William H. Macy é um ótimo ator e
trabalhou em alguns de meus filmes favoritos como Fargo (1996) Boogie Nights (1997), Magnólia (1999) ou O Quarto de Jack (2015), então fiquei curioso quando soube que ele
ia fazer sua estreia como diretor com a comédia A Escala: Amizade em Segundo Lugar.
Os primeiros trailers saíram e
meu interesse foi diminuindo, já que parecia ser sobre duas amigas largando
tudo para disputar um homem. O tipo de premissa tão anacrônica e machista que
não fazia sentido em 2017 (quando o filme foi lançado) ao ponto em que comecei
a pensar que havia algo mais, Macy poderia estar fazendo um filme irônico ou
que seria capaz de virar a premissa em cima dela mesma e mostrar o quanto esse
tipo de olhar sobre as mulheres é datado. Mas não, o filme é mesmo sobre
mulheres se tornando rivais e literalmente fazendo piruetas para o prazer
visual de um homem.
Na trama Kate (Alexandra
Daddario) e Meg (Kate Upton) dividem um apartamento e são amigas desde o
colégio. Quando as duas sentem que suas vidas não estão indo pelo caminho que
desejam, decidem viajar para espairecer. No voo as duas conhecem Ryan (Matt
Barr) e imediatamente tentam conquistá-lo. Quando um furacão impedem que
aterrissem no destino planejado e a companhia aérea decide colocar todos os
passageiros em um hotel de luxo, Kate e Meg decidem fazer qualquer coisa para
ficar com Ryan.
Chama atenção o modo histérico e
desesperado com o qual a dupla de protagonistas tenta chamar a atenção de Ryan
desde o primeiro momento em que o veem, como se fossem dois animais no cio ou como se as duas nunca tivessem visto um homem antes. Por
se tratar de uma comédia, poderia ser argumentado que o exagero tem propósitos
cômicos, mas a conduta das duas é tão fora de qualquer padrão de comportamento
feminino e humano conhecido que é difícil achar graça, principalmente quando
repete o senso comum antiquado de que a vida de uma mulher se resume a correr
atrás de homem.
A disputa entre Kate e Meg
inclusive vai se agravando ao ponto em que as duas começam a efetivamente
prejudicar uma a outra, física e psicologicamente. Para afastar a amiga/rival
de Ryan, elas colocam a outra em situações de perigo físico ou as fazem reviver
traumas que, pelo convívio de anos que tem, sabem que irão afetar a amiga. Se
elas se conhecessem a pouco tempo talvez fosse possível tornar isso
convincente, mas é bem difícil crer que amigas de décadas fariam mal uma a
outra de maneira tão deliberada por um motivo tão fútil.
Como a conduta de qualquer uma
das duas acaba sendo bem desprezível por causa desses excessos que elas vão
para tentar conseguir ficar com um homem que mal conhecem, é difícil se
importar com qualquer uma delas. Também é difícil achar graça na maioria das
situações pretensamente cômicas que a trama propõe, constantemente recorrendo a
uma escatologia rasteira de arrotos e fezes para tentar fazer rir, como algo
saído diretamente de uma comédia estrelada por Adam Sandler.
A (previsível) reviravolta de que
Ryan, na verdade, era comprometido poderia até ser usada para ressignificar
tudo o que o filme fez até aqui. Poderia tornar Ryan o principal antagonista,
mostrar que ele percebeu o que as duas estavam fazendo uma com a outra e deixou
tudo acontecer pelo próprio prazer e usar isso para falar sobre a objetificação
da mulher ou como a representação feminina no cinema é feita para reproduzir um
olhar masculino que reduz a mulher a um objeto sexual. O filme, porém, não só
desperdiça essa oportunidade como usa essa reviravolta para reproduzir ainda
mais estereótipos anacrônicos sobre mulheres. A revelação de que a esposa de
Ryan é uma megera controladora é usada tanto para justificar a traição (como se
ele fosse algum coitado forçado a casar com aquela mulher) e também como
punição pelo que Ryan fez com as duas, reforçando a ideia do casamento e a
imagem da mulher como essa figura castradora que só existe para tolher o homem.
Em resumo, existem basicamente
três personagens femininas no filme inteiro. Duas delas são completamente
desesperadas para agarrar qualquer homem minimamente atraente que aparece na
frente, sendo tratadas como objetos sexuais, e a terceira é uma megera
castradora. Para a equipe criativa do filme, que é toda composta por homens,
por sinal, mulheres são reduzidas a objetos ou a problemas, o que é uma
reprodução de preconceitos antiquados e machistas que não deveria mais ter
espaço no cinema. Principalmente em um produto comandado por um realizador que
já participou de filmes (como os citados no primeiro parágrafo) com personagens
femininas complexas que não se encaixam nesses clichês anacrônicos.
Sem graça, sem sentido e
recorrendo a estereótipos grosseiros sobre mulheres A Escala: Amizade em Segundo Lugar é uma péssima estreia do ator
William H. Macy como diretor.
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