Eu não estava preparado para a
sucessão de absurdos que a trama deste A
Arte da Autodefesa colocou diante de mim. Falo absurdos no bom sentido, já
que todos os eventos inesperados e condutas sem noção parecem claramente pensados
para agregar à mensagem do filme e suas ponderações sobre masculinidade.
A trama é protagonizada por Casey
(Jesse Eisenberg), um contador pacato e tímido que um dia é assaltado e
espancado por uma gangue de motoqueiros. Traumatizado pelo ocorrido, Casey
decide começar a fazer aulas de karatê para ser capaz de se defender. Aí ele
conhece Sensei (Alessandro Nivola), um instrutor artes marciais que promete
fazer o protagonista superar todos os medos.
Dizer mais seria estragar a
experiência de quem ainda não assistiu, já que a trama nos leva a muitos
desdobramentos inesperados. O que parecia uma história de um sujeito lidando
com os traumas da violência urbana se transforma em uma versão idiota de Clube da Luta (1999). Por outro lado, a
reviravolta envolvendo a gangue de motoqueiros é relativamente previsível.
Sim, o plano da gangue não faz muito sentido, mas me parece ser uma decisão
proposital de mostrar como toda a situação e o esforço precisar rearfirmar a
masculinidade o tempo todo é, em si, absurdo e potencialmente perigoso.
A jornada de Casey é se tornar
mais assertivo e menos medroso, com o personagem idealizando o karatê como esse
veículo que irá lhe dar o que deseja. Aos poucos vamos percebendo que o
personagem, na verdade, está usando a arte marcial para compensar suas
inseguranças quanto à própria masculinidade, como se ele precisasse agir de
maneira exageradamente agressiva e insensível para demonstrar que é “homem” (no
sentido de masculinidade heteronormativa). Eisenberg já mostrou ao longo de sua
carreira como é hábil em interpretar um sujeito emocionalmente retraído, seja o
Zuckerberg de A Rede Social (2010) ou
o Columbus dos dois Zumbilândia e
aqui faz de Casey um sujeito sempre prestes a desabar sob o peso do quanto
detesta ser quem é.
Já Alessandro Nivola faz do
Sensei uma figura dotada de certa gravidade e mistério, mas que aos poucos vai
se tornando cada vez mais esquisito conforme aprendemos suas ideias bizarras
sobre o que é “ser homem”. É uma transição que podia tornar o personagem
caricato ou pouco crível, mas que faz sentido pela maneira como se conecta com
o senso de absurdo com o qual o texto olha para os ideais típicos de
masculinidade e também pela performance de Alessandro Nivola, que nos permite
vislumbrar que toda a bravata e rigidez é um mecanismo de defesa para esconder
um homem profundamente inseguro.
O filme também mostra como essa
busca por se tornar o auge da masculinidade afeta as mulheres, com Anna (Imogen
Poots) sempre sendo preterida para receber a faixa preta apesar dela ser melhor
do que todos os outros homens do dojo. É um exemplo de como uma hierarquia
patriarcal prejudica e subestima as mulheres, com o desfecho nos lembrando que
dar espaço ao feminino e se desfazer de padrões arcaicos de masculinidade é o único
caminho possível para melhorarmos.
Povoado por personagens
excêntricos e com um senso de absurdo bem particular, A Arte da Autodefesa apresenta uma visão ácida sobre o quão frágil
é o ideal de masculinidade.
Nota: 8/10
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Não gostei!
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