Feita na década de noventa, animação A Vida Moderna de Rocko produzia um comentário bastante ácido sobre
a sociedade de sua época e apesar de passar em um canal voltado para o público
infantil, o Nickelodeon, tratava sobre questões bastante adultas. Inclusive, eu
só cheguei a entender certas piadas ou situações muitos anos depois de ter
originalmente assistido a série. Pois a atual onda de reboots e remakes não
deixou essa série incólume, trazendo-a de volta como um telefilme da Netflix
neste A Vida Moderna de Rocko: Volta ao Lar.
Na trama, depois de passar vinte anos perdido no espaço
sideral, Rocko, Vacão e Felizberto retornam à cidade de O-Town e descobrem que
seu desenho animado favorito foi cancelado. Desesperados em lidar com um mundo
que não reconhecem mais, resolvem encontrar o criador do desenho para que ele traga
a animação de volta.
Fica claro por esta breve sinopse que o longa tenta
satirizar toda essa onda de produções tomadas por nostalgia que tem tomado a
indústria hollywoodiana. De maneira bastante metalinguística o roteiro critica
essa necessidade de ficarmos consumindo as mesmas coisas de nossa juventude
como uma maneira de nos mantermos em uma eterna infância.
Se muitas produções recentes usam a nostalgia meramente como
um escapismo confortável e como muleta afetiva, a exemplo do superestimado Jogador Número Um (2018), A Vida Moderna de Rocko: Volta ao Lar revela toda essa como fruto
de uma sociedade imatura, que prefere se refugiar no conforto do familiar do
que tentar encarar uma realidade que não consegue compreender ou lidar.
Isso fica bastante evidente no desfecho, no qual Rocko
rejeita a nova versão do seu desenho favorito apenas por ela acrescentar
personagens que não estavam no original. A atitude de Rocko revela que ele não
queria ver uma continuidade ou evolução do seu programa, mas se manter preso ao
passado, revivendo as mesmas memórias sem nunca confrontar o presente, um
problema latente nessa onda de nostalgia ou revivals.
Para além de seus comentários sobre a nostalgia, o filme
ainda faz graça com muitos elementos da contemporaneidade, a exemplo da
velocidade com a qual novos modelos de iPhone são lançados ou toda a cultura de
youtubers e streamers em ficar filmando e transmitindo a própria vida o tempo
todo. Trata também de questões de preconceito, como o conflito de Ed com Ralph
após ele se assumir como transgênero e adotar um nome e aparência femininas,
demonstrando a capacidade deste universo em lidar com temas complexos a partir
do humor e de seu visual cartunesco e aparentemente infantil.
A Vida Moderna de
Rocko: Volta ao Lar podia ser só
mais um revival cínico e descartável
feito para ganhar dinheiro em cima da nostalgia dos fãs, mas o criador Joe
Murray constrói uma esperta e metalinguística crítica a toda essa onda
nostálgica e como ela, ao contrário do que pensamos, é mais um problema do que
uma solução.
Nota: 8/10
Trailer
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