Dirigido pelo iraniano Ashgar Farhadi este Todos Já Sabem pega uma estrutura típica
da narrativa policial e usa isso como dispositivo para trazer à tona os
ressentimentos ocultos de seus personagens. A trama começa quando Laura (Penelope
Cruz), que mora na Argentina, viaja para a sua cidade natal na Espanha para o
casamento de uma parente. Durante a cerimônia, a filha de Laura desaparece de
um cômodo trancado na casa da família recebendo logo depois em seu celular uma
mensagem de que a garota foi sequestrada, exigindo uma alta quantia pela
liberação.
Formalmente a trama é um clássico “mistério do quarto
fechado”, um formato tão antigo quanto a própria narrativa policial. Temos um
crime aparentemente impossível e um número claro e limitado de suspeitos. Essa
estrutura tradicional, no entanto, é apenas o pontapé inicial para um drama
familiar sobre segredos guardados e antigos ressentimentos.
A família de Laura era de uma pequena aristocracia local,
mas cujas posses foram perdidas pelo patriarca por conta de seu vício em jogo e
este até hoje se ressente da população de seu pequeno vilarejo. O dono de
vinícola Paco (Javier Bardem) era filho de empregados da família e ex-namorado
de Laura, tendo comprado muito barato as terras que pertenciam à protagonista.
O marido argentino de Laura, Alejandro (o onipresente Ricardo Darín), é tido
como um empresário bem sucedido, mas na verdade está falido. Esses segredos
contribuem para o clima de suspense e cada parente pareça suspeito.
Mágoas há muito enterradas, ressentimentos considerados
esquecidos, tudo emerge à tona quando a normalidade das coisas é quebrada pela
ocorrência criminal. É como se o fato dessas pessoas não terem tratado os
problemas criou um vazio que é incendiado pela crise. A ideia de um tempo
lacunar, de um pedaço faltando no quebra-cabeça dessa família é expressa em
forma de imagem pelo relógio esburacado da igreja, que também tem espaços
faltando.
A questão que a segunda metade acaba se alongando mais do
que deveria, com os personagens andando em círculos e repetindo as mesmas
informações uns para outros, inchando desnecessariamente o tempo de projeção e
tirando a força dos conflitos ao prolongá-los em excesso. Outro problema é
quando o filme nos mostra os responsáveis pelo crime e a motivação soa frouxa
para um crime tão específico. Eles afirmam ter feito tudo para obter o dinheiro
de um determinado personagem e para se vingar dessa pessoa, mas de todos os
personagens do filme, o alvo é o que menos dá motivos para ser odiado. Sim,
eles podiam estar querendo se vingar da família de Laura como um todo, mas
poderiam ter feito isso sem mirar nesse alvo tão delimitado.
Por outro lado, a trama acerta ao deixar certas resoluções
em aberto. Afinal, na narrativa policial a prisão dos culpados simboliza um
retorno à ordem que foi quebrada pelo crime e ao negar mostrar se isso ocorreu
ou não o filme deixa a ideia de que não há retorno à ordem possível. As mágoas,
segredos e problemas que emergiram por conta do crime não podem ser esquecidas
e todos os envolvidos estarão marcados para sempre pelo que aconteceu.
Todos Já Sabem é
um eficiente drama familiar que lembra da impossibilidade de guardar segredos,
mas que fica prejudicado por um segundo ato que se arrasta mais do que deveria.
Nota: 6/10
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