segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

Crítica – O Juízo


Análise Crítica – O Juízo


Review – O Juízo
Eu constantemente falo aqui como um dos problemas de se fazer cinema de gênero no Brasil é que muitas vezes os realizadores simplesmente tentam aplicar as formas e estruturas hollywoodianas típicas desses gêneros sem tentar entender como esses formatos se adequam ou não à realidade brasileira. O Caseiro (2016) tentava reproduzir a fórmula de um terror de “casa mal assombrada” sem muito que pudesse diferenciar do que é comumente feito nos EUA. Nesse sentido, este O Juízo era bem promissor ao pegar essa premissa e tentar contar uma história mais calcada em elementos da realidade história brasileiras.

Na trama, Augusto (Felipe Camargo) se muda com a esposa, Teresa (Carol Castro), e o filho adolescente, Marinho (Joaquim Torres Waddington), para a dilapidada propriedade rural da família no interior. Augusto está endividado e propriedade é a única coisa que lhe resta e sua única oportunidade de se reerguer. Chegando lá, Augusto e seu filho começam a receber a visita de um homem estranho (Criolo) que chega oferecendo a oportunidade de encontrar diamantes nas terras do local.

A narrativa tenta criar um mistério em relação a quem é esse estranho e o que ele quer ali. O problema é que esse mistério ou tensão não se sustentam porque já na primeira cena o filme nos explica que o visitante é o fantasma de um escravo fugido que foi entregue às autoridades por um ancestral de Augusto. Com isso, ao invés de nos envolver na incerteza de quem (ou o quê) seria aquela figura que aparece na propriedade e quais as intenções dela, a primeira hora do filme se torna um exercício de paciência conforme sentamos e esperamos os protagonistas aprenderem algo que já sabemos desde o primeiro minuto.

O pano de fundo da escravidão e a ideia de ter uma fracassada família de latifundiários sendo assombrada pelo fantasma (literal e metafórico) da escravidão poderia render um ótimo terror que refletisse sobre o brutal processo de construção do nosso país e como a riqueza das elites brancas (sobretudo as elites agrárias) se fez em cima do sangue e do trabalho escravo, havendo ainda uma dívida (social, política, kármica) a ser paga em relação a isso. O problema é que o texto nunca investe de fato nesses temas nem tem nada consistente a falar sobre isso.

Ao invés de explorar essas ideias, o material prefere se transformar em uma espécie de O Iluminado (1980) genérico em seu terço final. O filme é ainda prejudicado por nunca dar muito o que fazer ao seu elenco coadjuvante, a despeito de sua qualidade. Fernanda Montenegro é desperdiçada com uma personagem cuja função é meramente expositiva e sua presença acaba tendo pouco impacto na trama ou no destino dos personagens.

A fotografia, por outro lado, acerta no modo como constrói o clima de isolamento experimento pela família protagonista. Como eles estão em uma pequena propriedade rural sem energia, a produção opta por filmar tudo com luz natural, deixando esses personagens imersos da escuridão de sua existência solitária no meio do mato. O cantor Criolo, por sua vez, é eficiente em dar ao visitante uma aura de ameaça e mistério, mesmo quando já sabemos desde o início as intenções de seu personagem.

O Juízo soa, portanto, como uma oportunidade desperdiçada, sua premissa tinha tudo para render um terror que servisse de metáfora social, mas o resultado acaba sendo moroso e superficial.

Nota: 5/10

Trailer

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