Eu já assisti muitos filmes
incrivelmente ruins nessa coluna, mas nenhum foi tão difícil de assistir quanto
este A Guerra das Comidas, que muitas
vezes aparece em listas de piores animações de todos os tempos. O filme teve
uma produção conturbada e levou quase treze anos até ficar pronto.
A produção
O projeto começou em 1999, uma
época em que longas animados com personagens tridimensionais ainda estavam
dando seus primeiros passos (Toy Story saiu
em 1995), visando um lançamento em 2003. O lançamento foi adiado quando os HDs
contendo o material foram supostamente roubados no que o diretor Lawrence
Kasanoff chamou de ato de “espionagem industrial”. Sério, o diretor alega que o
sumiço do material foi um crime perpetrado por concorrentes (que ele nunca
nomeou). Porque alguém roubaria uma pequena produtora e não Pixar, por exemplo,
está além da minha compreensão.
Apesar da desculpa estilo “o
cachorro comeu meu dever de casa”, a produção reiniciou os trabalhos em 2004,
mudando o estilo da animação de uma abordagem mais cartunesca para algo mais
centrado em captura de movimento. Uma nova data de lançamento foi estabelecida,
mirando em 2005, mas nada do filme ficar pronto. Foi então feito um acordo para
distribuir o filme com lançamento em 2007, que não aconteceu.
A distribuidora Lionsgate e os
investidores começaram a ficar inquietos diante dos sucessivos atrasos e
ativaram uma cláusula do contrato que forçava a seguradora da produção, a
Fireman’s Fund, a interferir e completar o filme o mais rápido e barato
possível. Assim, diante dessa sucessão de inaptidões, A Guerra das Comidas foi finalmente lançado em 2012 e o produto
final deixa evidente que se trata de algo mal acabado e porcamente feito.
O filme
A pobreza da produção já se
mostra sem pudores na tosca cartela de títulos que parece algo animado no Power
Point. A partir daí acompanhamos uma das animações mais visualmente horrendas
que meus olhos já tiveram o desprazer de serem expostos. Tudo parece mais uma
pré renderização inicial ao invés de um produto plenamente acabado. Texturas
pobres e simplórias, movimentação dura e artificial dos personagens, motores
gráficos incapazes de produzir uma física coerente (como na cena em que uma
personagem faz “embaixadinhas” com uma melancia e fruta não parece ter peso
nenhum), e cheio de bugs visuais como
o capô de carro que atravessa um poste logo no início ou o fato de que muitos
alimentos arremessados na tal guerra de comidas do título simplesmente
desaparecem ao tocarem no chão.
A trama se passa em um
supermercado no qual, ao serem apagadas as luzes, os mascotes dos produtos
vendidos saem para divertir. O cão Dex (voz de Charlie Sheen) é um detetive que
está apaixonado por Sunshine (Hillary Duff), mascote de uma marca de passas.
Quando Sunshine desaparece misteriosamente, Dex decide investigar e aos poucos
fica no rastro da sinistra Marca X, que está tentando dominar o mercado.
A primeira coisa que chama a
atenção é a falta de coesão do universo. Quando as luzes do supermercado se
apagam, as prateleiras automaticamente se transformam em prédios e o lugar vira
uma grande cidade com ruas e carros. Como isso funciona exatamente? As imagens
reproduzem a imaginação dos personagens? Se sim, como é que eles vão parar no
supermercado “normal” (como os humanos o veem) durante o dia? O mais bizarro é
que essa mudança brusca não parece afetar nem um pouco os personagens ou tem
qualquer repercussão na trama.
A trama, por sinal, é uma coleção
de cenas inconsequentes embaladas por um mistério óbvio e um humor baseado em
trocadilhos que deveriam ser de duplo sentido, mas são tão sem nexo que mal
conseguem ter um primeiro sentido, quem dirá um segundo. O conflito se resolve
facilmente, com Dex se infiltrando no prédio da Marca X (como? Não sei, ele
simplesmente aparece lá) e destruindo um pilar com uma corda. Além do texto
ruim, há a presença constante de mascotes de marcas de produtos reais, o que
torna o filme uma espécie de desculpa cínica para fazer publicidade para
crianças tal qual o péssimo Emoji: O Filme (2017).
Assim, por mais que a má
qualidade visual possa ser creditada nos problemas de bastidores, não dá para
relevar a completa inaptidão do roteiro em sequer contar uma história
minimamente coerente. Além dos problemas visuais, o filme apresenta também
problemas de áudio, com a qualidade do som da dublagem variando muito dentro de
uma mesma cena de um mesmo personagem. Uma fala soa cristalina, mas logo depois
o mesmo personagem soa como se o dublador estivesse a um metro de distância do
microfone.
Incompetente em todos os níveis,
assistir A Guerra das Comidas é uma
experiência tão sofrida que é capaz de causar dor e mal estar físico em
qualquer um desavisado o bastante para se submeter a essa atrocidade.
Trailer
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