quarta-feira, 26 de setembro de 2018

Crítica – Maniac


Análise Crítica – Maniac


Review – Maniac
Maniac, escrita por Patrick Sommervile (um dos roteiristas de The Leftovers) e dirigida por Cary Fukunaga (que dirigiu a primeira temporada de True Detective), é uma minissérie estranha. Digo isso não só pela premissa e estrutura narrativa, mas também pelo modo como ela embarca em digressões longuíssimas que às vezes perdem de vista os temas principais da trama. Nesse sentido, sua pulsão em ser esquisita é simultaneamente sua melhor qualidade e seu pior problema e imagino que, em virtude disso, será um daqueles produtos com reações extremadas, que você ou ama ou detesta.

A história se passa em um futuro próximo. Annie (Emma Stone) tem problemas em lidar com um trauma do passado e está viciada em uma droga experimental e consegue um meio de entrar em um teste clínico para tentar obter mais da droga. Owen (Jonah Hill) é um jovem esquizofrênico e filho mais novo de uma rica família. Seu pai pediu para que ele testemunhe e minta em favor do irmão mais velho, Jed (Billy Magnussen), acusado de assédio. Owen sabe que o irmão é culpado e quer fugir para não precisar testemunhar, mas para conseguir dinheiro acaba indo parar no mesmo teste clínico que Annie.

O teste é para um conjunto de três drogas que basicamente funcionam como terapia, fazendo o usuário entender seus traumas, mecanismos de defesa que o impedem de superar os problemas e o levam a confrontar seus traumas para superá-los. O teste levará Owen e Annie por uma viagem em suas mentes.

A estranheza da série já começa antes mesmo que os protagonistas embarquem na viagem por seus subconscientes. Apesar de se passar no futuro, com inteligência artificial e robôs varrendo a rua, tudo tem um design retrô e analógico, cheio de cabos, plugues e botões, como se estivéssemos em uma versão hipertecnológica dos anos oitenta. Essa disjunção entre o avanço tecnológico e a apresentação visual dessa tecnologia ajuda a deixar evidente desde o início a natureza excêntrica e absurda da produção, elementos que permearão também a trama e os personagens.

Se a premissa soa demasiadamente complexa, a série já nos dá a chave de leitura de toda sua bizarrice nos primeiros minutos em uma narração sobre micro-organismos e interconexão das coisas. É uma trama sobre a busca por conexões, sobre a importância e necessidade dessas conexões para a experiência humana e como nós mesmos colocamos obstáculos a essas conexões por conta de nossas neuroses, traumas e problemas internos. Esses temas são evidenciados de certa forma pelas constantes menções ao livro Dom Quixote de Cervantes, uma história sobre um homem preso em uma fantasia que se aliena do resto das pessoas.

Uma vez no teste clínico, as drogas tomadas por Owen e Annie os levam a uma série de fantasias imaginárias dentro de suas mentes. Esses cenários são feitos para ajudar os personagens a entenderem seus traumas individuais. Nesses momentos, a série usa essas viagens subconscientes para contar histórias autocontidas que servem como metáforas para os conflitos internos dos personagens enquanto transitam por diferentes gêneros narrativos: de histórias criminais a fantasias estilo O Senhor dos Anéis, passando por filmes de roubo e espionagem.

É nessas vinhetas autocontidas que reside o maior dos problemas da série. A maioria deles dura episódios inteiros, alguns mais de um, mas bastam alguns minutos para que entendamos o que esses cenários estão revelando sobre aquelas pessoas. Por mais que essas metáforas sobre a psique de seus personagens sejam bem sacadas, a sensação, como é comum em séries da Netflix, é que eles estão ali só para estender o número de episódios e que a trama em si comportaria uma minutagem bem menor.

Outro problema é que a maioria dessas vinhetas não é tão estranha, esquisita ou excêntrica quanto a série pensa que elas são. A maioria delas transcorre como exemplares típicos, ainda que com um viés um pouco satírico, dos gêneros que referenciam, faltando a maluquice e bizarrice que se esperaria de um produto tão pouco convencional. Só mesmo nos últimos episódios, quando as realidades começam a se fundir e interferir uma na outra é que a série embarca totalmente no absurdo criativo que sua premissa pode proporcionar e quando isso acontece é uma delícia de assistir.

Algumas subtramas, em especial a que envolve o Dr. Mantleray (Justin Theroux) e sua relação mal resolvida com a mãe (Sally Field) e a colega de trabalho, a Dra. Fujita (Sonoya Mizuno), também soam como desvios que se distanciam demais do conflito principal de Annie e Owen. Por outro lado, Theroux e Field são tão comprometidos com o exagero neurótico de seus personagens que é difícil não se deixar envolver por eles.

Jonah Hill entrega uma performance mais discreta que de costume, uma decisão consciente que visa fazer de Owen um sujeito introspectivo, que passa mais tempo dentro da própria cabeça do que no mundo exterior. Emma Stone, por sua vez, traz uma dor bem palpável a Annie, uma mulher que não conseguiu superar a perda da irmã, Ellie (Julia Garner, da série Ozark), e se sente culpada pela morte dela.

É a Annie a quem pertence o centro emocional da trama em sua busca por confrontar o que a prende tanto à morte de Ellie, construindo um momento verdadeiramente poderoso quando, no penúltimo episódio, ela finalmente entende e aceita as razões por viver presa a esse trauma. A resolução de Owen, por outro lado, soa gratuita e pouco merecida já que a cena do cubo mágico nunca convence como um momento de epifania consistente na qual ele finalmente entende que sua família nunca lhe dará o respeito que espera. A trama ainda acerta ao ir por um caminho óbvio de construir um romance entre os dois protagonistas, lembrando que uma conexão entre duas pessoas não se resume somente ao amor romântico.

Maniac é como uma longa sessão de terapia: às vezes você se pergunta o que está fazendo ali e às vezes você enrola para não precisar mover as questões adiante, mas o resultado final acaba sendo emocionalmente satisfatório apesar das irregularidades.

Nota: 7/10


Trailer

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