Assim como aconteceu com o
recente Teu Mundo Não Cabe nos Meus Olhos,
este O Que De Verdade Importa me fez
levantar a questão: até que ponto as boas intenções de um filme devem ser
levadas em conta? Até que ponto essas intenções são o suficiente para suplantar
seus defeitos? Lançado no ano passado nos Estados Unidos, toda a arrecadação da
bilheteria por lá seria revertida para uma
ONG, criada pelo falecido ator Paul Newman, que cuida de crianças com doenças
terminais (aqui no Brasil a arrecadação irá para diferentes instituições que cuidam de crianças com câncer). Uma motivação nobre, mas que no caso de O Que De Verdade Importa (assim como Teu Mundo...) os equívocos e problemas são tantos que todas as suas
boas intenções não conseguem superá-las.
A trama é centrada em Alec
(Oliver Jackson-Cohen), um engenheiro cujos negócios não estão indo bem, tem um
problema com jogos de azar, dívidas acumuladas e não sabe o que fazer na vida.
Uma oportunidade de mudança surge quando um tio rico, Raymond (Jonathan Pryce)
lhe pede para se mudar para o Canadá e ir morar em uma casa que pertence à
família há gerações. Lá Alec descobre que ele, como muitos de seus ancestrais
possui um dom de curar as pessoas e ele precisa decidir se abraça esse dom ou o
rejeita, mas a chegada de uma garota com câncer Abigail (Kaitlyn Bernard)
pedindo ajuda pode mudar a decisão de Alec.
O começo parece um misto de humor
e fantasia, ressaltando as personalidades excêntricas da pequena cidade
canadense e situações absurdas fruto dos poderes recém descobertos de Alec. Lá
pela metade, no entanto, quando Abigail entra na história, se torna um
dramalhão pesado, choroso, cheio de platitudes vazias que parecem profundas,
mas não dizem nada (a fala sobre tomar fôlego é constrangedora). A impressão é
que a narrativa nunca sabe exatamente o que quer ser ou fazer com seus
personagens, diferente de algo como Questão de Tempo (2013) que trabalha o tempo todo para equilibrar drama, comédia e
fantasia.
É estranho, pois mesmo nas cenas
de drama mais chorosas e com uma mão pesada no intento de emocionar apresentam
músicas alegres e descontraídas, como se o diretor Paco Arango de fato não
soubesse que viés dar ao material que tinha mãos, o que é bizarro considerando
que ele próprio escreveu o filme. Além das inconsistências tonais, a narrativa
também é inconstante no desenvolvimento de seus personagens. Alguns, como o
policial da cidade, soam como caricaturas exageradas que destoam totalmente do
resto do filme. O ator Jonathan Pryce é o único que parece imune a essas
inconsistências e seu humor seco rende os melhores momentos da trama.
Personagens se apaixonam ou se
tornam grandes amigos de uma hora para outra, sem que o texto faça qualquer
esforço para nos mostrar o desenvolvimento desse laço. Abigail, por exemplo,
desenvolve uma extrema afeição por Alec e Cecilia (Camilla Luddington) depois
de apenas passar um dia com eles. Sim, é uma garota que está carente e com uma
doença terminal, mas nada do que eles fazem ao longo do dia justifica essa transformação
radical na personagem.
O romance entre Alec e Cecilia
existe meramente porque o texto exige e toda a reviravolta envolvendo a
sexualidade de Cecilia, feita para soar engraçada, é bastante problemática. No
início ela diz a Alec que é lésbica, mas depois admite ter mentido porque não
queria que ele desse em cima dela, porque, claro, fingir ser lésbica é a única
maneira de dizer a um homem que você não está interessada. Outra questão é a
mensagem subjacente da trama que nos pede para crer na existência de pessoas
com poderes reais de cura, quando no mundo real as pessoas que se dizem
curandeiros cedo ou tarde são expostos como fraudes. Nesse sentido chega a ser
irresponsável que o filme tente nos convencer da importância de crermos que
algo assim exista. Eu entendo que a ideia era mostrar como qualquer um pode ser
uma força positiva no mundo e nas pessoas ao redor, mas quando a narrativa
situa isso com base no sobrenatural, a questão do curandeirismo acaba sendo
posta em evidência.
Todas as boas intenções não
impedem que O Que de Verdade Importa
seja uma completa bagunça que nunca se decide entre drama e comédia, pesa a mão
no sentimentalismo e apresenta mensagens questionáveis.
Nota: 3/10
Trailer
Nenhum comentário:
Postar um comentário