O termo “sucessor espiritual” tem sido usado bastante pela
indústria de games nos últimos anos, principalmente no reino dos jogos
independentes. Criadores que deixaram suas desenvolvedoras, mas que querem
fazer o mesmo estilo de jogo que faziam e tentam criar algo similar aos seus
maiores sucessos. Keiji Inafune, criador de Mega Man, tentou fazer isso com Mighty Nº9, parte da equipe responsável
por Banjo-Kazooie tentou fazer isso
com Yooka-Laylee. Os esforços de
ambos resultaram em grandes decepções que falhavam tanto em capturar o espírito
do que tornou as propriedades originais tão memoráveis ou que falhou em
atualizar os elementos desses jogos para os dias atuais, fazendo tudo parecer
datado.
Eu falo tudo isso para dizer que este Bloodstained: Ritual of the Night é a mais nova tentativa de um
“sucessor espiritual”. Desenvolvido por Koji Igarashi, responsável pelo
excelente Castlevania: Symphony of the
Night, Bloodstained tenta
resgatar a excelência do estilo “Metroidvania” (uma junção de Metroid e Castlevania)
que Igarashi construiu em jogos como Symphony
of the Night ou Aria of Sorrow.
Me aproximei de Bloodstained temendo
uma decepção similar a Mighty Nº9 ou Yooka-Laylee, mas o que encontrei foi
algo que conseguia soar simultaneamente contemporâneo e nostálgico.
O jogador controla Miriam, uma jovem com o poder de
manipular cristais mágicos e de absorver as habilidades de demônios. Ela adquiriu
esses poderes depois de ser usada como cobaia por alquimistas que queriam abrir
os portões do inferno. Durante os experimentos Miriam conhece Gebel, um jovem
que também recebe os mesmos poderes que ela. Livre dos alquimistas, Gebel rouba
o livro de feitiços dele e se refugia em um antigo castelo enquanto prepara sua
vingança. Temendo o que pode acontecer se Gebel usar o livro para trazer
demônios ao nosso mundo, Miriam parte para o castelo para deter Gebel. É uma
trama relativamente básica, mas que consegue apresentar algumas reviravoltas
perto do final.
Assim como acontecia em Symphony
of the Night e Aria of Sorrow o
jogador explora um castelo e vai adquirindo novas habilidades que abrem novas
seções do castelo. A protagonista sobe de nível com a experiência adquirida
matando inimigos, melhorando os atributos, além encontrar novos equipamentos e
poder absorver o poder dos monstros derrotados transformando-os em cristais.
Bloodstained ainda
conta com um sistema de crafting para
a criação de novos equipamentos e também de uma mecânica de culinária na qual
Miriam pode criar pratos a partir dos ingredientes encontrados durante a
exploração. Além de regenerar os pontos de vida da personagem, ao comer um
prato pela primeira vez Miriam ganha um bônus permanente em um atributo
específico (o atributo varia a cada prato), o que estimula o jogador a explorar
mais para adquirir esses ingredientes para ampliar o poder da personagem.
Os controles são responsivos e precisos evitando frustrações
nos segmentos de plataforma, principalmente quando é preciso subir em longas
seções verticais, e também no combate. Sim, a maioria dos inimigos comuns não
chega a representar um grande desafio, mas os chefões exigem foco e atenção em
aprender seus padrões para saber quando esquivar e quando atacar. Alguns até me
levaram uma quantidade razoável de tentativas para derrotá-los.
O jogo não segura a mão do usuário em relação a como
progredir, estimulando a exploração e a busca por cada canto do mapa até achar
o próximo chefão que dará a habilidade necessária para progredir. A progressão
é um pouco linear durante cerca de metade do percurso, mas chega um ponto em
que tudo fica mais aberto. Embora eu goste de descobrir as coisas por conta
própria, o problema do pedaço final é que em alguns casos a progressão depende
de cristais de habilidade que são deixados aleatoriamente por um tipo
específico de inimigo, o que torna o avanço mais dependente de sorte do que de
habilidade.
O visual remete aos castelos de arquitetura gótica vistos na
franquia Castlevania, mas aqui os
ambientes são tridimensionais, ainda que a movimentação seja bidimensional. Os sprites dos personagens e inimigos são
bem detalhados em sua movimentação e a qualidade visual do produto final é
melhor do que os primeiros trailers faziam parecer (Igarashi até fez um vídeo
brincando com isso em um dos últimos trailers), ainda que as texturas dos
cenários por vezes soem simples demais. Muitos inimigos são similares a
criaturas que já encontrávamos em Castlevania,
mas o design das criaturas consegue
conferir personalidade própria a elas por mais que remetam a elementos
conhecidos. A música também é marcante, ainda que não saia muito do tipo de
composição que estão presentes nos Castlevania.
O jogo, no entanto, tem alguns problemas em termos de
performance, ao menos no PS4. Há uma queda na taxa de frames quando muitos
inimigos ou efeitos de luz dos ataques especiais estão presentes na tela ou
quando Miriam adquire um novo cristal em uma tela cheia de inimigos. Em muitos momentos os itens deixados pelos monstros não são
computados imediatamente e é preciso esperar um tempo até que a mensagem
apareça no canto da tela avisando que eles foram propriamente adicionados ao
inventário. Sair da ambiente antes que o jogo registre adequadamente o item
significa que ele se perderá. Também experimentei alguns crashes, que são frustrantes porque como o jogo só salva em save points específicos, ter o
aplicativo fechando significa perder uma boa parcela de progresso.
No fim das contas, Bloodstained:
Ritual of The Night é de fato um competente sucessor da franquia Castlevania, que consegue ter
personalidade própria o suficiente para não ser uma mera imitação ainda que
certos problemas técnicos prejudiquem um pouco a experiência.
Nota: 8/10
Trailer
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