Ano passado Nasce Uma Estrela contou uma história de amor que exibia um certo pessimismo e
desencanto em relação ao mundo da música. Quem não era destruído por ele, como
o protagonista Jackson (Bradley Cooper), arriscava perder sua identidade e se
tornar mais um produto pasteurizado dessa máquina de moer gente, como a
protagonista Ally (Lady Gaga). Este Vox
Lux: O Preço da Fama tenta também fazer um comentário desencantando sobre o
meio, o egocentrismo que o domina e como as pessoas se perdem em meio a tudo
isso. A questão é que Vox Lux: O Preço da
Fama parece deslumbrado demais com suas próprias afetações para ser
contundente na sua crítica das afetações do meio.
A trama começa ainda na década de 90, com a protagonista,
Celeste (Raffey Cassidy), ainda uma adolescente que sonha em fazer sucesso no
mundo da música. Quando um atirador entra na escola de Celeste, matando vários
de seus colegas e ferindo a própria, Celeste e a irmã, Eleanor (Stacy Martin),
compõem uma canção sobre superar o trauma. A música chama a atenção da mídia
nacional, catapultando Celeste ao estrelato. A fama leva à sua perda de
inocência e a reencontramos já adulta, agora interpretada por Natalie Portman,
como uma diva pop que tenta reerguer
a carreira depois de vários escândalos envolvendo drogas.
É interessante perceber que o diretor Brady Cobert apenas
troca a intérprete de Celeste durante essa passagem de tempo, com o resto do
elenco como Eleanor ou o empresário dela (Jude Law) se mantendo o mesmo e sem
qualquer tipo de esforço de maquiagem ou efeito digital que dê a impressão de
que essas pessoas envelheceram. A ideia parece ser a de que Celeste mudou
radicalmente enquanto o mundo ao seu redor permaneceu o mesmo. Transformada
pelas engrenagens da máquina midiática e pelos anos de fama.
Por outro lado, o filme usa uma série de outros dispositivos
que não rendem tanto quanto o seu uso faz parecer. Desde o início a narrativa
associa a jornada de Celeste a grandes tragédias nacionais, do tiroteio massivo
no início ao Onze de Setembro quando ela pega a irmã na cama com o empresário,
passando por um ataque terrorista quando a reencontramos na idade adulta. A
ideia parece querer associar as duas construções midiáticas, a da estrela pop e da grande tragédia nacional, como
meros produtos de uma indústria cultural, feitos para serem consumidos
massivamente nos meios de comunicação apenas para serem superados tempos depois
por algum novo fato.
É possível também pensar na associação como uma tentativa de
conectar o egocentrismo dessas grandes estrelas com os autores dessas
atrocidades, que se comportam de maneira autocentrada e egoísta para ganhar
notoriedade às custas de outros. A questão é que essas ideias nunca são
plenamente desenvolvidas, o filme aponta isso e já se acha brilhante por ter
tido esse leve insight sem levar o
raciocínio adiante e sem conseguir sair da superfície dos temas.
Causa estranhamento a tentativa de colocar cenas com efeitos
de granulação para dar a ideia de material antigo de arquivo acompanhadas de
uma narração solene feita por Willem Dafoe. A impressão é que estamos vendo um
documentário dentro do filme, como se fosse uma produção sobre a vida de
Celeste, mas a existência desses segmentos nunca é plenamente justificada e a
narração poderia funcionar sem que o filme precisasse dar a ideia de que
estamos vendo imagens “documentais” já que ninguém vai se questionar se está
diante de uma obra de ficção ou não.
A narração, embora sirva como uma necessária ponte entre
elipses temporais, por vezes é cheia de longos discursos que expõem os temas de
maneira excessivamente mastigada, recorrendo a metáforas batidas (como a fala
de que Celeste vendeu a alma ao diabo), mas que são ditas com um grande senso
de autoimportância. Na verdade, o material não consegue ir além da noção de que
a fama muda e destrói as pessoas, uma noção que dez entre dez filmes que abordam
os bastidores da indústria cultural abordam, fazendo muito pouco para oferecer
ideias verdadeiramente contundentes sobre o fenômeno.
Quem segura mesmo o filme é Natalie Portman em uma
performance claramente pensada para ser exagerada. Com um forte (e talvez até
caricato) sotaque nova-iorquino, Portman faz de Celeste uma diva histriônica
que pensa que o mundo gira em torno dela e não considera as necessidades de
ninguém ao seu redor. É como se a atriz entendesse a farsa sórdida e fútil que
é o mundo da fama (algo que o diretor Paul Verhoeven e a atriz Elizabeth
Berkley fizeram no incompreendido Showgirls)
e enfiasse o pé no acelerador da conduta autocentrada da personagem, que mal
parece a garota sonhadora ou ingênua da primeira metade do filme. Aliás, a
ideia de Celeste ser uma espécie de “monstro” criado pela indústria cultural é
expressa pelo seu penteado e mecha branca no cabelo que remetem à protagonista
de A Noiva do Frankenstein (1935),
criando a impressão de que Celeste é essa cria maldita dos experimentos do meio
musical.
Vox Lux: O Preço da
Fama pode não ser tão esperto ou contundente como pensa ser, mas se
sustenta pela performance intensa de Natalie Portman.
Nota: 6/10
Trailer
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