quinta-feira, 26 de dezembro de 2019

Crítica – The Witcher: 1ª Temporada


Análise Crítica – The Witcher: 1ª Temporada


Review – The Witcher: 1ª TemporadaApesar de ter se tornado famoso nos games, o universo de The Witcher nasceu na literatura pelas mãos do autor Andrzej Sapkowski. É importante lembrar isso porque essa série produzida pela Netflix é baseada nos livros, que tem algumas diferenças em relação aos games.

A trama é centrada em Geralt de Rívia (Henry Cavill). Geralt é um bruxo, um caçador de monstros que passou por uma série de mutações criadas artificialmente para ampliar suas capacidades físicas e ser capaz de enfrentar toda a sorte de criaturas sobrenaturais. O destino de Geralt muda quando ele conhece a maga Yennefer de Vengerberg (Anya Chalotra) e quando é prometido a tutela da jovem princesa Ciri (Freya Allan), uma garota dotada de poderes misteriosos que despertam a atenção de muitas pessoas perigosas.

A série é bem fiel ao universo cinzento dos livros, no qual bem e mal não existem de maneira absoluta e um ser humano comum pode ser mais vil que qualquer criatura sobrenatural. Geralt caminha por esse universo seguindo um código moral próprio, se recusando a matar monstros que não fazem mal a ninguém e preferindo curar ou restaurar criaturas amaldiçoadas a destruí-las. Nesse sentido Geralt é praticamente um protagonista de narrativas noir, um sujeito duro e cínico que tenta sobreviver e preservar a honra em um ambiente de pouca clareza moral.

Henry Cavill é competente em transmitir a personalidade rígida e voz áspera de Geralt, alguém que sobreviveu em um cotidiano de violência ao seguir um conjunto de regras bastante rígidas e já não demonstra muita fé na raça humana. Cavill é igualmente eficiente em nos convencer da habilidade de Geralt como combatente, fazendo das lutas uma espécie de dança sangrenta, fazendo o protagonista se mover de maneira simultaneamente graciosa e brutal, de uma maneira que remete às lutas jogo. A performance de Cavill e as coreografias de luta são ainda beneficiadas pelas escolhas de encenação, mantendo a câmera ao redor dos personagens e evitando uma montagem picotada ou muitos movimentos com a câmera.

Já Anya Chalotra confere credibilidade às transformações vivenciadas por Yennefer, que vai de uma mulher deformada e insegura a uma maga poderosa e confiante disposta a qualquer coisa para consolidar seu poder. Se a relação entre ela e Geralt soa súbita demais de início, isso é um elemento posteriormente explicado ao longo da temporada, embora quem conheça ou livros ou mesmo os games já conheça em alguma medida os motivos da complicada relação.

Se os personagens e o universo que eles habitam funcionam muito bem, o mesmo não pode ser dito da maneira com a qual a trama é estruturada. A narrativa se divide entre as histórias de Geralt, Yennefer e Ciri, mas apesar da montagem constantemente alternar entre elas, os três fios não são cronologicamente concomitantes. A trama de Yennefer se passa ao longo de décadas, a trama de Geralt ao longo de alguns anos e a de Ciri ao longo de alguns dias ou meses. O problema é que em nenhum momento a série comunica isso explicitamente ao espectador, nos forçando a deduzir essas escolhas quando vemos alguém morrer em um episódio e aparecendo viva no seguinte.

Como nunca há uma comunicação explícita por parte da narrativa, ainda assim demora um tempo a termos certeza de que estamos acompanhando temporalidades diferentes, o que torna os primeiros episódios bem difíceis de acompanhar, já que tudo soa bagunçado, fragmentado e por vezes redundante (vemos algo acontecer sendo vivenciado por um dos protagonistas, apenas para vermos o mesmo evento sob um outro ponto de vista em episódios posteriores.

Eu sou uma pessoa que costuma defender que produtos expressivos devem confiar na inteligência do espectador para entender o que está sendo comunicado, mas é preciso ao menos fornecer a esse espectador as informações do que é esperado dele enquanto leitor e decifrador da obra e The Witcher não faz isso. Bastariam alguns letreiros rápidos situando o ano ou o deslocamento temporal quando essas mudanças acontecessem para que a trama soasse menos caótica e hermética.

Ainda assim, The Witcher oferece ação e drama em medidas suficientes para valer a experiência, sendo uma adaptação fiel do clima das histórias literárias de Andrzej Sapkowski. Agora que as três histórias convergiram, espero que a segunda (já confirmada) temporada adote uma estrutura menos embaralhada.

Nota: 7/10


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