O diretor David Gordon Green se
tornou famoso por seu trabalho em comédias como Segurando as Pontas (2008) e Sua
Alteza (2011), mas nos últimos anos migrou para o drama com o bacana Joe (2013) e o recente O Que Te Faz Mais Forte. Agora ele entra
no reino do terror com este Halloween,
uma continuação do seminal terror de 1978 dirigido por John Carpenter. Tal como
outros realizadores vindos da comédia, caso de Jordan Peele em Corra! (2017) ou John Krasinski em Um Lugar Silencioso (2018), os
resultados obtidos por Green são surpreendentemente satisfatórios.
A trama ignora todas as outras
continuações e considera apenas o original de 1978 em sua linha do tempo. O
assassino Michael Myers está preso há décadas, mas ninguém conseguiu penetrar
na sua mente para compreendê-lo. Enquanto isso Laurie Strode (Jamie Lee
Curtis), a única sobrevivente de seu ataque em 1978, se tornou uma mulher
solitária e paranoica, vivendo isolada em uma casa de campo, sempre se
preparando para o retorno de Michael.
Green parece ter entendido muito
bem o que tornou o filme de Carpenter tão memorável, tanto em termos
estilísticos quanto narrativos, embora nunca tente fazer uma mera emulação do
modo de filmar de Carpenter. Sua câmera cria quadros amplos nos quais o que
acontece ao fundo ou nos cantos é tão (ou mais) importante do que aquilo que
está ao centro. Seu terror não pula na nossa cara, vai aos poucos sendo
insinuado em reflexos no canto de uma janela, figuras se movimentando ao fundo
ou silhuetas se movendo na escuridão. O não visto, o desconhecido são a matéria
prima com a qual a tensão é construída.
Falando em desconhecido, a trama
é inteligente em entender a dimensão simbólica na qual o assassino Michael
Myers opera. Ele não é um indivíduo, ele é “o mal”, ele é uma força da
natureza, o bicho-papão, o monstro que sai à caça no Dia das Bruxas (ou
Halloween em inglês). Uma representação física da violência urbana que tanto
nos assusta e não conseguimos compreender. O que ele faz é mais importante do
que quem ele é e é por isso que praticamente não vemos seu rosto. Ele é a violência
que se espalha pelas cidades e isso fica evidente já em uma das primeiras cenas
do filme quando os presos do manicômio ficam agitados e agressivos quando um
repórter exibe a famosa máscara do assassino. É como se ele contaminasse todos
ao seu redor.
Essa mácula da violência é vista
também em Laurie. Ela mora em uma casa cheia de sistemas de segurança e armas
de fogo, mas apesar de tudo isso ela não se sente segura. Toda sua preparação,
todo seu treinamento não lhe trouxeram paz alguma, pelo contrário, ela só se
tornou mentalmente instável, alienando a filha, Karen (Judy Greer), e neta,
Allyson (Andi Matichack), de sua convivência.
Claro, por um instante parece que
a preparação de Laurie valeu à pena com seus ardis sendo eficientes em manterem
Michael longe, mas ao mesmo tempo, o filme sinaliza como a personagem foi de
vítima a algoz. Isso é construído a partir de reconstruções do filme original,
mas com o posicionamento invertido. Se antes era Michael que abria os armários
à procura de Laurie, agora é ela quem o procura. Se antes Michael era jogado da
varanda e desaparecia quando procuravam o corpo, agora é Laurie quem faz isso.
Se há alguma dúvida de que não há salvação, melhora ou catarse na violência, o
plano que encerra o filme, com uma personagem segurando a mesma faca usada por
Michaels, deixa evidente que a violência apenas gera mais violência.
Depois de décadas de continuações
decepcionantes e uma complicada mitologia que só diluía sua força, Halloween retorna ao básico para
produzir uma reflexão tensa e sangrenta sobre a natureza da violência.
Nota: 8/10
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