Aplicando a conhecida premissa de “eu acho que meu vizinho é
um assassino” a uma ambientação oitentista protagonizada por crianças, Verão de 84 funciona como uma mistura de
Janela Indiscreta (1954) com Os Goonies (1985) e a nostalgia de Stranger Things. O resultado, no
entanto, acaba sendo menor que a soma de suas partes e o que poderia ser uma
aventura/suspense jovem se torna algo morno.
A trama acompanha Davey (Graham Verchere), um garoto de
férias da escola que começa a suspeitar que o vizinho deles, o solitário
policial Mackey (Rich Sommer) possa ser o serial
killer que a polícia vem caçando a algum tempo. Ele conta suas suspeitas
aos amigos Tommy (Judah Lewis), Woody (Caleb Emery) e Farraday (Cory
Gruter-Andrew), unindo todos na investigação ao senhor Mackey. Além do
quarteto, há também Nikki (Tiera Skovbyie) a bela garota da casa da frente que
costumava ser babá de Davey e por quem o protagonista nutre uma certa paixão.
A narrativa tenta criar dúvida sobre o lado sombrio de
Mackey colocando evidências de sua possível culpa ao mesmo tempo em que
apresenta informações que mostram que os garotos podem estar errados. Seria um
bom expediente para criar suspense, ampliando a incerteza e a tensão do público
conforme a narrativa progride. O problema é a trama não apresenta qualquer
outro suspeito para ser o assassino, deixando evidente que só pode ser Mackey,
já que a revelação de alguém que nunca foi citado ou considerado suspeito antes
soaria desonesta com o público.
O que mantêm o interesse é a habilidade do ator Rich Sommer
em construir Mackey como um sujeito tão manso e relaxado que realmente soa
difícil crer que ele poderia ser um perigoso assassino e pedófilo. Os quatro
jovens atores que interpretam os protagonistas são eficientes em evocar a
amizade dos garotos, mas o texto não dá muita substância aos seus personagens,
prendendo-os a lugares-comuns rasos como “o nerd”, o “rebelde” e assim por
diante, o que prejudica um pouco nossa conexão com esses personagens.
A ambientação nos anos 80 é competente, mas não faz nada que
dezenas de outros produtos centrados nessa nostalgia oitentista já não tenham
feito, o que incomoda é a insistência de usar sintetizadores o tempo todo na
trilha musical, como se essa fosse a única marca de identidade musical do
período. Mesmo Stranger Things, cujo
tema musical é marcado por sintetizadores, não tem os instrumentos tocando de
maneira tão insistente.
O que mais prejudica a narrativa acaba sendo a falta de
motivações convincentemente construídas para a motivação da maioria dos
personagens. Não há, por exemplo, muita razão para que Nikki se sinta atraída
por Davey e a aproximação entre os dois parece acontecer por mera necessidade
do roteiro. Do mesmo modo, é difícil comprar os argumentos de Farraday para
desistir da missão durante o clímax quando haviam uma série de outras
evidências (como a soda cáustica, que o próprio Farraday disse que não seria
útil para jardinagem) contra Mackey.
O que realmente incomoda, no entanto, é a decisão de Mackey
no final. As últimas cenas não só deixam claro que ele é um assassino
obsessivo, como também que ele estava de olho em Davey como próxima vítima faz
tempo. Assim, soa incoerente que um predador tão letal, metódico e obsessivo
simplesmente decida abandonar uma vítima pela qual ansiou por tanto tempo, principalmente
depois de todo o trabalho de furar o cerco policial para poder capturar o
garoto. Seria como ver um leão desistir de devorar um cervo depois persegui-lo
e derruba-lo no chão.
Eu entendo que a narrativa quis usar toda a jornada de Davey
como uma metáfora para o amadurecimento, para a perda de inocência. No papel, a
ideia até poderia funcionar ao mostrar esse garoto que o mundo é mais perigoso
do que ele pensava e que monstros podem ser esconder sob uma fachada de
ingenuidade. A questão é que o fato do final operar em um nível metafórico não
significa necessariamente que o texto deva deixar de tratar seus personagens
como sujeitos críveis (em especial quando essa questão metafórica só surge no
desfecho) com motivações compreensíveis e sacrificar a credibilidade do
personagem só para produzir uma metáfora acaba quebrando a imersão e diluindo o
impacto de tudo que vimos só para criar um simbolismo que não dialoga com o que
foi estabelecido até então sobre esses personagens. Inclusive a morte de um dos
protagonistas acaba não repercutindo, servindo apenas como um choque
momentâneo.
Verão de 84 apresenta
algumas boas ideias, mas é prejudicado por personagens superficiais com
motivações que nem sempre são bem construídas.
Nota: 5/10
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