quarta-feira, 11 de novembro de 2020

Rapsódias Revisitadas – Os Pássaros

Crítica – Os Pássaros

Review – Os Pássaros
Não sei se serei capaz de dizer algo sobre Os Pássaros, filme seminal de Alfred Hitchcock, que já não tenha sido dito antes. É um suspense de condução segura que trabalha para nos deixar à beira da poltrona em tensão mesmo que em um primeiro momento a ideia da ameaça principal soe um pouco risível. Afinal, ninguém pensaria que pássaros comuns poderiam ser tão aterrorizantes, no entanto é a condução segura do diretor e as situações inventivas que consegue criar ao redor da premissa.

Na trama a socialite Melanie (Tippi Hedren) viaja até uma cidadezinha no norte da Califórnia para encontrar Mitch (Rod Taylor), por quem talvez esteja interessada romanticamente. Chegando no local, no entanto, fenômenos estranhos começam a acontecer quando pássaros parecem atacar a população e os ataques vão se tornando cada vez mais frequentes.

O texto é inteligente o bastante para não explicar demais o que está acontecendo, se recusando a entregar uma motivação explícita para os ataques dos animais. Essa recusa é eficiente em termos de suspense porque o fato de não sabermos exatamente com o que esses personagens estão lidando ou como combater a ameaça torna tudo ainda mais incerto. Além disso, seria difícil dar uma explicação convincente que funcionasse para todo mundo, então deixar isso em aberto à imaginação do espectador serve para que o público projete seus medos e inquietações diante do estranho fenômeno. Sei que pode parecer óbvio falar disso hoje, mas essa é uma lição que muitos seguidores de Hitchcock ainda não pareceram captar, vide M. Night Shyamalan em Fim dos Tempos (2008) e as explicações risíveis que o filme dá.

A construção da tensão se dá aos poucos, com a primeira cena na loja de pássaros estabelecendo uma noção de normalidade e transmitindo a ideia de que o ser humano é capaz de controlar e conter a natureza. Pouco tempo depois temos a cena em que Melanie vai de barco até a casa de Mitch e é atacada por uma gaivota, uma situação incomum, que soa quase fortuita, mas que já nos deixa atentos de que algo errado está acontecendo. A partir daí as tensões são aumentando ao ponto em que basta vermos um grupo de pássaros empoleirados em qualquer canto para temermos pelo que pode acontecer.

Hitchcock costumeiramente dizia que gostava de construir suspense em cima de algo ruim que o público sabe que vai acontecer, mas que os personagens não sabem. Isso fica muito evidente na cena em que Melanie senta em um banco do lado de fora da escola na qual Annie (Suzanne Pleshette) trabalha. Enquanto Melanie fuma um cigarro, vemos mais e mais pássaros pousando nos brinquedos no parquinho atrás dela. A personagem está completamente de costas, sem ver a ameaça que cresce por trás dela, mas nós vemos e ficamos com medo por ela. A cena vai se estendendo até o limite da tensão, quando todo o parquinho está tomado por aves e é apenas aí, quando tudo está prestes a estourar, que Melanie repara no que está havendo.

Claro, os efeitos especiais dos grupos de aves atacando os personagens soam datados para os padrões de hoje (ainda assim são melhores do que os de Birdemic, por exemplo), mas o filme não deixa de funcionar por causa disso e o motivo é justamente a condução de Hitchcock. O som é outro aspecto importante, principalmente pelo modo como o som sugere a presença massiva das aves que atacam os personagens, com ruídos em alto volume, tão opressivos que chegam a causar agonia.

Desta forma, Os Pássaros é um excelente exemplo do domínio de Alfred Hitchcock na construção de suspense e tensão.


Trailer

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