sexta-feira, 17 de agosto de 2018

Crítica – Medo Viral


Análise Crítica – Medo Viral


Review – Medo Viral
Era inevitável que algum filme de terror fosse falar de nossa dependência de telefones celulares e aplicativos que fazem praticamente tudo por nós, de pedir comida a dar as direções para chegarmos em algum lugar. É uma pena, porém, que o filme a fazer isso tenha sido tão ruim quanto este Medo Viral.

Na trama, a melhor amiga de Alice (Saxon Sharbino), morre sob circunstâncias misteriosas. Dias depois, ela e alguns de seus amigos recebem em seus telefones um convite para testar um novo aplicativo de celular que oferece um assistente virtual (tipo a Siri da Apple) chamado Sr. Bedevil (voz de Jordan Essoe). O fato do convite vir do celular da amiga morta de Alice não chama atenção dos garotos, afinal vivemos em uma era de convites automáticos e constantes spams de sites como LinkedIn. Ao instalar o aplicativo, o Sr. Bedevil começa a conversar e provocar os garotos, não muito diferente do assassino da franquia Pânico. Aos poucos Bedevil sai do mundo virtual para assombrá-los no mundo real, confrontando-os com seus piores medos tal como o Pennywise de It: A Coisa (2017) ou o Freddy Kruger de A Hora do Pesadelo, tudo isso embalado pela temática da tecnofobia similar a filmes como O Chamado (2002) ou Amizade Desfeita (2015).

Como deu para ver pela minha descrição no parágrafo acima, Medo Viral pega vários elementos de filmes de terror que fizeram sucesso e joga todos na parede ao mesmo tempo na esperança que algum deles cole. O resultado, no entanto, é uma mistureba quase que incoerente, desprovida de personalidade ou carisma que sequer consegue causar medo de tão derivativa e previsível que é.

Sem qualquer desenvolvimento narrativo para além da premissa inicial que expliquei no começo do texto, o filme salta entre uma cena de susto para outra, o que não seria um problema se fosse capaz de criar um clima convincente de medo ou apreensão, mas isso não acontece. Medo Viral se entrega a uma sucessão óbvia de sustos súbitos (jump scares) que são previsíveis demais para assustar. Basicamente toda vez que as coisas ficam muito quietas ou muito silenciosas, é certo que algo irá pular diante da tela e uma música alta e grave, bastante intrusiva, começa a tocar. Como é possível prever com extrema exatidão quando cada susto virá, nenhum deles realmente assusta e o filme se transforma em um tedioso exercício de paciência.

Outra razão para o terror não funcionar é o desenvolvimento frouxo da “mitologia” ao redor do Sr. Bedevil e como ele opera. As explicações de que ele é algum tipo de entidade sobrenatural que usa as ondas eletromagnéticas dos celulares como um portal para o nosso mundo e que ele se alimenta de medo fazem pouco para conferir qualquer identidade ao monstro, fazendo-o um bicho-papão genérico. A mitologia vaga também complica a trama quando chega a hora de oferecer uma solução e dar uma maneira dos personagens combater o monstro, transformando o clímax do filme em uma imensa bagunça incoerente e sem sentido conforme eles tentam instalar um vírus em seus telefones.

O visual das criaturas em si também não impressiona, com alguns palhaços sinistros tentando emular o Pennywise ou as máscaras usadas em Uma Noite de Crime (2013) e American Horror Story: Cult. O Sr. Bedevil, por sua vez, parece uma mistura do Slender Man, por sua figura esguia e terno, com dedos longos em forma de garra que remetem ao Freddy Kruger. Como o filme salta de um susto para outro, também não nos dá muito para que nos importemos com os personagens, já que exceto por nos comunicar seus medos (e faz isso apenas para justificar os sustos que ocorrem depois) eles não possuem qualquer traço discernível de personalidade. Para um filme sobre um monstro poderoso caçando adolescentes, Medo Viral também é relativamente “limpo” em termos de violência, com a maioria das mortes acontecendo fora de quadro, falhando em dar ao público o gore e a sanguinolência criativa que se espera de um produto desses.

Os momentos em que o filme tenta desenvolver os personagem de algum modo resultam em uma série de condutas sem sentido. Um exemplo é a cena de Cody (Mitchell Edwards) assobiando Mozart no ônibus. Uma idosa reconhece a melodia e puxa conversa com ele e então Cody, que é negro, começa a explicar que assobia música clássica para tranquilizar os brancos do ônibus que não é um assaltante e depois acusa a idosa, que até então tinha sido gentil com ele, de ser racista. Nada nessa cena faz o menor sentido, primeiro que conhecer música clássica não impede ninguém de ser criminoso, segundo que Mozart não é exatamente pop e eu duvido que muitos frequentadores de ônibus reconheceriam a melodia, tornando o plano de Cody ineficiente, terceiro que não havia qualquer razão para Cody acusar a idosa de racismo. Tudo parece uma maneira forçada do filme tentar construir algum tipo de crítica social, mas, tal como a questão do uso de celulares pelos jovens, isso é apresentado de forma rasa e inorgânica, não tendo nenhum impacto sobre a trama.

Com todos esses problemas, Medo Viral é uma bricolagem incoerente e entediante de um monte de outros filmes de terror melhores que não tem nada de interessante a dizer sobre nossa dependência digital e se limita a oferecer sustos óbvios e previsíveis.

Nota: 2/10


Trailer

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