quarta-feira, 3 de abril de 2019

Crítica – Duas Rainhas


Análise Crítica – Duas Rainhas


Review – Duas Rainhas
Duas Rainhas parecia aquele tipo de filme feito para ser indicado a vários prêmios. Era um drama histórico, protagonizado por duas jovens atrizes badaladas e talentosas e com um grande apuro técnico. O filme, no entanto, só conseguiu duas indicações ao Oscar, não levando nenhuma e talvez tenha sido esse baixo desempenho que fez as distribuidoras brasileiras empurrarem para abril o lançamento do filme por aqui, já que sem o burburinho das premiações seria difícil ele competir com obras com mais menções lançadas no mesmo período.

A narrativa, baseada em fatos reais, conta a história de Mary (Saoirse Ronan) rainha da Escócia que aos dezessete anos volta ao país para assumir trono depois de ficar viúva do monarca francês com o qual estava casada. O retorno dela não é bem visto por membros da corte como líder religioso John Knox (David Tennant), que não aceita ser governado por uma católica (a Escócia e a Inglaterra eram protestantes) e uma mulher. Mary tenta conseguir apoio com a prima, a rainha Elizabeth I (Margot Robbie) da Inglaterra, mas aos poucos a relação das duas começa a erodir graças a diferentes conselheiros que instigam conspirações entre as duas.

A ideia parece ser mostrar como os homens, que controlam a maioria das posições de poder na sociedade da época (e na contemporânea), não aceitam ter muitas mulheres na liderança. Ao invés de enfrentá-las diretamente, no entanto, eles fomentam a rivalidade entre elas para que se destruam e os homens possam dizer que elas não são capazes de governar por serem temperamentais demais, tornando-as exemplos do por que as mulheres não podem estar no poder. As trocas de cartas entre as duas monarcas mostram que se elas se relacionassem diretamente, poderiam resolver a situação facilmente e chegar a um entendimento, mas tendo que trabalhar por intermédio de homens, as tensões são fomentadas o tempo todo.

A questão é que essa não é uma impressão que vai aos poucos sendo construída pela narrativa, mas já evidenciada desde os primeiros minutos. Assim, ao invés de ir nos convencendo aos poucos de seu argumento, o filme “gasta” todas as suas ideias já no começo e depois fica andando em círculos ao redor dela, repetindo as mesmas coisas ao longo de cada cena. Com isso, até o desfecho, com o climático encontro entre as duas (que nunca aconteceu no mundo real) acaba perdendo o impacto. O momento deveria oferecer a trágica constatação de que as duas estão presas em uma estrutura patriarcal que não permitirá que ambas prosperem, mas ao invés disso é apenas uma conclusão óbvia para um argumento que já tinha sido finalizado há mais de uma hora.

A trama anda em círculos não apenas em seu comentário sobre o poder feminino, mas também na trama de Mary em se tentar manter no trono escocês. Cena após cena nos mostram algum membro da corte conspirando contra ela e essas sucessivas traições e puxadas de tapete começam a ficar previsíveis com o tempo, já que o filme não tem muito a dizer sobre elas. Isso porque a motivação de muitos personagens nunca chega a ser devidamente construída e sem ter um senso claro do que alguns conspiradores intentam alcançar, fica difícil se importar com o que está acontecendo. Alguns personagens inclusive parecem mudar a personalidade à conveniência do roteiro.

O texto também parece indeciso quanto ao papel que Elizabeth I irá desempenhar na história. De início a impressão é que ela será uma co-protagonista ao lado de Mary, mas a personagem some por um bom pedaço do meio do filme só volta a aparecer perto do final, deixando ela mais como uma coadjuvante a serviço da história de Mary sendo que o começo dava a entender que ela seria tão importante quanto. Margot Robbie, por sinal, é ótima ao construir as inquietações e inseguranças de Elizabeth, uma rainha que sabe que carrega um estigma por ser filha de um rei homicida, que membros da sua corte conspiram contra ela e precisa a todo tempo mostrar uma fachada de monarca imponente a despeito de seus problemas de saúde.

Do mesmo modo, Saiorse Ronan faz de Mary uma governante progressista e gentil, mas que sabe ser feroz quando necessário, embora ainda traga em si uma certa ingenuidade e impetuosidade juvenil, tomando algumas decisões impulsivas que eventualmente a prejudicarão. Assim como Elizabeth, Mary é uma pessoa dividida entre quem ela é como indivíduo e o que ela representa como monarca. Mary, por exemplo, quer dar ao seu povo uma liberdade que ela própria não consegue desfrutar, presa em meio à politicagem da corte.

Esses sentimentos de cada uma são espelhados na outra e são, no fim das contas, o que decide o destino delas, já que Elizabeth decide suprimir de si mesma todo seu componente pessoal e se entregar por completo às necessidades da coroa enquanto Mary quer ser dona da própria vida, sendo tratada como uma meretriz lasciva pelos súditos e líderes religiosos (uma imagem que perdurou no registro histórico), mais uma vez denunciando o machismo daquela sociedade.

Desta maneira, Duas Rainhas acaba sendo excessivamente redundante no tratamento de seus temas, falhando em aproveitar as boas interpretações de Saoirse Ronan e Margot Robbie.


Nota: 5/10


Trailer

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