sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018

Crítica - Três Anúncios Para um Crime


Análise - Três Anúncios Para um Crime


Review Três Anúncios Para um Crime
Em seus filmes, o diretor britânico Martin McDonagh costuma usar humor e niilismo para criticar a obsessão do cinema hollywoodiano (e da sociedade dos EUA) com violência, armas de fogo e noção de que é possível resolver tudo à força. Nas suas narrativas a violência não costuma ser a solução e cria mais problemas para quem a utiliza como ferramenta. Na Mira do Chefe (2008) abordava essas ideias a partir de uma trama sobre matadores de aluguel, enquanto que Sete Psicopatas e um Shih Tzu (2012) tratava isso ao falar da adoração de Hollywood por gângsteres e psicopatas. Agora, neste Três Anúncios Para um Crime, o cineasta se debruça sobre a figura do "justiceiro" urbano, que recorre à violência para combater injustiças e impunidade.

A narrativa começa quando Mildred (Frances McDormand) coloca três outdoors na estrada que leva à sua cidade. Os anúncios cobram da polícia local uma solução para o estupro seguido de assassinato da filha de Mildred, ocorrido meses atrás e que segue em aberto. Essa ação agressiva por parte de Mildred desperta reações extremas em sua cidade. O chefe de polícia Willoughby (Woody Harrelson), que está com câncer terminal, tenta resolver a questão pacificamente, explicando a Mildred as dificuldades do caso. Outros policiais, por outro lado, não estão dispostos a deixar incólume o que eles pensam ser uma afronta ao departamento, em especial o truculento policial Dixon (Sam Rockwell). Isso começa uma guerra de atrito entre Mildred e Dixon, conforme cada um deles age de modo ainda mais agressivo para tentar fazer valer seu ponto de vista.

Apesar de não recorrer diretamente à violência no início da trama, Mildred se assemelha muito ao tipo comum de personagem que sai em busca de justiça com as próprias mãos como aqueles vividos à exaustão por Charles Bronson. Ela passou por um imenso trauma, está cansada de impunidade e com muita raiva, deixando que a fúria guie suas ações. Frances McDormand transmite essa raiva através da fala seca e direta da personagem, demonstrando que ela não tem a menor paciência para as baboseiras de ninguém. Sua conduta, no entanto, não é motivada apenas pelo que aconteceu com a filha, mas também pelos anos de violência doméstica sofrida nas mãos do ex-marido, que também saiu impune. Assim, sua raiva é mais que compreensível e justificada, embora seus métodos sejam, por vezes, questionáveis.

Apesar dela falar o tempo todo em abusos da polícia e no crime da cidade, esse clima de instabilidade social nunca é visto ou sentido, o crime com sua filha parece algo fora do comum para aquela pequena cidade e isso contribui para que percebamos o quão desmedida foi sua atitude com os anúncios na estrada. Sua raiva não lhe traz nenhum benefício, apenas a torna solitária e amargurada.

Dixon, por sua vez, é o arquétipo do policial renegado que segue suas próprias e age com violência desmedida, não muito diferente do Dirty Harry vivido por Clint Eastwood ou o Riggs interpretado por Mel Gibson. Em qualquer outra narrativa Dixon poderia ser tratado como herói, mas aqui é tratado como um ignorante patético (mas ainda assim perigoso). Ele não é alguém a ser exaltado, mas um sujeito digno de escárnio por sua postura anacrônica de se comportar como se estivesse no velho oeste. Assim como Mildred, no entanto, o filme evita reduzi-lo a uma caricatura ao oferecer uma motivação convincente para ele ser como é ao observar a relação de Dixon com a mãe. Além disso, a interpretação de Sam Rockwell trabalha para dar um certo ar de ingenuidade estúpida à conduta de Dixon, como se ele acreditasse de verdade que está fazendo é correto.

A trama coloca os dois personagens para eventualmente aprenderem o peso e o custo de suas condutas violentas e perceberem como tudo apenas piorou as coisas. A raiva deles não era um motor que os impelia a seguir em frente, mas um grilhão que os prendia no mesmo lugar. Não é por acaso que a tentativa de Dixon em agir de modo correto é literalmente "dar a outra face" e deixar que um suspeito bata nele para conseguir seu DNA ao invés de recorrer à sua típica brutalidade. Para o filme não há catarse, fechamento ou conforto a ser obtido através da violência, mas ao mesmo tempo reconhece que não é um problema fácil de resolver ou superar por estar tão emaranhado na conduta humana. Mais que isso, também ressalta o quão irreais e tóxicas são a glamourização da violência e o esforço feito pelo cinema hollywoodiano para transformar personagens similares a Dixon ou Mildred em heróis.

Nesse sentido, o filme é inteligente em apresentar um desfecho em aberto, deixando para que o público decida o destino final dos personagens ou a moralidade de suas escolhas. Dependendo do seu ponto de vista, pode ser um final melancólico que reconhece que o ciclo da violência jamais será rompido. Por outro lado, pode ser interpretado como um final em que aqueles personagens renunciam finalmente o uso da violência como forma de resolver conflitos.

No fim das contas, Três Anúncios Para um Crime é uma excelente discussão sobre a futilidade da violência, com uma revisão bem humorada de certos arquétipos da cinematografia hollywoodiana e um ótimo elenco.

Nota: 8/10

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