Essa segunda parte de O Mundo Sombrio de Sabrina sofre de muitos dos mesmos problemas da segunda
temporada de Riverdale, também
produzida por Roberto Aguirre-Sacasa. Ambos segundos anos sofrem com uma trama arrastada,
que demora a engrenar, arcos de personagens secundários que não convencem e uma
aparente falta de compreensão do que tornou o ano de estreia tão interessante.
A trama continua basicamente onde a primeira parte terminou,
com Sabrina (Kiernan Shipka) finalmente fazendo o seu batismo de sangue,
aceitando sua herança de bruxa e indo estudar na Academia de Artes Ocultas,
deixando para trás seus amigos humanos e seu namorado, Harvey (Ross Lynch). Na
Academia, Sabrina precisa lidar com as estruturas arcaicas e machistas da
Igreja da Noite e a liderança do Padre Blackwood (Richard Coyle).
Desde a primeira parte já havia ficado evidente que o culto
das bruxas servia como uma espécie de metáfora invertida do cristianismo,
criticando a imposição de uma fé aos jovens e também o patriarcado anacrônico
da Igreja Católica. Aqui isso é construído através de paralelos tão
exageradamente óbvios, como a existência de um “antipapa” ou da performance da
“Paixão de Lúcifer” ao invés da Paixão de Cristo do cristianismo, que aquilo
que era uma interessante metáfora social se torna uma caricatura tosca. A
verdade é que quanto mais tempo a trama gasta nesses pormenores da sociedade
bruxa, menos interessante tudo fica.
Outro problema é a falta de ritmo ou direcionamento. Os
primeiros cinco episódios (de um total de nove) caminham à esmo enquanto
Sabrina tenta se adaptar ao mundo bruxo, sem um indicativo de arco dramático ou
conflito específico para a temporada. Só no final do quinto episódio, quando um
personagem importante é assassinado, que a série consegue delinear algum
conflito. A temporada de fato melhora e ganha um senso de direcionamento e
urgência nos últimos quatro episódios, mas demora demais a chegar lá.
Principalmente quando alguns episódios, como o da vidente, fazem pouco para
avançar a trama, colocando os personagens em cenários imaginados que tem não se
traduzem em nenhum aprendizado real para eles.
Os amigos humanos de Sabrina tem suas subtramas tratadas com
extrema displicência, com arcos que se resolvem muito rápido e de maneira pouco
convincente. Um exemplo é a transição Susie (Lachlan Watson), que passa a se
chamar Theo. O processo de transição de gênero é algo bastante complexo, que
envolve variáveis psicológicas, físicas e sociais, muitas vezes ficando sob
alvo de preconceito e escárnio daqueles que não entendem esse processo. A
transição de Theo, no entanto, acontece rapidamente, em um único episódio ele
decide fazer essa transição, passa pela transição e é rapidamente aceito na
escola. Ele chega a sofrer bullying
no início do episódio, mas no final do mesmo já recebe um pedido de desculpas,
sendo que a motivação para o valentão fazer isso é porcamente construída.
O mesmo acontece com Roz (Jaz Sinclair) e seu conflito entre
aceitar seus dons premonitórios e perder a visão ou abrir mão deles e continuar
sua vida normal. A personagem sofre com isso durante boa parte da temporada até
que Sabrina simplesmente resolve curar a cegueira dela. A resolução não só
acontece gratuitamente, como torna Roz um elemento passivo de seu próprio arco
narrativo, que se resolve sem qualquer ação direta dela e não se traduzindo em
nenhum aprendizado ou transformação para a personagem.
Alguns novos personagens, como Nick (Gavin Leatherwood),
também falham em criar qualquer vínculo com o público. O relacionamento entre
ele e Sabrina nunca soa plenamente justificado, acontecendo basicamente para
gerar um triângulo com Harvey, e com Nick falhando em exibir qualquer motivação
ou personalidade discernível. Claro, uma reviravolta no último episódio meio
que justifica a gratuidade da aproximação de Nick em relação a Sabrina, mas uma
revelação surpresa não substitui ausência de personalidade.
As tias Hilda (Lucy Davis) e Zelda (Miranda Otto) continuam
sendo as melhores coisas da série encontrando o equilíbrio exato entre
seriedade e cafonice que muitos outros personagens e situações falham achar. O
mesmo pode ser dito de Michelle Gomez como a professora Wardwell, que exibe uma
presença misteriosa e ambígua, sempre nos deixando em suspense quanto às suas
reais motivações. Kiernan Shipka é eficiente ao evocar a natureza resiliente e
o espírito de liderança de Sabrina, que se recusa a se dobrar às estruturas
sexistas impostas por Padre Blackwell, mas é prejudicada por um texto que
demora a decidir o que quer da personagem.
A despeito do importante comentário sobre as estruturas
patriarcais da sociedade, a segunda parte de O Mundo Sombrio de Sabrina termina prejudicada por uma trama que
demora a pegar no tranco, arcos insatisfatórios e novos personagens
desinteressantes.
Nota: 5/10
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