domingo, 20 de janeiro de 2019

Crítica – O Justiceiro: 2ª Temporada

Análise Crítica – O Justiceiro: 2ª Temporada


Review – O Justiceiro: 2ª Temporada
Considerando que a Netflix vem cancelando todas as suas séries com a Marvel em virtude de seu contrato de parceria estar chegando ao fim e a Disney/Marvel estar criando uma plataforma própria streaming, não estava particularmente empolgado para assistir essa segunda temporada de O Justiceiro apenas para que ela fosse cancelada algumas semanas depois de ser disponibilizada independente do quão boa seja. Demolidor, por exemplo, entregou uma excelente terceira temporada e ainda assim foi cancelada por conta do iminente fim da parceria entre Marvel e Netflix, então é bem provável que O Justiceiro também seja, mesmo com esse segundo ano sendo razoavelmente tão bom quanto o primeiro.

Frank Castle (Jon Bernthal) está viajando pelo interior dos Estados Unidos tentando reconstruir sua vida. Ele conhece Beth (Alexa Davalos) em um bar e se mostra disposto a se envolver com outra pessoa. Tudo muda quando ele vê a garota Amy (Giorgia Wingham) sendo perseguida por um grupo de criminosos e decide intervir. Aparentemente a jovem carrega consigo um rolo de filme contendo material comprometedor e alguém poderoso quer garantir que ela e o material sejam destruídos, colocando o assassino John Pilgrim (Josh Stewart) no rastro da garota. Ao mesmo tempo, Billy Russo (Ben Barnes) acorda do coma depois de quase ter sido morto por Frank na temporada anterior. Sem memória do que ocorreu, Billy quer descobrir quem destruiu seu rosto.


O primeiro episódio da temporada desenvolve sem pressa o que aconteceu com Frank depois do ano de estreia, mostrando o esforço dele em tentar uma vida normal. É um pouco mais lento que o restante da temporada, mas importante para lembrar que ainda existe um ser humano em algum lugar dentro de Frank e não apenas raiva e luto. O resto da temporada, no entanto, flui bem ágil, evitando os engasgos da primeira e de muitas outras séries da Netflix.

Por outro lado, fica a impressão, tal qual aconteceu com a segunda temporada de Demolidor, de que estamos vendo quase que duas temporadas juntas em uma só. Digo isso porque a trama de Amy e a trama de Billy são bem separadas uma da outra e quase não se conectam. Assim que Frank e Amy chegam a Nova Iorque, Amy, Pilgrim e outros personagens relevantes para a trama da garota praticamente somem por alguns episódios para focar na relação entre Frank e Billy. Talvez tivesse sido melhor levar o arco de Amy até o fim para só então entrar na trama de Billy, talvez assim, não tivéssemos a impressão de que a série larga de mão o que deveria ser sua trama principal por um punhado de episódios.

Mesmo com esse senso de desconexão, a temporada funciona por conta da exploração da relação entre Frank e os dois vilões. Pilgrim, que parece baseado no vilão dos quadrinhos chamado Menonita (e imagino que a Netflix deve ter evitado usar o nome para não criar problemas com a religião menonita), é um ex-neonazista que renasceu em Cristo e ocasionalmente faz o trabalho sujo de um casal de políticos ultraconservadores. Assim como Frank ele é alguém que tenta se afastar de seu passado de violência e reconstruir sua vida, mas é constantemente puxado de volta para seus velhos hábitos.

Já Billy é quase como um reflexo distorcido de Frank, alguém que o protagonista poderia ter se tornado se não tivesse uma família que o amasse e o apoiasse. Ao contrário de Frank, Billy foi sempre sozinho e não tinha nada para aliviar ou humanizar seu cotidiano de violência. Ben Barnes inclusive injeta uma boa dose de humanidade em Billy, nos fazendo vê-lo como um sujeito destruído, traumatizado e solitário ao invés de um mero psicopata genérico. Isso ajuda a dar uma complexidade a Billy, embora ele não alcance o alto nível de vilões como o Rei do Crime ou Kilgrave. As cicatrizes no rosto de Billy, porém, falham em dar ao personagem o aspecto grotesco que o roteiro diz que ele tem. São bem leves considerando o que Frank fez com ele no final da primeira temporada e também o visual do vilão nos quadrinhos. Na verdade, a série foca mais nas cicatrizes emocionais de Billy do que nas físicas.

Alguns personagens que retornam da temporada anterior acabam tendo um pouco mais de espaço e um papel mais ativo no combate aos vilões, como acontece com Madani (Amber Rose Revah) e Curtis (Jason R. Moore). Se o texto acerta ao dar mais espaço para os personagens conhecidos, decepciona no tratamento de muitos personagens novos. Beth acaba sendo reduzida ao clichê de “mulher na geladeira”, uma personagem feminina que não tem qualquer outro propósito a não sofrer uma violência para motivar o protagonista masculino. O casal de políticos conservadores é pouco memorável, sendo o lugar-comum do político inescrupuloso que já vimos inúmeras vezes. O texto também demora um pouco a achar o tom certo para Amy, que começa como uma pirralha irritante, mas depois começa a desenvolver melhor o laço de empatia entre ela e Frank.

A pior coisa da temporada, no entanto, é a psiquiatra Krista, interpretada por Floriana Lima (a Maggie Sawyer de Supergirl), que fica responsável por tratar de Billy. A trama tenta dar ela um certo ar de ambiguidade, tentando nos deixar em dúvida durante uma parte da temporada se ela é uma profissional ingênua e idealista que sinceramente acredita que pode “curar Billy” ou se ela é tão sociopata e sádica quanto ele.

A questão é que nenhuma das duas abordagens funciona. A primeira falha porque ela rapidamente cruza a linha entre ingenuidade e estupidez, clamando que Billy pode ser redimido mesmo depois de vê-lo cometer crimes, atirar na polícia ou matar pessoas. A segunda falha porque o texto nunca dá a ela motivação para ser tão cruel ou desprovida de empatia, sendo maligna sem motivo nenhum. Sim, há a questão do trauma dela envolvendo o pai, mais isso justifica mais a primeira do que para a segunda. Assim, cada minuto gasto com Krista é uma imensa perda de tempo.

As cenas de ação continuam ótimas em explorar a letalidade brutal de Frank Castle, constantemente colocando o protagonista em situações de desvantagem, construindo uma sensação de perigo por vermos cada embate como uma luta pela vida, com Castle raramente saindo ileso. Parte do que faz as cenas de ação tão boas é a predileção pelo uso de dublês e efeitos práticos ao invés de recorrer a computação gráfica e sangue digital como a recente Titãs, o que acabava tirando parte do impacto da violência. Jon Bernthal continua excelente como Frank, sendo a melhor encarnação de carne e osso do personagem. Bernthal é hábil em lidar tanto com a faceta mais bruta e maníaca de Frank quanto do seu lado de viúvo enlutado e tomado pela dor, colocando várias camadas entre esses dois extremos.

Corrigindo alguns problemas da temporada anterior, mas cometendo alguns outros erros, a segunda temporada de O Justiceiro vale pelo seu ritmo ágil, ótimas cenas de ação e pelo modo como explora a relação entre o protagonista e os vilões.


Nota: 7/10


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