A quarta temporada de BoJack Horseman se tornou marcante ao
explorar o traumático passado familiar do protagonista e no impacto negativo de
relação dele com os pais. Esta quinta temporada, por sua vez, ganha força ao
explorar como a conduta destrutiva de BoJack afeta todos ao redor dele e como
até aqui a maioria dos personagens foi permissivo com as ações do protagonista.
A narrativa da temporada é
centrada na nova série estrelada por BoJack (Will Arnett) na qual ele
interpreta um policial durão, traumatizado e abusivo. Durante as gravações BoJack
se envolve com Gina (Stephanie Beatriz, a Rosa de Brooklyn Nine Nine), sua co-estrela na série dentro da série. Diane
(Alison Brie) participa como roteirista, Princess Carolyn (Amy Sedaris) é uma
das produtoras e inexplicavelmente Todd (Aaron Paul) se torna um dos executivos
da empresa de streaming responsável
pela série protagonizada por BoJack. Assim, a trama consegue unir todos os
personagens em um mesmo espaço, evitando a natureza fragmentada da temporada
anterior.
A escolha de contar a produção de
uma série dentro da série serve como veículo para comentar sobre o momento da
produção televisiva dos EUA e a nova “era de ouro” na qual ela se encontra (ou Peak TV como dizem os veículos de lá),
cheia de séries sombrias e pessimistas protagonizada por homens anti-heróis de
comportamento questionável. Com isso, a quinta temporada zoa essa tendência
televisiva de tratar tudo que é sisudo, violento e sexualizado como um sinônimo
de conteúdo maduro, complexo ou de qualidade. Flip (Rami Malek), o showrunner da série dentro série, fica a
todo momento dizendo coisas do tipo “a escuridão é uma metáfora para
escuridão”, construindo um olhar irônico sobre como essa tendência da televisão
virou um padrão repetido no piloto automático.
A série dentro da série também
permite comentar sobre a masculinidade tóxica que permeia Hollywood (ou
Hollywoo, no universo de BoJack Horseman)
e como essa tendência televisiva de anti-heróis moralmente questionáveis servem
para relativizar e atenuar a conduta abusiva dos seus protagonistas masculinos.
É quase como se BoJack Horseman
fizesse uma meta crítica, já ela própria é uma série sobre um homem que
continua a receber segundas chances apesar de claramente continuar repetindo os
mesmos padrões de comportamento. Em um dos últimos episódios da temporada Diane
confronta Bojack sobre a conduta dele, fazendo um meta-comentário sobre como
esse tipo de narrativa é mais cúmplice do que crítica do comportamento abusivo
de seus protagonistas.
A ideia de que a série está
mirando no machismo no meio do entretenimento fica clara no quarto episódio
quando BoJack acidentalmente vira um “herói feminista” ao falar o óbvio na
televisão (dizer que homens não devem estrangular mulheres) enquanto que Diane
é tratada como “feminista mal amada” por denunciar o machismo e patriarcado da
sociedade de maneira mais consistente e incisiva. O episódio mostra o duplo
julgamento que há entre homens e mulheres.
Há um foco maior na jornada das
personagens femininas. Na complicada jornada de Carolyn para tentar adotar uma
criança e um episódio inteiro dedicado a ida de Diane ao Vietnã, trabalhando
questões de nacionalidade e identidade. Não deixa de ser curioso que na busca
por raízes, Diane apenas descobre o quanto não pertence àquele lugar e está
desconectada daquela herança cultural ao mesmo tempo que percebe que nunca será
plenamente tratada como alguém nascida nos Estados Unidos.
Isso não significa, no entanto,
que BoJack fica em segundo plano. Na verdade, há um episódio inteiro no qual
ele é o único personagem em cena. Em “Churros
Grátis” vemos Bojack discursar em um funeral e o episódio permite que o
personagem dê vazão a todos os seus sentimentos envolvendo sua péssima relação
com os pais e o impacto negativo deles em sua vida. É impressionante como um
episódio inteiro com um único personagem falando sem parar, quase como um podcast, consegue nos manter envolvidos
durante toda a sua duração, mérito tanto do texto quanto da dublagem de Will
Arnett.
Vários episódios da temporada
jogam com diferentes estruturas narrativas, como o sétimo episódio, que é todo
contado sob o ponto de vista de duas mulheres (dubladas por Issa Rae e Wanda
Sykes) que tiveram que trabalhar com Bojack, Diane, Todd e Carolyn, com as
aparências dos personagens se alterando para acomodar o ponto de vista das
narradoras. Já o oitavo episódio alterna entre várias festas de Dia das Bruxas
em anos diferentes para mostrar como Mr. Peanutbutter (Paul F. Thompkins)
repete as mesmas escolhas imaturas em seus diferentes relacionamentos.
Em sua quinta temporada, Bojack Horseman continua mostrando que é
a melhor animação da televisão e uma das melhores séries, conseguindo oferecer
risos altos e reflexões profundas com a mesma intensidade.
Nota: 9/10
Trailer
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