cidade de São
Francisco. Bruce Lee (Philip Ng) recebe a notícia da chegada do monge à sua
cidade como uma ameaça a tudo que construiu, crendo que os shaolin querem
puni-lo por ensinar kung fu aos brancos. Um aluno de Lee, Steve McKee (Billy
Magnussen) acaba se aproximando de Wong e coloca os dois mestres em um caminho
de conflito.
Yu Xia e Philip Ng fazem o melhor
que podem como Wong e Lee, sendo mais que eficientes nos aspectos físicos dos
personagens e na linguagem corporal do modo como eles lutam, no entanto são
limitados por um texto raso que faz uma representação bastante unidimensional
dos dois artistas marciais. Wong é um monge humilde preocupado em preservar a
essência do kung fu enquanto Lee é um sujeito preocupado com fama e sucesso.
Por mais que Lee fosse de fato um sujeito superconfiante e até mesmo arrogante,
o texto pesa tanto a mão nesse aspecto do personagem, deixando quase que de
lado seu carisma e magnetismo pessoal, que durante boa parte do filme chega a
ser difícil se importar com Lee por conta de seu egocentrismo.
O principal empecilho para que
Wong e Lee sejam satisfatoriamente desenvolvidos é o excesso de tempo gasto com
McKee. Se eu fosse contabilizar o tempo de tela entre os três personagens,
certamente perceberia que McKee fica mais tempo em cena do que os outros dois e
considerando que eles deveriam ser os protagonistas, isso é um problema sério. Eu
entendo que McKee, um personagem que nunca existiu no "mundo real",
foi criado como um dispositivo de roteiro para apresentar o público aos dois
protagonistas do longa.
A questão é que ao invés de
servir como uma janela para Wong e Lee, o filme cada vez mais aumenta a
importância de McKee na trama, fazendo tudo girar ao redor dele e não dos dois
lutadores. Toda a subtrama romântica envolvendo McKee é artificial e
entediante, acontecendo simplesmente porque o roteiro diz que tem que acontecer
e é esse arco genérico que o filme usa como catalisador da luta entre Wong e
Lee. O problema nem é tanto que os percalços amorosos envolvendo McKee nunca
aconteceram, mas que todo o tempo gasto com ele não serve para criar um
entendimento maior sobre os outros dois personagens que deveriam ser os
protagonistas.
Com tantas pessoas reais ao redor
de Lee e Wong que poderiam ser usadas para ajudar o público a entender quem são
essas figuras, é incompreensível que se perca tanto tempo com um personagem tão
insosso quanto McKee. Linda, a esposa de Bruce por exemplo, não aparece em
momento algum e mal é citada pelo ator, uma escolha esquisita considerando que
Linda foi uma das poucas testemunhas da luta entre ele e Wong.
As cenas de luta são o melhor do
filme e o embate entre Bruce Lee e Wong Jack Man é tenso e cheio de energia. O
filme é hábil em usar planos em primeira pessoa para mostrar o olhar dos
lutadores em relação ao oponente e como eles procuram brechas em suas poses de
ataque e defesa. Do mesmo modo, também usa a câmera lenta para nos fazer
perceber com detalhes a movimentação veloz daqueles dois personagens. Por outro
lado, uma vez acabada a luta a trama não dá muito espaço para que se possa
desenvolver o impacto que o encontro teve sobre os dois, resumindo tudo a
alguns diálogos expositivos em que Lee fala da criação do Jeet Kune Do. Isso
acontece porque o filme precisa correr para resolver o arco de McKee. Isso mais
uma vez torna os dois personagens que deveriam ter o protagonismo em
sujeitos cujas ações dependem e são subalternas ao que ocorre com McKee,
transformando Wong e Lee em coadjuvantes da própria história.
Mesmo com algumas boas cenas de
luta, A Origem do Dragão é
prejudicado pelo desenvolvimento raso dos personagens e subtramas inúteis que
não levam a lugar nenhum. Quem estiver buscando saber mais sobre a vida de
Bruce Lee provavelmente vai aproveitar mais Dragão:
A História de Bruce Lee (1993) do que este filme.
Nota: 4/10
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