Na trama, Mulan (Yifei Liu) é uma garota que se recusa a se resignar ao papel que a sociedade chinesa obriga as mulheres a se colocarem. Quando invasores estrangeiros liderados por Bori Khan (Jason Scott Lee) colocam a China em risco, o imperador obriga que cada família ceda um homem para o exército. Querendo evitar que seu idoso pai, Zhou (Tzi Ma), sirva no exército, Mulan rouba as armas e armaduras da família e vai se alistar fingindo ser homem, temendo que caso o segredo seja revelado sua família seja desonrada e ela seja executada.
O filme acerta no senso de escala e de aventura, trazendo as batalhas grandiosas e acrobáticas que se espera do gênero embora sem o lirismo e a fluidez de trabalhos de diretores com Zhang Yimou, por exemplo. A ação e o humor são o ponto alto do filme, em especial como as lutas ressaltam o quanto a bruxa Xianniang (Gong Li), que serve Bori Khan, é letal.
Por outro lado, o texto derrapa na construção do arco de Mulan e no modo como ela lida com as estruturas patriarcais de sua sociedade. Há méritos no modo como a jornada da personagem põe em questão a ideia de que o mundo não precisa ser dividido no binarismo de “coisas de homem” e “coisas de mulher”, no entanto, as escolhas do texto em como a personagem rompe com isso (ou não rompe, na verdade) são problemáticas.
Sim, Mulan é, ao final, aceita como igual pelo exército e pelos demais, a questão é que essa jornada de aceitação se dá sempre por parâmetros masculinos. A personagem precisa o tempo todo de permissão e aceitação de figuras masculinas para se sentir validada e ao colocá-la dependente desse poder masculino o tempo todo o filme apenas reforça as estruturas de poder vigentes. Chega a ser estranho que o texto encare a proposta que Xianniang faz a Mulan para que as duas se unam para lutar contra os regimes que as oprimem, afinal, naquele momento do filme, essa soa como uma escolha razoavelmente sensata.
Ao rejeitar a ideia de uma revolução ou de uma necessidade de colocar abaixo as estruturas machistas de poder que governam aquelas sociedades, a mensagem de independência feminina defendida no texto se perde completamente. Afinal, se Mulan depende o tempo todo da validação e permissão masculinas para fazer o que quer, então ela não se emancipou de fato. Sim, de certa forma esses elementos estavam presentes na animação original, mas isso foi há vinte anos e era de se imaginar que hoje essas questões fossem melhor resolvidas no remake, mas toda a ideia de Mulan como uma espécie de figura protofeminista é prejudicada pelo modo como o roteiro constrói o arco da personagem.
Apesar da qualidade das cenas de ação e de trazer ideias
importantes sobre emancipação feminina, Mulan
derrapa em uma execução que não alcança a mensagem que o filme demonstra
almejar.
Nota: 5/10
Trailer
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