No papel, a história real que inspirou este Crimes Obscuros poderia render um ótimo
filme. Um escritor polonês assassinou um empresário e anos depois escreveu um
romance no qual narrava o crime com precisão, o que acabou chamando atenção da
polícia e levando à sua prisão. Seria possível usar essa história para discutir
os limites da ficção ou fazer uma narrativa policial metalinguística que
tratasse como o gênero em si constrói tramas sobre personagens que buscam
evidências do mundo real para criar narrativas que expliquem os fatos
investigados. Crimes Obscuros, porém,
não faz nada disso e se contenta em ser banal e violento.
No filme, o policial polonês Tadek (Jim Carrey) decide
reabrir um caso de assassinato de três anos atrás quando descobre que o
escritor Kozlov (Marton Csokas) narrou o crime em detalhes em um de seus
romances sendo que as informações do assassinato nunca foram divulgadas ao
público. Aos poucos Tadek vai se tornando obcecado em resolver o crime e acaba
se aproximando da ex-namorada de Kozlov, Kasia (Charlotte Gainsburg), e cruza
limites éticos que comprometem a investigação.
É uma típica história do policial que fica perigosamente
“contaminado” pela violência do seu cotidiano ao ponto de perder a perspectiva.
O problema, no entanto, nem é remeter a uma estrutura manjada, mas executá-la
sem qualquer nuance ou esforço (como a série Mindhunter, que também trata de um investigador que perde a
perspectiva) resultando em um produto que não tem nada a dizer sobre as doses
cavalares de violência explícita, incluindo estupros, que mostra.
Como Tadek é desde o início um sujeito infeliz e deprimido,
fica difícil perceber qualquer grande transformação nele ao longo do caso,
tirando o impacto de sua jornada, já que parece que ele apenas esperava a
oportunidade de dar vazão às trevas que tinha em si ao invés de um sujeito
tragicamente transformado pela violência. Do mesmo modo, o vilão Kozlov deveria
ser um sujeito astuto e ardiloso, mas ao invés disso ele soa como um boçal
estúpido que só abre a boca para desfiar um niilismo de botequim inócuo que
nunca serve para refletir as questões de verdade e ficção que o filme tenta
abordar. Como nenhum dos personagens soa particularmente interessante nem nos
dá qualquer vontade de torcer por eles, a reviravolta da última cena acaba não
tendo impacto algum.
Não ajuda que elenco, direção e roteiro confundam exagero
com intensidade. Todos os personagens e situações berram o tempo todo ao
espectador o quanto eles são sombrios, sórdidos e corrompidos, mas o filme não
tem nada a dizer sobre essa decadência moral ou social. Suas cenas de violência
ou estupro não tem qualquer outra função a não ser produzir o choque por conta
de sua representação gráfica, não sendo nada mais do que uma fetichização inane
da violência. A mão do filme é tão pesada que por vezes tudo soa quase
autoparódico, como se eu estivesse vendo algum esquete cômico zoando toda essa
tendência de filmes dark, depressivos
e sisudos, ou então algo feito por um pré-adolescente que achar que ser
violento e monocromático é sinônimo de ser maduro e complexo.
No fim, Crimes
Obscuros é uma exploração vazia da violência e sordidez humanas,
prejudicada pelo ritmo arrastado e personagens desinteressantes.
Nota: 2/10
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