quarta-feira, 15 de agosto de 2018

Crítica – Tully


Análise Crítica – Tully


Review – Tully
Já fizeram muitos filmes sobre as belezas da maternidade, sobre o ideal romântico de carregar uma gestação, parir um filho e cuidar do seu bebê, mas recentemente alguns filmes vem se comprometendo a abordar aspectos pouco falados dessa fase da vida de uma mulher. Olmo e a Gaivota (2015), da brasileira Petra Costa, fez isso com o período da gestação e este Tully, do diretor Jason Reitman, observa a solidão do pós-parto.

A narrativa é centrada em Marlo (Charlize Theron), uma mãe de duas crianças que acaba de ter seu terceiro bebê. Cansada e sem conseguir dormir, ela decide seguir o conselho de seu irmão e contrata uma babá noturna, a jovem Tully (Mackenzie Davis), para cuidar de sua filha durante a noite enquanto ela dorme. Aos poucos Marlo começa a se conectar com Tully, relembrando de um lado de si que tinha esquecido.

O filme trabalha para revelar a solidão experimentada por Marlo em seu trabalho de mãe, constantemente precisando lidar com quase tudo dos filhos maiores por conta própria durante o dia e de sua recém-nascida à noite. Sua vida é literalmente uma montagem de ações repetitivas e incessantes com os cuidados de suas crianças e Charlize Theron é mais que eficiente em nos mostrar a exaustão de sua personagem, não apenas no quesito físico, mas também mental, já que ela lida não só com as cobranças que faz a si mesma como também a de outras pessoas, inclusive estranhos. Isso fica mais do que evidente na cena em que Marlo é recriminada por uma idosa desconhecida ao pedir um café, como se o corpo da protagonista não lhe pertencesse, mas fosse um bem público que qualquer pessoa pudesse interferir, dar pitacos e se sentir no direito de controlar.

O marido de Marlo, Drew (Ron Livingston), é uma presença distante, constantemente filmado de longe, levemente desfocado ou em planos que colocam ele e Marlo nas bordas do quadro deixado um espaço vazio entre os dois. Apesar disso, a narrativa não chega a vilanizar diretamente o personagem, colocando sua conduta mais como um produto de um meio cultural que responsabiliza a mãe quase que completamente pelo cuidado dos filhos, ao invés de um sujeito negligente.

Apesar disso, o filme está longe de retratar uma visão pessimista da maternidade. A enérgica Tully acaba servindo de contraponto para o cansaço de Marlo e a relação das duas cria uma dinâmica agridoce que vê tanto os problemas quanto a beleza da vida maternal. Na verdade as duas servem como uma metáfora da “dupla jornada” que uma mãe precisa desempenhar, sendo necessário praticamente duas pessoas para que uma mulher cumpra o que a sociedade espera de uma “boa mãe”.

A reviravolta final acaba sendo relativamente previsível, mas o diálogo final entre Marlo e Tully serve como um belo lembrete de que por mais que a maternidade mude a rotina e a vida de uma mulher, ela não precisa esquecer quem foi antes ou anular sua personalidade só para cumprir com seu papel. A epifania da protagonista é um pouco súbita, tendo um inesperado acidente quase que como sua única motivação, mas o texto de Diablo Cody e a direção de Reitman são carregados de tanto afeto e sinceridade por suas personagens que é difícil não se deixar levar por elas.

Tully é, portanto, um retrato sincero e sensível tanto da solidão e dificuldades maternas quanto do amor e beleza contidos no ato de gerar uma vida.


Nota: 8/10


Trailer

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