Na década de 50, na Polônia comunista, uma jovem cantora,
Zula (Joanna Kulig), se apaixona por um maestro francês, Wiktor (Thomasz Kot).
Ao longo dos anos, eles se encontram e se afastam por conta das vidas que cada
um leva, mas se mantem apaixonados um pelo outro. Em seu cerne Guerra Fria é uma típica história de
“amor proibido”, de duas pessoas separadas por questões políticas e sociais que
muitas vezes escapam seu próprio controle. Com essa premissa o filme poderia
ser um dramalhão meloso feito para forçar o choro da audiência, mas o diretor
Pawel Pawlikowski vai na contramão de como esperamos que uma história assim
seja contada.
Essa impressão já surge desde o começo do filme. Nos
primeiros minutos vemos Wiktor perguntar a Zula se os boatos de que ela matou o
pai são verdadeiros. Ela percebe o interesse de Wiktor nela e diz que sabe como
os homens são, parecendo rejeitar o maestro. Na cena seguinte há uma elipse
temporal e já os vemos deitados na grama, em clima de romance. A trama não se
interessa em mostrar o que aconteceu para provocar esse enlace amoroso e
conforme o filme progride, mais e mais elipses acontecem, sempre saltando as
eventuais reviravoltas que provocam afastamentos ou desencontros e indo direto
para os momentos em que estão juntos de novo.
É uma espécie de história de amor contada por omissões e por
ausências (dos personagens, da trama), interessada na força do sentimento que
impele os personagens a buscarem um ao outro independente das dificuldades e se
mantem vivo ao longo dos anos. Não importa, para o filme, o que eles fazem para
contornar os distanciamentos ou a vida que levam entre um encontro e outro, o
que importa é que eles insistem em continuarem se encontrando mesmo quando tudo
parece conspirar para mantê-los afastados.
É simultaneamente romântico e desencantado. Romântico por
seus personagens manterem a crença de que podem ficar juntos e desencantado no
modo como apresenta suas jornadas. Eles são pessoas solitárias, carentes, em
uma Europa que sente tanto a devastação da Segunda Guerra Mundial, como vive
imersa nas tensões políticas silenciosas da Guerra Fria. Seus personagens estão
tão divididos quanto o próprio continente europeu e vivem sua própria “guerra
fria” ao batalhar contra a solidão, a
aridez de suas vidas e do meio em que estão para encontrarem um mínimo quinhão
de felicidade. Eles percorrem o continente europeu, mas essas mudanças não
resolvem seus problemas, não consertam o que está quebrado neles.
Essa frieza também se traduz na escolha por filmar em preto
e branco e pelo pouco uso de trilha musical conferindo a tudo um aspecto
cinzento e um silêncio desolador. São ambientes estéreis, que parecem ter sido
subtraídos de sua vivacidade ou calor humano. A música só aparece dentro do
universo do filme, nas performances musicais dos personagens e são nesses
momentos em que os personagens mais demonstram a seus sentimentos e a força
deles.
Mesmo os momentos mais próximos entre Zula e Wiktor não são
exatamente recheados de doçura, sendo ocasionalmente até abrasivos um com o
outro, como se a união acontecesse mais pela esperança do devir, do que essa
relação poderia fazer para dirimir suas respectivas inadequações, para calar o
desalento e oferecer uma medida de esperança para continuar existindo naqueles
lugares estéreis. Isso se traduz inclusive no abrupto final, com os personagens
esperando e torcendo para que a felicidade talvez finalmente se concretize
embora tudo continue devastado ao redor deles.
Guerra Fria é simultaneamente sentimental e frio, romântico
e desencantado, tecendo uma trama amorosa que se firma na sobrevivência do
afeto frente a uma realidade desoladora.
Nota: 8/10
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