quinta-feira, 14 de fevereiro de 2019

Crítica – Guerra Fria


Análise Crítica – Guerra Fria


Review – Guerra Fria
Na década de 50, na Polônia comunista, uma jovem cantora, Zula (Joanna Kulig), se apaixona por um maestro francês, Wiktor (Thomasz Kot). Ao longo dos anos, eles se encontram e se afastam por conta das vidas que cada um leva, mas se mantem apaixonados um pelo outro. Em seu cerne Guerra Fria é uma típica história de “amor proibido”, de duas pessoas separadas por questões políticas e sociais que muitas vezes escapam seu próprio controle. Com essa premissa o filme poderia ser um dramalhão meloso feito para forçar o choro da audiência, mas o diretor Pawel Pawlikowski vai na contramão de como esperamos que uma história assim seja contada.

Essa impressão já surge desde o começo do filme. Nos primeiros minutos vemos Wiktor perguntar a Zula se os boatos de que ela matou o pai são verdadeiros. Ela percebe o interesse de Wiktor nela e diz que sabe como os homens são, parecendo rejeitar o maestro. Na cena seguinte há uma elipse temporal e já os vemos deitados na grama, em clima de romance. A trama não se interessa em mostrar o que aconteceu para provocar esse enlace amoroso e conforme o filme progride, mais e mais elipses acontecem, sempre saltando as eventuais reviravoltas que provocam afastamentos ou desencontros e indo direto para os momentos em que estão juntos de novo.

É uma espécie de história de amor contada por omissões e por ausências (dos personagens, da trama), interessada na força do sentimento que impele os personagens a buscarem um ao outro independente das dificuldades e se mantem vivo ao longo dos anos. Não importa, para o filme, o que eles fazem para contornar os distanciamentos ou a vida que levam entre um encontro e outro, o que importa é que eles insistem em continuarem se encontrando mesmo quando tudo parece conspirar para mantê-los afastados.

É simultaneamente romântico e desencantado. Romântico por seus personagens manterem a crença de que podem ficar juntos e desencantado no modo como apresenta suas jornadas. Eles são pessoas solitárias, carentes, em uma Europa que sente tanto a devastação da Segunda Guerra Mundial, como vive imersa nas tensões políticas silenciosas da Guerra Fria. Seus personagens estão tão divididos quanto o próprio continente europeu e vivem sua própria “guerra fria” ao batalhar contra a solidão,  a aridez de suas vidas e do meio em que estão para encontrarem um mínimo quinhão de felicidade. Eles percorrem o continente europeu, mas essas mudanças não resolvem seus problemas, não consertam o que está quebrado neles.

Essa frieza também se traduz na escolha por filmar em preto e branco e pelo pouco uso de trilha musical conferindo a tudo um aspecto cinzento e um silêncio desolador. São ambientes estéreis, que parecem ter sido subtraídos de sua vivacidade ou calor humano. A música só aparece dentro do universo do filme, nas performances musicais dos personagens e são nesses momentos em que os personagens mais demonstram a seus sentimentos e a força deles.

Mesmo os momentos mais próximos entre Zula e Wiktor não são exatamente recheados de doçura, sendo ocasionalmente até abrasivos um com o outro, como se a união acontecesse mais pela esperança do devir, do que essa relação poderia fazer para dirimir suas respectivas inadequações, para calar o desalento e oferecer uma medida de esperança para continuar existindo naqueles lugares estéreis. Isso se traduz inclusive no abrupto final, com os personagens esperando e torcendo para que a felicidade talvez finalmente se concretize embora tudo continue devastado ao redor deles.

Guerra Fria é simultaneamente sentimental e frio, romântico e desencantado, tecendo uma trama amorosa que se firma na sobrevivência do afeto frente a uma realidade desoladora.


Nota: 8/10

Trailer

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