Este novo Shaft é
simultaneamente um reboot e uma
continuação. Continuação porque reconhece os eventos desde o primeiro filme de
1971, que trazia Richard Roundtree como o personagem título, passando pela
versão dos anos 2000 protagonizada por Samuel L. Jackson até chegar na trama
atual. É um reboot, no entanto, porque ter visto qualquer filme anterior não é
necessário para assistir esse, que tenta ser um novo começo para a franquia.
A trama acompanha John Shaft Jr (Jessie T, Usher), ou JJ,
filho do Shaft interpretado por Samuel L. Jackson no filme de 2000. JJ é um
analista de dados do FBI que decide investigar a morte de um amigo e acaba
precisando pedir ajuda ao pai e ao avô, o Shaft original, interpretado por
Richard Roundtree, para resolver o caso.
Jessie T. Usher, que viveu o filho do personagem de Will
Smith no péssimo Independence Day: O Ressurgimento (2016), continua a exibir aqui o mesmo tipo de interpretação
apática e desprovida de carisma que demonstrou no filme de 2016. Não que o
material ajude o ator, já que o roteiro JJ é reduz a uma caricatura aborrecida
de millenial hipster que reclama e
gagueja boa parte do tempo e que muitas vezes assume uma conduta incoerente.
Ouvimos mais de uma vez o personagem dizer que não gosta de
armas e quando ele recebe uma arma do pai logo no início do filme, JJ a atira
pela janela. A cena é feita para ser engraçada, mas lembremos que o personagem
é um agente do FBI que, imaginamos, deveria se preocupar com a segurança da
população e jogar uma arma de fogo no meio da rua é no mínimo um ato de
irresponsabilidade dele. Claro, o Shaft pai aponta a estupidez da ação do
filho, mas nem isso serve para diminuir o senso de incoerência das ações do
protagonista.
Na verdade todo o filme se resume a piadinhas constantes
entre os dois Shafts, com o pai apontando o quanto o filho seria “fresco” e
mimado, enquanto que JJ constantemente chama a atenção do pai por ele
reproduzir padrões anacrônicos de masculinidade. Em tese poderia render algo
interessante sobre o conflito geracional, mas o filme, dirigido por Tim Story
(que já tinha reduzido o Quarteto Fantástico da Marvel em personagens cômicos
ao longo de dois filmes), só está interessando em um humor rasteiro e óbvio que
constantemente quebra o ritmo da trama.
Um exemplo é a cena em que JJ e o pai estão em um táxi
conversando sobre as provas que coletaram e são constantemente interrompidos
por uma motorista inoportuna. A troca entre os personagens deveria ser
engraçada, mas é apenas constrangedora, interrompendo o fluxo da trama sem
acrescentar nada, nem mesmo risos esquecíveis à cena. O mesmo pode ser dito do
momento em que JJ bate com a cara no vidro ao tentar invadir o covil do vilão.
O filme simplesmente interrompe a empolgação da cena de ação para enfiar
forçadamente uma piadinha descartável que, novamente, trabalha contra o filme
ao invés de em favor dele. A impressão que que Tim Story tentou fazer algo ao
estilo “padrão Marvel”, com os personagens fazendo piadas e sendo
autorreferentes o tempo todo, mas tudo o que o diretor conseguiu fazer foi
reproduzir os piores vícios do estúdio sem trazer nenhuma das virtudes.
A trama investigativa em si é bem óbvia em suas reviravoltas
e também no desenvolvimento de seus personagens, sendo evidente desde o início
que JJ aprenderá com o pai a ser mais durão enquanto que Shaft aprenderá com o
filho a ser mais sensível. O vilão é só um gângster genérico e o filme ainda
desperdiça Alexandra Shipp (a Tempestade dos dois últimos filmes dos X-Men)
como um mero interesse romântico e donzela em perigo. O único ponto realmente
positivo é a música, em especial o tema de Isaac Hayes (a voz do Chef de South Park) para o filme de 71, embora
isso seja eventualmente prejudicado pelo péssimo remix eletrônico que fizeram da canção.
Este novo Shaft pega
toda a personalidade, carisma e conteúdo político ligado à franquia e joga fora, substituindo tudo que ela tinha de singular por uma aventura genérica,
metida a engraçadinha que tenta sem sucesso ser algo ao estilo Marvel de fazer
filmes.
Nota: 4/10
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