A sexta e última temporada da
série House of Cards teve uma
produção conturbada. Dias depois do começo das gravações da temporada começaram
a sair denúncias de abuso sexual cometidas pelo ator Kevin Spacey. A sofrível
resposta de Spacey às acusações só piorou tudo e a Netflix (assim como outras
produtoras e estúdios) inevitavelmente cortou laços com o ator.
Com a perda do protagonista, a
série parou a produção para se reorganizar e decidir o que faria. Depois de
alguns meses, a produção foi retomada com a decisão de Claire (Robin Wright),
que tinha se tornado presidente no final da quinta temporada, seria a
protagonista da temporada final e que Frank, personagem vivido por Spacey,
ficaria completamente de fora. Isso deixava claro que o conflito entre Claire e
Frank que vinha se desenhando desde a quarta e quinta temporadas e que deveria
ser a força motriz dessa temporada climática jamais aconteceria.
Desta maneira, emergia a
pergunta: o que a equipe criativa teria feito em tão pouco tempo para
reestruturar uma temporada cujo conflito vinham construindo nos últimos dois
anos? A resposta é que foram feitas muitas adaptações e gambiarras que deixam
evidente os remendos narrativos, substituindo personagens ausentes (como Frank)
por outros, mas que, logicamente, por não terem a mesma relação com Claire não
geram o mesmo impacto dramático.
Na trama, Claire continua sendo
presidente depois da morte de Frank (e isso não é spoiler, já estava nos trailers e materiais de divulgação), mas
antigos aliados de seu falecido marido cobram dela promessas feitas por ele.
Assim, Claire inicia um disputa de poder com os irmãos Shepherd, Bill (Greg
Kinnear) e Anette (Diane Lane), dois dos mais ricos empresários do país, por
conta dela não ter interesse em honrar promessas que Frank fez para eles. Ao
mesmo tempo, Doug (Michael Kelly), ex-braço direito de Frank, descobre que
Claire ocultou dele algumas informações importantes sobre o testamento de Frank
e decide tornar a presidente seu alvo.
Robin Wright permanece ótima no
modo como constrói a personalidade fria e ardilosa de Claire, uma predadora
astuta que consegue manipular todos ao seu redor a ter tudo que quer. Tal como
acontecia com Frank em temporadas anteriores, Claire também se dirige
diretamente para a câmera, tornando o expectador um confidente e um cúmplice
das ilegalidades que ela comete. A presença dela na Casa Branca permite que a
série explore como uma mulher presidente seria tratada e o inevitável sexismo
que alguém assim enfrentaria.
A questão é que apesar da entrega
de Wright, o texto não lhe dá muito com o que trabalhar. O cabo de guerra entre
ela os Shepherds não tem muita diferença em relação ao confronto entre Frank e
o bilionário Raymond Tusk em temporadas anteriores. Além disso, Claire e Doug
estão sempre tão à frente de seus oponentes que raramente existe tensão ou suspense
em relação ao que acontecerá. Não ajuda que eles sejam antagonistas tão sem
carisma. O texto tenta humanizar Bill com o fato dele estar gravemente doente,
mas isso faz pouco para acrescentar complexidade ou simpatia pelo personagem.
Há também uma tentativa de
comentar em eventos políticos recentes, como o uso de redes sociais para captar
dados da população, as relações de conluio do governo dos EUA com a Rússiae
alguns outros temas, mas a trama passa rápido demais por tudo isso para
produzir alguma reflexão significativa ou que outras temporadas já não tenham
feito melhor. Na verdade, essa temporada dá a impressão de algo excessivamente
corrido, como que com pressa de chegar ao final e muita coisa acontecendo “off câmera” precisando ser explicada depois
em longos diálogos expositivos.
Fica bem explícito que o
propósito de Doug nessa temporada é servir como uma espécie de substituto do
que deveria ser o arco de Frank nesta temporada e sua disputa com Claire. A
questão é que Claire e Doug mal interagiam ao longo das outras cinco temporadas
e o enfrentamento de ambos jamais soa como a culminância de tudo que a série
fez até aqui. A falta de uma rivalidade maior construída faz a última cena da
série carecer de força, da sensação de clímax, encerrando tudo de maneira
apática.
Assim, por mais que Robin Wright
dê tudo de si como Claire, ela não consegue carregar sozinha uma temporada
cheia de conflitos desinteressantes e trama apressada. A sexta temporada de House of Cards acaba sendo um clímax
inane para uma série que já vinha dando sinais de desgaste.
Nota: 5/10
Trailer
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