Pelo material de divulgação Uma Segunda Chance Para Amar parecia ser aquele tipo de comédia
romântica feita para pegar carona no espírito natalino e passar mensagens
positivas sobre família e relacionamentos. O resultado final é basicamente
isso, embora suas tentativas de mexer com a fórmula não cheguem a funcionar
exatamente.
A trama é centrada em Kate (Emilia Clarke), uma jovem
aspirante a cantora cuja vida está um caos desde que ela teve um grave problema
de saúde. Sua carreira como cantora não decola e ela está presa em um emprego
sem futuro, trabalhando como vendedora em uma loja de produtos natalinos
gerenciada pela dura Noel (Michelle Yeoh). A vida de Kate começa a mudar quando
ela conhece Tom (Henry Golding) e a vida dela começa a mudar.
Tal como em Como Eu Era Antes de Você (2016), Emilia Clarke é adorável como uma jovem que não
consegue dar um jeito na própria vida. Considerando a natureza caótica de Kate,
seria uma personagem fácil de se tornar detestável nas mãos de uma atriz menos
carismática, mas Clarke da a ela charme suficiente para que ela não seja só uma
desastrada abestalhada. A atriz também consegue dar conta das facetas mais
sérias da personagem, em especial a relação complicada que ela tem com a
família ou no trauma por conta do problema de saúde pelo qual passou.
Clarke é auxiliada por um elenco coadjuvante igualmente
carismático, em especial Michelle Yeoh como Noel, a chefe de Kate, e Emma Thompson
como Petra, a rígida e excêntrica mãe da protagonista. As interações de Kate
com as duas rendem alguns dos momentos mais engraçados do filme. A Noel ainda
tem uma divertida subtrama romântica na qual ela se envolve com um cliente
escandinavo de sua loja e o flerte entre os dois é um dos mais desajeitados da
ficção desde Dona Florinda e Professor Girafales no Chaves.
Se em Podres de Ricos (2018)
Henry Golding mostrou que era perfeitamente capaz de viver um “príncipe
encantado” moderno, aqui o mesmo arquétipo não funciona tão bem para o ator. É
menos culpa dele e mais do texto que transforma Tom em uma espécie de coach que precisa ficar o tempo todo
dando lições de moral sobre como viver a vida, falando através de platitudes e
frases de efeito forçadas.
Claro, há uma reviravolta que explica a conduta de Tom, mas
essa revelação também tem sua parcela de problemas. O primeiro é o modo como o
filme tenta explicar a lógica da reviravolta. O filme poderia simplesmente se
colocar no domínio do realismo fantástico, mas ao invés disso escolhe mostrar flashbacks de cena do começo do filme
que mostram uma determinada personagem sozinha. Significa que ela imaginou
tudo? Como ela poderia imaginar alguém que não conhece? O transplante de órgãos
é suficiente como explicação?
O segundo problema é que essa revelação dá uma guinada
brusca no tom do filme. Se no começo tudo soava como uma típica comédia
romântica, quando a revelação chega, a história se transforma em um drama que
trata de questões muito específicas de doação de órgãos. Sim, a reviravolta é
bem construída e as pistas são dadas desde o início, tanto que pude antever a
revelação chegando lá pela metade do filme (o que não é um demérito para a
trama, nesse caso eu é que fui atento), mas toda a divulgação do filme é feita
para vender a ideia de um romance fofo e imagino que muitos podem se sentir
traídos pela guinada que o filme dá.
Falando em divulgação, a publicidade faz questão de
salientar que a trilha musical do filme é toda composta por canções de George
Michael, porém essa decisão soa quase que inconsequente para a trama. A
personagem diz em mais de uma ocasião que gosta do cantor, mas o filme nunca
constrói uma conexão de fato entre Kate e a música de Michael como Guardiões da Galáxia (2014) constrói
entre Peter Quill (Chris Pratt) e o rock da década de setenta, por exemplo. Por mais que a canção Last Christmas dê o título original ao filme e tenha alguma ressonância temática, isso não justifica a escolha de uma trilha musical só composta de canções do cantor. Do
jeito que está parece mais uma decisão de executivos de estúdio e gravadora
para dar visibilidade e aumentar o faturamento das canções do finado músico, do
que um elemento natural da trama.
A guinada também continua a maneira mastigada e pouco
orgânica com a qual o filme passa suas mensagens sobre família, compaixão e
caridade. São mensagens importantes e nos últimos tempos sinto que muitos
filmes natalinos deixaram essas ideias de lado em prol de tratar apenas do
cumprimento de metas e desejos pessoais, no entanto, fica a impressão em muitos
momentos que o filme está pregando ao invés de dialogando conosco. Não fosse a
capacidade do diretor Paul Feig em dosar essas lições com humor e o calor
humano do elenco, o filme podia facilmente descambar para uma baboseira
pseudointelectual e autoindulgente como Beleza Oculta (2016).
Assim, é por conta do carisma do elenco liderado por Emilia
Clarke que Uma Segunda Chance Para Amar
consegue divertir e emocionar, ainda que o filme pese a mão no modo como
apresenta sua mensagem.
Nota: 6/10
Trailer
O filme é fantástico
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