Depois de explorar o folclore dos
Estados Unidos colonial no excelente A Bruxa (2016), o diretor Robert Eggers agora resolve mergulhar (trocadilho
não intencional) no folclore sobre o mar, marinheiros e pessoas que trabalham
com o oceano neste O Farol e o
resultado é igualmente perturbador.
Filmado todo em preto e branco, a
trama se passa no final do século XIX e é centrada em dois homens que trabalham
em um farol situado em uma ilha remota. Winslow (Robert Pattinson) chega na
ilha esperando que o novo trabalho sirva como um recomeço, mas lá encontra o
veterano vigia Wake (Willem Dafoe) que além de ser um exigente chefe, também
demonstra ser mentalmente instável conforme narra histórias fantasiosas de
infortúnios no mar. O isolamento e a diferença de personalidade vai aos poucos
ampliando os atritos entre os dois.
Tal como acontecia em A Bruxa, muito da tensão vem do fato de
não sabermos se de fato existem horrores sobrenaturais rondando os personagens
ou se tudo é fruto da mente deles, enfraquecida pelo isolamento, desnutrição e
bebida. O uso de preto e branco permite que Eggers invista em composições
cheias de contrastes entre luz e sombra que, somados aos ângulos de câmera
descentralizados e por vezes inclinados, criam formas tortas, distorcidas, que
criam a sensação de desconforto e a impressão de que há algo errado naquele
lugar. É um modo de composição imagética bastante tributário ao movimento do
cinema expressionista alemão e serve para mergulhar o espectador na perspectiva
e estado mental dos personagens que vivenciam uma realidade torta na qual o
mundo real se mistura com fantasia e delírios.
O som é outro elemento que nos
ajuda a sentir a perturbação mental vivenciada pelos protagonistas. O constante
e intenso som das máquinas a vapor que movimentam o farol e estão
constantemente martelando na cabeça de Winslow é um exemplo disso, como se
aquele barulho incessante fosse contribuindo para que ele perca a cabeça. Do
mesmo modo, sons de tempestades, do constante canto de gaivotas e outros ruídos
contribuem para esse sentimento de inquietação, de uma mente que não é deixada
em paz.
Robert Pattinson, que nos últimos
anos vem entregando ótimas atuações em filmes como Bom Comportamento (2017), Z:A Cidade Perdida (2016) ou The Rover:
A Caçada (2014), é muito eficiente em construir a espiral de loucura pela
qual seu personagem passa. Winslow começa como um homem simples e pacato e aos
poucos se torna um bebedor compulsivo e agressivo conforme o isolamento e
situações estranhas começam a tomar seu cotidiano. O filme cria imagens bem
sinistras de tentáculos tomando o topo do farol, cadáveres aparecendo na praia,
Winslow espancando uma gaivota violentamente e uma sereia seduzindo o
protagonista, que se masturba furiosamente enquanto imagina (ou lembra?) fazer
sexo com a criatura, incluindo imagens bem explícitas de uma vagina (ou seria
cloaca?) da sereia.
Willem Dafoe traz a mesma energia
insana de Pattinson e faz de Wake uma presença que é simultaneamente
assustadora e patética conforme o faroleiro constantemente berra, repreende e é
violento com seu subordinado ao mesmo tempo em que demonstra uma clara
fragilidade mental. Graças à maneira intensa e exaltada com a qual Dafoe
declama as histórias contadas pelo sujeito, é difícil não percebê-lo como uma
espécie de arauto do juízo final, que está ali narrando os modos como o
personagem de Pattinson poderá encontrar infortúnio naquele lugar. São
histórias que remetem a diferentes mitologias, desde os mitos gregos antigos a
histórias nórdicas e bretãs sobre o oceano e esse imaginário permeia toda a
construção do filme. É difícil, por exemplo, ver a cena final e não pensar na história
de Prometeu, condenado a ser bicado por aves eternamente depois de tentar
roubar a luz do Olimpo.
Com performances intensas,
imagens perturbadores e uma atmosfera de constante tensão, O Farol é um excelente exame sobre os efeitos do isolamento, do
folclore sobre o oceano e dos horrores que residem naquilo que não conhecemos.
Nota: 9/10
Trailer
Pareceu interessante...vou assistir
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