Escrito pelo ator Shia Labeouf a
partir de suas próprias experiências com o pai, este O Preço do Talento é uma história quase que autobiográfica sobre um
astro mirim preso em uma complicada (e por vezes abusiva) relação com o pai.
Dirigido pela israelense Alma Har’el, em seu primeiro longa de ficção, o filme
surpreende pelo cuidado e complexidade com o qual trata esse relacionamento
entre pai e filho.
Na trama, Otis (Lucas Hedges) é
um ator problemático, com vícios em drogas e bebidas, que é levado para
reabilitação depois de um acidente de carro. Como parte de sua terapia, Otis
começa a escrever sobre os motivos que levaram a seus vícios e então fala de
sua juventude ao lado do pai, James (Shia Labeouf). O arco imita, de certa
forma, a própria vida de Labeouf, que escreveu O Preço do Talento quando estava na reabilitação.
Como um astro-mirim, Otis (Noah
Jupe) conta com a constante presença do pai nos sets de filmagem e passa a
maior parte do tempo com ele. Jupe é ótimo em construir a vulnerabilidade de
Otis, que percebe que as ações de James não são compatíveis com o que se espera
de um bom pai, mas ainda assim não é capaz de dizer como se sente ou mesmo de
confrontar os erros e irresponsabilidades do pai.
Shia Labeouf, por sua vez,
impressiona com a energia e complexidade que coloca em James. Como o ator
interpreta uma versão muito próxima de seu próprio pai, seria fácil transformar
James em uma figura vilanesca unidimensional, mas isso não ocorre. Labeouf
constrói o personagem com muita maturidade, tentando entender o ponto de vista
dele, mas sem aliviar em seus aspectos negativos. James é simultaneamente um
ególatra que se acha um grande artista e vê no filho a chance de sucesso que
nunca teve e um sujeito com um enorme complexo de inferioridade que reage com
agressividade cada vez que se sente diminuído por alguém.
Essa insegurança de James fica
evidente na cena com Tom (Clifton Collins Jr), o padrasto de Otis. Quando James
percebe que Otis está se aproximando do novo marido da ex-mulher, começa a
tratar Tom com uma hostilidade desproporcional, chegando ao extremo de jogá-lo
em uma piscina. Esse complexo de inferioridade parece vir de uma certa amargura
por nunca ter alcançado o sucesso que achava merecer e isso o faz projetar no
filho suas inseguranças e frustrações. Nesse sentido, a intensidade com a qual
ele estimula Otis a ter sucesso não é exatamente por se preocupar com o filho,
mas por si mesmo.
Ainda assim James é também
retratado como um sujeito machucado, igualmente maltratado pela vida e com seu
próprio conjunto de traumas que ajudam a humanizá-lo e a compreender sua
conduta sem, no entanto, relativizar os abusos com o filho. Dada a força da
performance de Labeouf seria possível que James roubasse o filme para si, mas a
condução de Har’el nunca perde de vista que essa é a história de Otis e como a
relação com James impacta o jovem ator.
Como a versão adulta de Otis diz
em dado momento, a exploração que o personagem de sua complicada infância é uma
maneira de tentar entender o que fazer com toda a dor experimentada nessa época
e que o definiu como pessoa e artista. É um esforço de viajar no âmago dessa
dor para conseguir se libertar dela, para alcançar uma catarse, se purificar
dessa dor. De certa forma, essa deve ter sido também a razão de Shia Labeouf
para escrever esse filme e Alma Har’el nos conduz por essa experiência poderosa
de catarse com muito cuidado e sensibilidade.
Nota: 9/10
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