Lançado em 1988
e dirigido por John Carpenter, Eles Vivem parece, na superfície um filme
B de invasão alienígena. Na verdade, não deixa de ser exatamente isso, mas
também apresenta várias camadas de comentário sobre as estruturas que governam
o funcionameento da nossa sociedade.
Na trama, um
operário (Roddy Piper) encontra um par de óculos escuros que o faz ver a
realidade oculta de nosso mundo: a de que somos governados por alienígenas
grotescos que querem explorar nosso trabalho e todo o discurso midiático contem
uma série de mensagens subliminares feitas para nos manter domesticados e
consumindo. O protagonista tenta convencer seu melhor amigo, Frank (Keith
David) a usar os óculos, mas Frank resiste a querer enxergar a verdade.
É difícil não
olhar as críticas que o filme faz à sociedade capitalista e não pensar na noção
de mitologias proposta pelo teórico Roland Barthes. Para Barthes, os discursos
midiáticos hegemônicos existem para tornar invisíveis aqueles que controlam os
meios de produção e para tornar toda a estrutura de funcionamento da sociedade
como algo natural e normal (no sentido de norma mesmo). Ao fazer do capitalismo
e suas desigualdades inerentes parecerem uma norma única, esse discurso hegemônico
deixa pouco espaço para que os problemas e distorções do modelo capitalista
sejam questionados. É basicamente o que acontece nesse filme, no qual as publicidades
e jornalismo trazem mensagens subliminares para as pessoas não questionarem a
autoridade e para consumirem continuamente.
A trama também
mostra a dificuldade das pessoas em aceitarem enxergar o mundo dessa maneira,
como muitos, a exemplo de Frank, reagem com violência quando confrontados com a
possibilidade de verem o mundo pelo que ele é. Para Frank, usar os óculos
significa se meter em problemas e o personagem prefere manter as coisas do
jeito que estão a arriscar enfrentar a realidade, denotando o comodismo que
aflige muitas pessoas. Do mesmo modo, revela como os que são oprimidos pelo
sistema são usados para defendê-lo, algo que fica evidente quando um personagem
diz que a maioria dos policiais são humanos.
Além do
comentário social, o filme também tem sua parcela de humor por meio das frases
de efeito desfiadas pelo protagonista. Você pode nunca ter assistido Eles
Vivem, mas provavelmente já ouviu um de seus diálogos sendo citados em
outros lugares como: “Eu vim aqui para chutar traseiros e mascar chiclete. E
meu chiclete já acabou”. O lutador profissional Roddy Piper pode não ser lá
grande coisa como ator, no entanto a direção de Carpenter sabe aproveitar a
canastrice de Piper em seu favor, tanto através das frases de efeito quanto
pelas exageradas cenas de ação, a exemplo da longa luta entre Frank e o
protagonista em um beco.
Ao misturar
humor, ação, ficção científica e horror, Eles Vivem consegue entreter ao
mesmo tempo em que cria uma competente crítica social sobre a letargia da
sociedade de consumo.
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