Duas Rainhas
parecia aquele tipo de filme feito para ser indicado a vários prêmios. Era um
drama histórico, protagonizado por duas jovens atrizes badaladas e talentosas e
com um grande apuro técnico. O filme, no entanto, só conseguiu duas indicações
ao Oscar, não levando nenhuma e talvez tenha sido esse baixo desempenho que fez
as distribuidoras brasileiras empurrarem para abril o lançamento do filme por
aqui, já que sem o burburinho das premiações seria difícil ele competir com
obras com mais menções lançadas no mesmo período.
A narrativa, baseada em fatos reais, conta a história de
Mary (Saoirse Ronan) rainha da Escócia que aos dezessete anos volta ao país
para assumir trono depois de ficar viúva do monarca francês com o qual estava
casada. O retorno dela não é bem visto por membros da corte como líder
religioso John Knox (David Tennant), que não aceita ser governado por uma
católica (a Escócia e a Inglaterra eram protestantes) e uma mulher. Mary tenta
conseguir apoio com a prima, a rainha Elizabeth I (Margot Robbie) da
Inglaterra, mas aos poucos a relação das duas começa a erodir graças a
diferentes conselheiros que instigam conspirações entre as duas.
A ideia parece ser mostrar como os homens, que controlam a
maioria das posições de poder na sociedade da época (e na contemporânea), não
aceitam ter muitas mulheres na liderança. Ao invés de enfrentá-las diretamente,
no entanto, eles fomentam a rivalidade entre elas para que se destruam e os
homens possam dizer que elas não são capazes de governar por serem
temperamentais demais, tornando-as exemplos do por que as mulheres não podem
estar no poder. As trocas de cartas entre as duas monarcas mostram que se elas
se relacionassem diretamente, poderiam resolver a situação facilmente e chegar
a um entendimento, mas tendo que trabalhar por intermédio de homens, as tensões
são fomentadas o tempo todo.
A questão é que essa não é uma impressão que vai aos poucos
sendo construída pela narrativa, mas já evidenciada desde os primeiros minutos.
Assim, ao invés de ir nos convencendo aos poucos de seu argumento, o filme
“gasta” todas as suas ideias já no começo e depois fica andando em círculos ao
redor dela, repetindo as mesmas coisas ao longo de cada cena. Com isso, até o
desfecho, com o climático encontro entre as duas (que nunca aconteceu no mundo
real) acaba perdendo o impacto. O momento deveria oferecer a trágica
constatação de que as duas estão presas em uma estrutura patriarcal que não
permitirá que ambas prosperem, mas ao invés disso é apenas uma conclusão óbvia
para um argumento que já tinha sido finalizado há mais de uma hora.
A trama anda em círculos não apenas em seu comentário sobre
o poder feminino, mas também na trama de Mary em se tentar manter no trono
escocês. Cena após cena nos mostram algum membro da corte conspirando contra
ela e essas sucessivas traições e puxadas de tapete começam a ficar previsíveis
com o tempo, já que o filme não tem muito a dizer sobre elas. Isso porque a
motivação de muitos personagens nunca chega a ser devidamente construída e sem
ter um senso claro do que alguns conspiradores intentam alcançar, fica difícil
se importar com o que está acontecendo. Alguns personagens inclusive parecem
mudar a personalidade à conveniência do roteiro.
O texto também parece indeciso quanto ao papel que Elizabeth
I irá desempenhar na história. De início a impressão é que ela será uma
co-protagonista ao lado de Mary, mas a personagem some por um bom pedaço do
meio do filme só volta a aparecer perto do final, deixando ela mais como uma
coadjuvante a serviço da história de Mary sendo que o começo dava a entender
que ela seria tão importante quanto. Margot Robbie, por sinal, é ótima ao
construir as inquietações e inseguranças de Elizabeth, uma rainha que sabe que
carrega um estigma por ser filha de um rei homicida, que membros da sua corte
conspiram contra ela e precisa a todo tempo mostrar uma fachada de monarca
imponente a despeito de seus problemas de saúde.
Do mesmo modo, Saiorse Ronan faz de Mary uma governante
progressista e gentil, mas que sabe ser feroz quando necessário, embora ainda
traga em si uma certa ingenuidade e impetuosidade juvenil, tomando algumas
decisões impulsivas que eventualmente a prejudicarão. Assim como Elizabeth,
Mary é uma pessoa dividida entre quem ela é como indivíduo e o que ela
representa como monarca. Mary, por exemplo, quer dar ao seu povo uma liberdade
que ela própria não consegue desfrutar, presa em meio à politicagem da corte.
Esses sentimentos de cada uma são espelhados na outra e são,
no fim das contas, o que decide o destino delas, já que Elizabeth decide
suprimir de si mesma todo seu componente pessoal e se entregar por completo às
necessidades da coroa enquanto Mary quer ser dona da própria vida, sendo
tratada como uma meretriz lasciva pelos súditos e líderes religiosos (uma
imagem que perdurou no registro histórico), mais uma vez denunciando o machismo
daquela sociedade.
Desta maneira, Duas
Rainhas acaba sendo excessivamente redundante no tratamento de seus temas,
falhando em aproveitar as boas interpretações de Saoirse Ronan e Margot Robbie.
Nota: 5/10
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