segunda-feira, 20 de abril de 2020

Crítica – Freud


Resenha Crítica – Freud


Review – Freud
Narrativas policiais são calcadas no uso da razão e raciocínio lógico para desvendar crimes. Esse gênero narrativo já recorreu a personagens com metodologias baseadas em diferentes campos do conhecimento, inclusive aqueles que tentam compreender o funcionamento da mente humana. Nesse sentido, o gênero já recorreu mais de uma vez à figura de Sigmund Fred, o pai da psicanálise, como esse investigador arguto capaz de resolver crimes tão complicados que parecem até sobrenaturais. No cinema ele já chegou a se aliar a Sherlock Holmes em Visões de Sherlock Holmes (1976) e agora é levado para a televisão na minissérie alemã Freud.

A trama se baseia em um período da vida do médico sobre o qual há pouco registro, então a narrativa tenta imaginar o que teria acontecido com Freud (Robert Finster) nessa lacuna. Nesse sentido, acompanhamos Freud enquanto ele tenta defender suas ideias sobre o inconsciente enquanto se envolve com um mistério envolvendo a misteriosa Fleur Salomé (Ella Rumpf), que sob o transe hipnótico aparentemente consegue prever crimes. Onde muitos pensam existir uma conexão sobrenatural, Freud suspeita de haver um problema relacionado ao inconsciente da jovem mulher.

A trama demora um pouco de engrenar e deixar claro quais são os principais conflitos e objetivos dos personagens principais, mas compensa com uma atmosfera sombria, carregada pelo sentimento de que uma grande ameaça, seja ela metafísica ou fruto da psique humana, está a espreita. Ao longo da temporada a trama consegue criar imagens sinistras, como as que envolvem o estranho culto liderado pelos antagonistas ou as memórias traumáticas de guerra do policial Kiss (Georg Friedrich).

Essas imagens brutais também são vistas nos hospitais em que Freud trabalha como parte dos tratamentos a pacientes com problemas mentais. A trama é eficiente em mostrar como essas técnicas antigas estavam mais próximas de tortura do que efetivamente de tratamento, ilustrando o debate científico em torno de toda a questão manicomial e a busca de Freud por tratamentos mais humanos e com resultados melhores em seus pacientes. Nesse sentido, a narrativa consegue mostrar como a psicanálise e a ideia de inconsciente defendida por Freud transformou o campo da saúde, especialmente o campo da saúde mental.

Ao longo da investigação, a trama mostra como Freud foi desenvolvendo suas noções de tabu, dissociação, libido e outros conceitos-chave de seus métodos. Tudo bem que na vida real provavelmente não foi dessa maneira que Freud chegou a essas noções, mas o texto faz um bom trabalho em usar os eventos da trama para ilustrar e explicar de maneira orgânica e compreensível esses conceitos para um público leigo.

O fato dos vilões usarem a hipnose para manipular as pessoas ou ocultar verdades é um modo de chamar atenção para os perigos em confiar em indivíduos que usam desses recursos sem o conhecimento da medicina ou psicanálise. Assim como acontecia na época da trama, ainda hoje temos falsos místicos e “terapeutas” sem formação alguma que clamam usar a hipnose para produzir milagres ou curas instantâneas para transtornos psíquicos cujo tratamento na mão de profissionais sérios leva tempo para dar resultados consistentes.

A trama dos vilões, no entanto, é um pouco prejudicada pelo fato do texto passar muito rapidamente pelo contexto histórico da época e as questões envolvendo a rivalidade entre Áustria e Hungria. Claro, é possível compreender o desejo de vingança deles frente às experiências violentas e traumáticas. Ainda assim toda a questão do conflito entre os dois países é meio que tratada confiando que o público entenda plenamente o contexto por trás de tudo e isso certamente deve ser o caso da audiência alemã e austríaca para o qual a série foi inicialmente pensada, mas talvez nem tanto para o resto do mundo.

De todo modo, Freud consegue criar um mistério e atmosfera envolventes ao mesmo tempo em que explica os motivos de seu protagonista ser tão influente no campo acadêmico.

Nota: 8/10


Trailer

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