Muita gente quer fazer sucesso em
Hollywood, mas poucos conseguem. Alguns fazem sucesso por causa do talento,
outros da beleza, mas alguns alcançam sucesso através da infâmia, fazendo algo
tão bizarro e ruim que é difícil ignorar. Foi isso que aconteceu com Tommy
Wiseau. Cansado de ser ignorado em testes e não conseguir papéis ele decidiu
escrever, produzir, dirigir e protagonizar um filme mesmo sem ter qualquer
experiência real. Gastando cerca de 6 milhões do próprio dinheiro (uma fortuna
que ninguém sabe ao certo como ele conseguiu) Wiseau realizou The Room, considerado por muitos o
"Cidadão Kane dos filmes
ruins". Este Artista do Desastre,
baseado no livro The Disaster Artist
escrito por Greg Sestero, mostra exatamente o processo de realização de The Room e a amizade esquista entre
Wiseau e Sestero ao longo da realização do filme.
Seria fácil transformar a figura
bizarra de Wiseau em algo meramente caricatural e fazer do filme inteiro uma
comédia direcionada apenas a rir do comportamento bizarro dele, mas, assim como
no livro escrito por Sestero, a trama tem um claro afeto por seu esquisito
protagonista e tem um interesse genuíno em compreendê-lo. A cena que abre a
narrativa é bem eficiente em justificar o que Greg (Dave Franco) vê em Tommy
(James Franco, que também dirigiu o filme) e qual a razão deles se aproximarem.
Daí em diante acompanhamos o modo como ambos tentam e fracassam em Hollywood, a
decisão de Tommy em fazer seu próprio filme e todo o processo envolvido na
feitura de The Room.
James Franco realmente habita a persona de Wiseau, captando seus
maneirismos físicos, sotaque marcante e uma cadência de fala bem peculiar. Ao
mesmo tempo que o filme reconhece a graça de seu comportamento exagerado e sem
noção, também percebe que ele é uma figura muito solitária e carente. Alguém
que passou por tantos traumas e rejeição que criou seu próprio mundo em sua
cabeça e tentou reproduzir isso em seu filme. Dave Franco, por outro lado, acaba tendo uma passagem apagada como Greg, sendo engolido em cena pelo irmão James sendo que seu personagem deveria ser capaz de fazer frente ao dele.
A amizade ambígua entre ele e
Greg é abordada de maneira cuidadosa, revelando como Tommy foi importante
para que Greg tivesse a confiança para arriscar a carreira de ator, mas ao
mesmo tempo agiu como um peso na vida do amigo, interferindo em sua vida
profissional e pessoal. Ao mesmo tempo em que gostava de ter Greg por perto,
Tommy parecia ter inveja das oportunidades que o amigo tinha e ele não, se
mostrando bastante inseguro e até agressivo toda vez que Greg não o tratava
como o centro de sua vida. É quase como se Tommy já estivesse tão farto de ser
maltratado, ridicularizado e abandonado pelos outros que ao menor sinal de que
o amigo podia estar se afastando Tommy tentava afastar as pessoas por conta
própria para evitar se magoar mais, se convencendo de que estava sendo traído
pelos amigos e colegas.
A trama é esperta ao mostrar as
associações entre a conduta de Tommy e a história (ou arremedo de história já
que nada faz muito sentido) que ele concebe para The Room, com sua obra servindo de projeção para todos os seus
desejos e inseguranças. Em seu filme Tommy é bem sucedido, é amado por todos, é
uma figura central de sua comunidade, mas também é enganado pelas pessoas mais
próximas.
Apesar de toda essa construção
dramática, o filme se abre bastante para o humor, principal e inevitavelmente
por toda a esquisitice que é inerente a Tommy. De sua primeira aparição em uma
aula de teatro tentando reproduzir uma famosa cena de Um Bonde Chamado Desejo ao modo sem noção com o qual ele aborda um
produtor de cinema (vivido por ninguém menos que o diretor Judd Apatow) em um
restaurante, é difícil não rir das excentricidades do protagonista. Isso,
claro, sem mencionar toda loucura que ocorre nos bastidores da gravação de The Room.
O principal problema de Artista do Desastre vai residir justamente
no modo como ele muitas vezes se contenta em apenas reencenar momentos chave de
The Room enquanto a equipe de Tommy,
como supervisor de roteiro interpretado por Seth Rogen, comenta tudo que há de
errado na cena. Tudo bem que é hilário ver como a infame cena de sexo ou o
diálogo do "oh, hi Mark"
foram feitos, mas o filme desperdiça a oportunidade de explorar melhor as
histórias insólitas do resto dos membros do elenco ou desenvolver a
personalidade dos demais personagens ao invés de apenas apontar para trechos de
The Room e nos dizer "tá vendo
como isso é tosco?". Talvez eu pense isso por ter lido o livro escrito por
Greg Sestero e saiba que havia mais coisas interessantes a explorar. Ainda
assim não deixo de sentir que esse material poderia render algo tão bom como o Ed Wood (1994) de Tim Burton, também
centrado em um diretor excêntrico e incompetente, e desperdiça essa
oportunidade ao ocasionalmente se contentar em apenas reproduzir os bastidores
da produção de Wiseau.
Mesmo não alcançando todo o
potencial que tinha, Artista do
Desastre funciona como uma competente comédia sobre ir atrás dos seus sonhos
e acreditar em si mesmo. Por mais que The Room seja um dos piores filmes já feitos, ele realmente conseguiu
catapultar Tommy Wiseau e Greg Sestero ao sucesso de um modo que eles jamais
conseguiriam caso não tivessem embarcado naquela bizarra empreitada.
Nota: 7/10
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