Na trama, Evandro (Júlio Andrade) e Carolina (Marjorie Estiano) são chamados para trabalhar em um hospital de campanha depois de um tempo prestando serviço em uma ONG atendendo pessoas carentes em localidades remotas. No hospital de campanha, encontram um cotidiano tenso ao lidarem com uma doença que ainda não entendem completamente, superlotação, falta de equipamento e riscos de contaminação. Ocasionalmente o texto derrapa em alguns diálogos um pouco didáticos e expositivos demais sobre as situações em que os personagens se encontram, mas são momentos pequenos diante da força que o especial consegue construir.
O especial consegue nos fazer sentir a tensão constante dos médicos em hospitais de campanha, correndo de um paciente para outro conforme os estados deles pioram, ver pacientes morrer dia após dia mesmo fazendo tudo possível para salvá-los e mesmo quando essas pessoas não possuíam nenhuma comorbidade que os colocasse em grupos de risco. Também mostra os dramas dos pacientes, isolados sem poderem receber visitas ou mesmo usarem celulares para se comunicarem com os parentes, mostrando como esse aspecto psicológico interfere no estado de saúde das pessoas.
Há uma sensação de perigo e temor constante tanto pelos médicos quanto pelos pacientes. No lado dos pacientes isso acontece pela própria natureza agressiva do vírus, na qual um paciente estável pode apresentar uma severa piora de uma hora para outra. Do lado dos médicos isso ocorre pelos riscos de contaminação de algo invisível em que qualquer manejo errado dos equipamentos de proteção os coloca em risco.
Até mesmo as proteções afetam o trabalho dos profissionais, como o fato de Evandro constantemente reclamar dos óculos ficarem embaçados, se desesperando e removendo o protetor facial num momento em que precisa realizar um procedimento delicado para tratar um paciente. O passado de Evandro, inclusive, é explorado no segundo episódio, nos fazendo entender melhor a devoção à profissão e como ele aprendeu a trabalhar sob circunstâncias desfavoráveis.
Outro elemento de tensão é a falta de recursos, mostrada como derivada de duas causas. Por um lado os recursos são escassos pelo próprio número elevado de infectados que chega todo dia. Por outro há a corrupção inerente da gestão pública brasileira, com superfaturamentos e compras inadequadas. Uma das cenas mais desesperadoras do episódio é justamente quando Carolina corre abrir os novos respiradores que chegaram no hospital para atender pacientes cujo estado se agravou e descobre que o que foi entregue não eram respiradores, mas equipamentos de anestesia.
Toda essa escassez leva os médicos a escolhas difíceis em relação a fazer gambiarras nos equipamentos ou ter que decidir entre quem vive e quem morre. O segundo episódio chama atenção para os perigos do negacionismo, explicitando como aqueles que agem de maneira irresponsável se expondo a aglomerações desnecessárias por não crerem na severidade da doença colocam a si mesmos e familiares em perigo.
O episódio, no entanto, não é apenas dor, tensão e desespero, lembrando também da necessidade de termos esperança e da importância de celebrar o trabalho dos profissionais de saúde que lidam com a doença. Carolina se aproxima de um paciente idoso e passa a saber mais sobre o passado dele, descobrindo que o homem era músico e parou de tocar depois da morte da esposa. Quando o estado desse paciente se agrava, Carolina usa o celular para tocar a Ode a Alegria de Beethoven na esperança de que isso o faça reagir, resultando em um dos momentos mais tocantes da narrativa. Outro poderoso momento de uso da música é o final do segundo episódio que traz uma canção original cantada por Gilberto Gil e Chico Buarque que serve como um farol de esperança e alento para tempos tão sombrios.
A imagem final do primeiro episódio, com Carolina tirando uma foto para o crachá serve como uma síntese perfeita da experiência da personagem ao longo da trama. O olhar está cansado, carregado de dor e pesar, o rosto carrega as marcas do equipamento de segurança quase como cicatrizes, mas ainda assim ela arrisca sorrir e esse esforço de encontrar uma expressão positiva em meio ao caos e a dor traz consigo a esperança para enfrentarmos tudo isso.
Repleto de tensão e de emoção, Sob Pressão: Plantão Covid é um exame poderoso do esforço dos
profissionais de saúde no combate à pandemia.
Nota: 9/10
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