quinta-feira, 23 de abril de 2020

O divisivo final de Final Fantasy VII Remake



Quando escrevi a crítica de Final Fantasy VII Remake, elogiei o fato de ser uma reimaginação excelente tanto em termos visuais quanto em termos de jogabilidade e trama. Apontei, porém, a bagunça que eram os últimos momentos da trama e como essas escolhas criavam vários problemas ao tentar explicar coisas que não precisavam de explicação. Eu vou tentar analisar os desdobramentos desse final, então o texto a seguir contem SPOILERS do final do jogo.

Durante toda a narrativa de Final Fantasy VII Remake Cloud e seus aliados encontram estranhos espectros encapuzados semelhantes aos Dementadores do universo Harry Potter. Nos últimos capítulos Red XIII revela que eles são os Murmúrios, guardiões do destino que garantem que a preservação da linha do tempo. Sim, o jogo revela que essa é uma espécie de linha temporal paralela ao game original de 1997.

A explicação faz certo sentido, já que toda ver que os Murmúrios aparecem é em momentos que as coisas parecem se desdobrar diferente do original. Na primeira conversa entre Cloud e Aerith as criaturas aparecem para afastar a florista porque ela deveria ter ido embora antes de Cloud ser cercado pelos soldados. Quando Hojo está prestes a falar a verdade sobre o passado de Cloud, algo que no game original só era revelado ao protagonista bem mais a frente.

A questão é: tudo isso era realmente necessário? Sabemos que esse um remake, que a história seria reinterpretada, então precisava mesmo gastar tanto tempo e diálogos expositivos com essa explanação macarrônica sobre multiverso e temporalidades alternativas? Não sei até que ponto seria necessário justificar dentro da trama que esses novos jogos não seguirão tão à risca a trama do original. A batalha final torna tudo ainda mais rocambolesco. Durante a fuga de Midgar, o vilão Sephiroth ataca os heróis na autoestrada, mas é logicamente interrompido pelos Murmúrios já que esse não era o momento em que eles se enfrentavam.

Aerith, aparentemente capaz de conversar com os espectros e com o próprio planeta, afirma que Sephiroth precisa ser detido, mesmo que eles precisem alterar o destino. Então, antes de enfrentarem Sephiroth, Cloud e os demais destroem o líder dos Murmúrios, eliminando assim as forças que garantiriam que tudo seguisse a linha temporal original e esse parece ser o plano de Sephiroth. Consciente da linha temporal original, ele manipula os heróis a destruírem os murmúrios, assim, as forças que garantiriam que ele sempre perdesse não mais existem. No entanto, a decisão de Aerith em dizer que ela e os companheiros precisavam lutar com Sephiroth naquele momento não faz sentido.

Se ela sabia das intenções dos Murmúrios e sabia que o destino garantiria a vitória deles, então qual o motivo de arriscar tudo? Bastaria dizer para darem meia-volta que os Murmúrios se encarregariam de por Sephiroth em seu devido lugar. Ao longo da trama, desde que Cloud a conhece, Aerith demonstra ter ciência dos eventos vindouros e da sua eventual morte nas mãos de Sephiroth para que o planeta seja salvo. Então qual a razão de jogar fora uma vitória aparentemente garantida?

Toda essa ideia de temporalidades alternativas só cria mais complicações e possíveis furos do que ajuda a trama em qualquer nível. Eu já imaginava de qualquer jeito que fatos do original poderiam acontecer de maneira diferente aqui, então a trama não precisava explicar isso dentro do universo narrativo. A natureza de um remake é exatamente essa, reimaginar uma história já conhecida.

Essa escolha também me deixa um pouco preocupado se considerarmos algumas das últimas cenas que mostram personagens que deveriam estar mortos, como Zack e Biggs, aparentemente sobrevivendo. O problema não é, em si, a alteração do original, temo porque isso pode abrir espaço para uma espécie de “super final feliz” onde ninguém morre e isso tiraria o peso da luta contra Sephiroth. O vilão é uma força capaz de destruir um planeta inteiro, o mal supremo. A vitória contra uma força tão poderosa deveria ser sofrida, deveria ter um custo e se todos saem ilesos desse confronto então esse “mal supremo” talvez não seja tão supremo assim.

Lembro, inclusive, que ao falar sobre o original, os criadores disseram que chegaram a considerar uma forma de que o jogador pudesse ressuscitar Aerith, mas desistiram porque isso tirava o peso dramático da morte dela. Isso fazia sentido antes e continua a fazer sentido agora, então se ela não morrer, se os membros da Avalanche não morreram, se Zack não morreu, a vitória contra Sephiroth não tem um “custo”. Claro, é possível contornar isso matando personagens diferentes, o que é uma possibilidade. Só espero que ao final da jornada não saiam todos ilesos.

Outra possibilidade é que tudo aconteça exatamente igual, ainda que os personagens morram em ocasiões diferentes, para sinalizar que foi justamente a tentativa de Sephiroth em alterar o destino que colocou em movimento as circunstâncias necessárias para sua derrota. Nesse caso, no entanto, toda a questão de destino e temporalidade soaria inútil, já que, afinal, pra quê inserir novos elementos que não vão repercutir em nada? De novo, isso só mostra como essa escolha cria mais problemas do que resolve.

Outra questão que ficamos ponderando é quanto falta para a história toda ser contada. Sabemos que este será o primeiro episódio, mas a Square nunca deixou claro quantos estão planejados. A seção de Midgar coberta em FinalFantasy VII Remake era uns 25 a 30% do game original, mas isso significa que teremos mais três ou quatro episódios? Talvez. Ou talvez menos. Considerando que a estrutura de Midgar era mais linear e que depois o jogo se transforma em um mundo mais aberto, é possível pensar que recortar esse primeiro episódio em Midgar garantiria uma estrutura mais coesa.

Consigo imaginar os próximos adotando uma estrutura mais parecida com FinalFantasy XV, com um mundo aberto a explorar. Nesse sentido, talvez seja possível dar conta do restante do jogo em mais dois episódios. Um que fosse da saída de Midgar até a morte de Aerith e outro que continuasse desse ponto até o final. Se isso é uma previsão correta, só o tempo vai dizer. A Square já avisou que os próximos episódios talvez não demorem tanto quanto este primeiro levou em desenvolvimento, então talvez tenhamos notícias de um segundo episódio em breve.

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