Depois de um competente início, a
segunda temporada de Ozark traz ainda
mais tensão, suspense e dilemas morais para os esquemas criminosos da família
Byrde. Cheguei a pensar que seria mais no mesmo, mas neste segundo ano, os
membros da família enfrentam constantes desafios que os levam ao limite.
A temporada começa no ponto em
que a anterior terminou, com Marty (Jason Bateman) tendo que explicar a morte
de Del (Esai Morales) para o cartel depois que Jacob (Peter Mullan) e Darlene
Snell (Lisa Emery) o matam por puro despeito. Marty se compromete em construir
um cassino em seis meses para poder lavar tanto o dinheiro do cartel quanto o
dos Snell. Aprovar o cassino, no entanto, não será tão fácil quanto parece, já
que além de manipular políticos para passarem as leis necessárias, ele também
precisará lidar com a máfia de Kansas City. Como se esses obstáculos não fossem
o suficiente, Marty continua na mira do agente Petty (Jason Butler Harner),
disposto a tudo para eliminar o cartel. Outra complicação é a saída do pai de
Ruth (Julia Garner) da cadeia, já que ele se torna obcecado em roubar o
dinheiro de Marty.
Desde sua estreia no ano passado,
a série é comparada a Breaking Bad
por também trazer um pai de família aparentemente pacato que recorre ao crime,
mas eu diria que as similaridades são meramente superficiais. Enquanto Walter
White (Bryan Cranston) buscava estabelecer dominância no submundo do tráfico,
não hesitando em usar quem quer que fosse, Marty e Wendy (Laura Linney) estão
apenas tentando sobreviver às ameaças que são o cartel e os Snell. Por mais que
eles o casal tome ações deploráveis ao longo da série, eles não são nem de
longe as piores dali, com Marty muitas vezes se esforçando para tentar
conciliar conflitos ao invés de iniciá-los.
Na verdade, ao longo da temporada
vemos como as consequências de todas as coisas horríveis começam a pesar na
mente de alguém que ainda possui um relativo senso moral como Marty. Isso fica
evidente principalmente após a morte de Mason (Michael Mosley). O crime e a
violência são como um vírus, uma mácula que impregna aqueles personagens e se
espalha por todos ao redor como uma infecção. Por mais que Marty tente, suas
ações afetam negativamente seus filhos, Jonah (Skylar Gaetner) parece assustadoramente
confortável com todas as trapaças de seus pais e constantemente se oferece para
ajudar, enquanto que Charlotte (Sofia Hublitz) se sente cada vez mais sufocada
pelo que acontece em casa.
A ideia de que o crime deixa uma
marca indelével em todos ao seu redor também é vista no arco dramático da
família Langmore. Wyatt (Charlie Tahan) se acha indigno de ir para faculdade
por achar que sua família é de algum modo amaldiçoada e todos os seus parentes
ou antepassados eram criminosos.
Seus sentimentos são postos para
fora nas conversas imaginárias que tem com o falecido pai, a melhor delas é
quando Wyatt lembra do pai tocando The
Man Who Sold The World (“O Homem Que
Vendeu o Mundo” em português) do David Bowie. Além da beleza melancólica
que a performance da canção adiciona à cena, a canção não parece ter sido
escolhida por acaso, com sua letra falando de um homem que perde o rumo depois
de conhecer uma figura misteriosa. A canção dialoga com o arco de Russ (Marc
Menchaca), o pai de Wyatt, na temporada anterior, já que sua inesperada relação
com o agente Petty foi o que causou sua ruína. A música também funciona como uma síntese da série em si e
da jornada de Marty, um homem que chega em uma nova cidade querendo comprar
tudo e todos, prometendo fortunas, mas que só causa dor àqueles que aceitam seu
dinheiro, como Mason ou Rachel (Jordana Spiro).
A mácula do crime também está
presente na subtrama de Ruth envolvendo o retorno de seu abusivo pai, Cade
(Trevor Long), por quem ela sente um misto de temor e respeito. A atriz Julia Garner
é ótima em mostrar como Ruth tenta esconder seu medo com uma postura durona,
nos dando sutis vislumbres de que por baixo de sua fachada de resiliência há
uma garota assustada que sente o peso de ter que cuidar da família inteira e
que luta consigo mesma para aceitar que eventualmente terá que enfrentar o pai.
Os dez episódios também são
hábeis na construção do suspense, sempre nos dando a impressão que de que os
Byrdes estão prestes a perder tudo e dos riscos que o não cumprimento de sua
promessa para o cartel acarreta. Parte disso se deve à qualidade dos
antagonistas, da natureza instável e imprevisível de Darlene Snell ao
comportamento obcecado do agente Petty, os antagonistas se mostram oponentes
dignos da família principal ao usarem ardis tão inteligentes quanto os da
família principal, dando a impressão que os protagonistas sempre estão prestes
a serem esmagados por forças maiores que eles.
Impressiona o quanto a trama
consegue nos deixar tensos pelos personagens sem precisar muitas vezes recorrer
à violência explícita (embora isso ocorra em alguns momentos) ou diálogos. É
possível perceber isso quando Ruth é torturada pelo cartel, já que vemos muito
pouco da tortura em si, mas ouvimos o som dos gemidos e vemos as reações dos
personagens do lado de fora. Do mesmo modo, a caminhada dos Snell pela floresta
em um dos últimos episódios da temporada tem um senso palpável de tensão sem
que nenhum dos dois precise dizer nada, já que naquele ponto da trama sabemos
que o casal chegou a um ponto em que suas diferenças são irreconciliáveis.
Essa segunda temporada de Ozark aprofunda seus personagens ao
levá-los por caminhos ainda mais sombrios e confrontá-los com as consequências
de suas ações.
Nota: 9/10
Trailer
Nenhum comentário:
Postar um comentário