terça-feira, 21 de janeiro de 2020

Crítica – A Possessão de Mary


Análise Crítica – A Possessão de Mary


Review – A Possessão de Mary
Já em seu letreiro inicial o terror A Possessão de Mary abre com um poema do século XVIII sobre os perigos do mar. Ao evocar o folclore marítimo e dos Estados Unidos de séculos atrás, é difícil não pensar nos trabalhos de Robert Eggers, que trabalhou esses temas nos ótimos A Bruxa (2016) e no recente O Farol (2020). A Possessão de Mary, no entanto, sequer consegue chegar perto do efeito dos filmes de Eggers e cria uma trama de possessão sem personalidade.

Na trama, o pescador David (Gary Oldman) decide deixar de trabalhar para os outros e comprar um barco para si. Em um leilão David se vê fascinado por um velho barco que foi encontrado abandonado e decide comprá-lo para transformar a embarcação em um veículo turístico. Para testar o navio, David decide fazer uma viagem até as Bahamas acompanhado da esposa, Sarah (Emily Mortimer), das duas filhas, do namorado da filha mais velha e do marinheiro Mike (Manuel Garcia-Rulfo). Aos  poucos, coisas estranhas começam a acontecer.


Trabalhar uma narrativa em um espaço tão pequeno e isolado como um barco de pequeno porte no meio do mar é uma faca de dois gumes. É possível usar essa ambientação para criar algo claustrofóbico e apreensivo como também é possível que o texto tenha dificuldade em fazer a premissa render dentro de um número reduzido de locações e personagens. Este filme se encaixa na segunda categoria, pois apesar de ter apenas 84 minutos, a trama se arrasta e demora a engrenar. Isso seria perdoável se ao menos construísse personagens interessantes ou um clima de tensão, mas nada disso acontece. Os personagens, exceto por David e Sarah, são desprovidos de qualquer motivação palpável ou traços identificáveis de personalidade. Quando as coisas começam a dar errado no barco, o filme está a mais da metade de sua minutagem e só nos últimos vinte minutos é que ele tenta construir algum tipo de tensão.

É um daqueles filmes de terror que acha que criar medo no espectador se resume a sustos súbitos com alguma criatura aparecendo rapidamente na tela seguida de um barulho alto. Sem construir uma mitologia consistente ou um mínimo de razão de ser para sua assombração, no entanto, esses sustos soam vagos e gratuitos, prejudicados ainda pelo péssimo fantasma digital. Toda a ideia de explorar os mitos do mar não é devidamente aproveitada, com a trama preferindo ser um filme genérico de possessão e ainda decidindo em se tornar um slasher em seus últimos minutos quando um personagem possuído tenta matar todos no barco. É difícil sentir medo porque a ameaça do barco nunca é minimamente definida, seja no que ela quer ou em como ela age, nos deixando sem saber o que exatamente temer.

Os conflitos familiares que a trama gasta boa parte de sua minutagem apresentando também nunca são aproveitados e não rendem nenhum conflito ou repercussão. Assim, a informação de que Sarah traiu David, de que eles estavam perto do divórcio e que a viagem de barco seria uma tentativa de recomeço, serve pouco mais do que uma motivação inicial para que os eventos do filme aconteçam. Era de se imaginar que os conflitos entre o casal voltassem a emergir quando as situações sobrenaturais começassem a ocorrer no barco, mas o texto desenvolve muito pouco tudo isso.

A narrativa ainda apresenta uma reviravolta no final que é bem previsível e feita para deixar espaço para possíveis continuações, mas sinceramente espero que não aconteçam. Digo isso porque A Possessão de Mary é um terror sem ritmo e sem personalidade, que não consegue aproveitar sua premissa e não faz nada além de jogar alguns sustos a esmo.

Nota: 2/10


Trailer

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