Na trama, um grupo de pessoas ganha um final de semana de estadia na chamada Ilha da Fantasia. Uma locação paradisíaca administrada pelo misterioso Sr. Roarke (Michael Peña). Roarke diz que a ilha tem propriedades mágicas, que pode tornar qualquer fantasia realidade. Assim, o grupo de personagens começa a viver suas fantasias, mas elas não se desenvolvem como esperado.
De cara chama atenção a natureza unidimensional dos personagens. Gwen (Maggie Q) tem um trauma do passado, Patrick (Austin Stowell) quer se tornar militar para honrar o pai morto em serviço, Melanie (Lucy Hale) quer se vingar da patricinha que praticou bullying contra ela no colégio e os irmãos Brax (Jimmy O. Yang) e J.D (Ryan Hansen) querem festas e curtição.
É incrível que uma trama cuja premissa é a falta de limites da imaginação consiga ser tão pouco imaginativa. O que deveria ser uma viagem pelos desejos e medos mais íntimos desses personagens, um mergulho em suas subjetividades que poderia ser retratado com uma estética onírica, surreal ou delirante, é construída de maneiras bem genéricas. A fantasia de Patrick é basicamente uma versão de baixo orçamento de Platoon (1986), a de Melanie é um terror de tortura que parece um plágio ruim da franquia Jogos Mortais. Já a dos dois irmãos é uma série de festas, drogas e pessoas atraentes que nunca consegue evocar a devassidão e esbórnia de, por exemplo, as festas exageradas de O Lobo de Wall Street (2013).
Michael Peña se esforça para fazer algo parecido com o Roarke interpretado por Ricardo Montalban na série original, mas carece da aura de mistério e gravidade do ator. Em parte por causa do roteiro que insiste em explicar o passado e motivações de Roarke, o que remove muito da aura enigmática do personagem. Parte do problema é que Peña nunca vai além do mimetismo a Montalban, falhando em tornar o personagem propriamente seu.
As explicações sobre Roarke e o funcionamento da ilha acabam funcionando em uma espécie de paradoxo. Por um lado são respostas desinteressantes, que sacrificam todo o clima de mistério e suspense por explicações que falham em nos envolver naquele universo. Por outro, a explicação das regras é tão frouxa, tão vaga e tão mal elaborada que soam menos como algo planejado e mais como se os roteiristas fossem inventando tudo à medida que escreviam.
Tem algumas ideias interessantes jogadas no meio de toda bagunça conceitual que o filme tenta construir. A noção, por exemplo, de que a fantasia de um pode ser o pesadelo de outro poderia ser interessante se bem construída, já que fica sugerido que o vilão da fantasia dos dois irmãos seria também um hóspede vivendo a própria fantasia, mas à parte do diálogo em que isso fica subentendido, a ideia nunca é desenvolvida e o texto tem pouco a dizer sobre isso.
Na verdade, o filme tem muito pouco a dizer sobre praticamente tudo. Como rapidamente sai do regime do drama para o da comédia e para o terror, sem construir uma identidade coesa, que consiga unir suas abordagens, não dá conta do drama dos arcos de Patrick ou Gwen, não consegue ser propriamente engraçado no arco dos irmãos e assim por diante. Muito do terror fica restrito a sustos súbitos sem graça, com coisas aparecendo inesperadamente na tela seguidas de acordes impactantes da música, um expediente bem preguiçoso para tentar amedrontar a plateia.
Para piorar, o clímax do filme insiste tanto em inserir reviravoltas surpreendentes que perde de vista as próprias regras que tinha estabelecido para o funcionamento da ilha, com revelações que entram em contradição com o que fora dito sobre os personagens ou sobre as fantasias da ilha. A revelação final, sobre o motivo real de estarem ali, por exemplo não faz muito sentido. Primeiro porque mina o desenvolvimento de Melanie, deixando de ser alguém marcada por abuso e bullying para ser uma psicopata genérica completamente desequilibrada (o que acaba dando razão à patricinha que a zoava no colégio). Em segundo lugar porque isso implica que a personagem praticamente teve duas fantasias, o que em tese seria contra as regras.
Existem várias outras coisas mal explicadas, como as possibilidades dos personagens entrarem e interferirem um na fantasia do outro ou o fato de indivíduos que não estão ali como convidados e não terem bebido a água da fonte (portanto não estão realizando fantasias) ainda assim verem imagens e interagirem com construtos da ilha. Nada disso incomodaria se o filme não se desse ao trabalho de tentar criar uma mitologia em torno desse universo explicando o funcionamento das coisas.
Poderia ter mantido tudo no domínio da fantasia, mas ao escolher estabelecer um conjunto de regras e explicações para o funcionamento desses elementos sobrenaturais, o mínimo que se espera é que elas operem de modo coeso. Ao ignorar as próprias regras ou não desenvolvê-las com clareza, o filme cria a impressão de que “vale qualquer coisa” e isso mina a sensação de suspense porque não temos como formular expectativas claras do que pode acontecer, afinal a qualquer momento pode vir uma nova informação que irá contradizer ou ser pouco convincente em relação ao que foi previamente estabelecido.
Desprovido de imaginação, mistério, fascínio ou
encantamento, A Ilha da Fantasia
nunca faz jus ao seu ideal de imaginação sem limites, entregando um texto
bagunçado, rasteiro e repleto de indivíduos desinteressantes.
Nota: 2/10
Trailer
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