quinta-feira, 9 de agosto de 2018

Crítica- Você Nunca Esteve Realmente Aqui


Análise Crítica- Você Nunca Esteve Realmente Aqui


Review - Você Nunca Esteve Realmente Aqui
Na superfície Você Nunca Esteve Realmente Aqui parece mais um daqueles filmes estilo Busca Implacável (2008) com um calejado ex-militar embarcando em uma jornada brutal para resgatar uma garota. Essa obra da diretora Lynne Ramsay se vale deste tipo de premissa, mas não tem o interesse na construção de um espetáculo de ação ou suspense tal como a maioria dos produtos que contam esse tipo de história. Seu filme parece mais interessado nas marcas que essa violência deixa na mente e no corpo de seu protagonista do que nas reviravoltas ou pancadaria.

A trama é centrada em Joe (Joaquin Phoenix), um ex-soldado que ganha a vida resgatando crianças desaparecidas. Uma grande oportunidade de pagamento surge quando ele é contratado para encontrar Nina (Ekaterina Samsonov), a filha de um influente político, mas ao localizar a garota Joe logo descobre que se envolveu em algo muito maior do que imaginava.

Joaquin Phoenix é ótimo ao evocar a natureza atormentada e autodestrutiva de Joe, um sujeito cujo aspecto físico descuidado, barba desgrenhada, roupas velhas e cicatrizes parece berrar silenciosamente “não se aproxime” para qualquer um que pouse os olhos sobre ele. Seu ímpeto autodestrutivo, fruto do que parecem ter sido décadas de dor, traumas e desilusão, se manifesta constantemente em suas “brincadeiras” com uma faca na boca ou quando coloca um plástico ao redor da cabeça.

O melhor instante no qual percebemos o quanto ele se sente miserável é quando ele pega um punhado de doces de um pote. “Não tem verde”, ele diz, afirmando que são seus favoritos. Segundos depois ele encontra um doce verde e um plano detalhe nos mostra ele esmagando o doce entre os dedos. Pode parecer uma imagem inconsequente, mas diz muito sobre o personagem: alguém que destrói aquilo que adora, que não consegue apreciar o que poderia ser um breve instante de satisfação.

Esse sentimento de que Joe é alguém instável é ressaltado pela montagem, cheia de jump cuts que cortam abruptamente para flashbacks (ou talvez delírios?) envolvendo o passado traumático do personagem. Do mesmo modo, a música recorre constantemente a notas graves, batidas percussivas e eletrônicas para transmitir um senso de movimento e inquietação pulsantes. Joe parece sempre à beira de surtar e o modo como o filme constrói suas imagens e sons é feito para nos deixar imersos nesse estado mental de incerteza, fragmentação e fuga da realidade.

Como já falei, o filme não está interessado em grandes reviravoltas ou cenas de ação, mas isso não significa que ele economize na violência gráfica quando necessário. A violência, junto com a natureza sombria e decadente dos ambientes dão um ar pulp (designação dada à literatura de suspense, terror ou mistério impressa em papel de má qualidade) à toda narrativa e como é comum neste tipo de história, nem tudo é respondido e algumas coisas podem ficar um pouco confusas. A falta de respostas não chega a ser um problema, já que o interesse maior é no percurso de Joe, mas incomoda o quão pouco desenvolvida é a relação entre Joe e Nina considerando que ela é a força motriz do filme.

Você Nunca Esteve Realmente Aqui pode ter mais estilo que substância, mas é consistente o suficiente em mergulhar na mente fraturada de seu protagonista que acaba oferecendo uma jornada intensa de trauma e reparação.

Nota: 7/10


Trailer

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