quinta-feira, 14 de janeiro de 2021

Crítica – A Assistente

 

Análise Crítica – A Assistente

Review – A Assistente
A Assistente é um daqueles filmes em que o material de divulgação dá uma percepção muito errada do que a obra final é, o que pode deixar muitos espectadores frustrados. Os trailers dão a impressão que se trata de um thriller, cheio de suspense e tensão, mas o filme em si é um olhar bem naturalista, quase como um documentário observativo, de uma jovem que trabalha como assistente de um poderoso produtor claramente inspirado na figura de Harvey Weinstein.

Na trama, Jane (Julia Garner), trabalha como assistente pessoal de um produtor de cinema. Ela tem poucos meses nesse emprego, mas vê nele uma oportunidade de crescer na carreira profissional. Aos poucos, no entanto, ela começa a perceber condutas suspeitas de seu chefe, principalmente no modo como ele trata algumas das atrizes, modelos e funcionárias que passam por lá. Toda vez que pensa em falar alguma coisa sobre o que presencia, é imediatamente hostilizada pelos colegas ou superiores, que a lembram de como o chefe pode abrir portas para ela e ir contra ele é jogar a carreira fora.

É um olhar duro, seco e bastante naturalista sobre os mecanismos de poder que operam para proteger homens abusivos em altas posições intimidando e silenciando qualquer pessoa que tente se manifestar ao contrário. Se alguém tem qualquer dúvida dos motivos para que denúncias contra pessoas como Harvey Weinstein tenham demorado tanto para vir a tona, este filme explica de maneira realista o funcionamento das engrenagens que impediam que essas denúncias prosperassem.

Não há aqui grandes epifanias ou momentos intensos de tensão. Como falei antes, o olhar o filme tende ao realismo/naturalismo, quase como um documentário observacional, acompanhando o desenrolar do cotidiano da protagonista. Isso pode fazer o filme parecer “parado” para alguns, mas serve ao propósito de ilustrar o silenciamento cotidiano que acontece nesses locais de trabalho.

Ao invés de focar em grandes momentos ou em revelações bombásticas, a diretora Kitty Green prefere olhar para os pequenos momentos, para as micro agressões do dia a dia que fazem as pessoas ao redor se sentirem impotentes e até normalizarem as condutas abusivas do patrão. É um senso de realismo que poucos filmes conseguem alcançar e provavelmente este aqui é o que lida com a questão de maneira mais “pé no chão”. Isso, no entanto, não significa que não hajam momentos de tensão ou de drama, como a cena em que Jane vai ao RH para tentar avisar sobre a conduta do chefe, apenas para ser ameaçada pelo gestor de pessoal e tratada como uma funcionária cansada e invejosa do tratamento dado a outras colegas.

O chefe de Jane, por sinal, quase não é visto ou nomeado, apenas ouvimos a voz raivosa dele em algumas ligações, mas no geral ele permanece como uma figura elusiva. Ele é um fantasma, um espectro que assombra os corredores do local, uma força invisível que guia e oprime as condutas daqueles que ocupam seu espaço. Ele é mais uma representação simbólica das estruturas de poder que operam nesses espaços de trabalho do que um personagem plenamente realizado. O desfecho não traz nenhum grande aprendizado, nenhuma transformação significativa, apenas o pavor inquietante da resignação da protagonista em sua falta de voz, poder ou coragem para fazer alguma coisa.

Mesmo não dizendo nada de realmente novo sobre os temas que trata, a força de A Assistente reside no modo seco e direto como ele retrata um cotidiano de silenciamento que permite que predadores atuem sem consequência.

 

Nota: 8/10


Trailer

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