Na trama, Emma (Alexandra Daddario) é uma jovem atrapalhada, que constantemente se mete em problemas e não consegue manter um emprego. Durante um voo ela conhece Jack (Tyler Hoechlin) e acaba confidenciando a ele seus principais segredos durante uma violenta turbulência do avião. Ao voltar para o trabalho, Emma fica sabendo que o dono da empresa vai chegar para supervisionar a filial e descobre que ele é ninguém menos que Jack. Agora ela precisa saber como lidar com alguém que conhece seus segredos mais íntimos.
O roteiro tenta construir Emma como aquele clichê de comédias românticas como a jovem aparentemente banal, atrapalhada e sem confiança que não consegue fazer nada certo até que conhece um homem que abre seus horizontes e ela começa a por a vida no lugar. Tem vários problemas dentro dessa construção. O primeiro é que tanto o texto quanto a performance de Daddario pesam tanto a mão no lado desengonçado e esquisito da personagem que ela soa como uma completa lunática desequilibrada ao invés encantadora. Outro problema é que o texto tenta vender a ideia de Emma como essa garota sem graça, tão incapaz de chamar a atenção de qualquer homem que ela fica surpresa quando Jack demonstra interesse nela. Essa ideia cai por terra quando lembrando que a personagem tem a aparência de Alexandra Daddario, uma mulher extremamente atraente. Então quando ouvimos Emma falar sobre padrões de beleza é difícil comprar a insegurança da personagem, já que ela se encaixa completamente naquilo que seria considerado atraente.
Se por um lado temos Emma como uma mulher cheia de falhas, por outro Jack não possui absolutamente nenhuma. O personagem é um príncipe encantado perfeito durante boa parte da trama e relação entre dois não só é unilateral como nunca explica o motivo dele se sentir atraído por Emma. Sim, Jack explica que foram as confissões dela no avião, mas considerando que a personagem pende mais para doida do que para desengonçada, é difícil embarcar na ideia de que o alto executivo de uma empresa se apaixonaria por uma histérica que lhe revelou todas as intimidades durante uma turbulência. Além disso, incomoda que a relação deles consista em Emma idolatrar Jack enquanto ele é retratado como alguém magnânimo por estar dando oportunidade para que uma garota tão cheia de falhas como Emma esteja com alguém tão perfeito quanto ele.
Essa dinâmica da mulher cheia de problemas que é “resgatada” por um “príncipe encantado” transforma Emma em uma figura passiva, que precisa ser salva de sua vida de mediocridade por esse homem aparentemente perfeito já que de outro modo não conseguiria dar uma guinada na própria existência. Reproduzir essas noções anacrônicas em pleno século XXI, de que uma mulher só seria capaz de amadurecer quando um homem salvador aparecer em sua porta, é um desserviço.
O que já era ruim se torna muito pior quando Jack revela em uma entrevista na televisão todos os segredos íntimos que Emma lhe contou e a trama trabalha pesado em relativizar o comportamento do executivo e força a barra para atenuar as consequências. Realisticamente seria impossível que Emma conseguisse continuar trabalhando na empresa ou que conseguisse reconstruir a carreira por um bom tempo. O filme até mostra os colegas fazendo piadas e comentários maldosos, mas logo tudo é esquecido pelo roteiro.
Do mesmo modo, ter um alto executivo revelando em rede nacional as intimidades de uma funcionária com quem ele se relaciona certamente levantaria acusações de assédio a tal ponto que seria inviável ele se manter no cargo e causaria um enorme dano à imagem da empresa. Mais uma vez o filme até tenta abordar essa questão com a supervisora de Emma perguntando a ela se houve algum assédio, mas o momento é completamente sabotado pelo fato da supervisora dizer que conhece a boa índole de Jack, como que fazendo uma defesa prévia do personagem. É como se essa declaração anulasse a óbvia dinâmica de poder em jogo ou fato de Jack ser gente boa tornasse impossível que ele pudesse cometer assédio, sendo que assediadores comumente se apresentam como “caras legais”.
Para piorar tudo, o texto ainda tenta colocar Jack como uma vítima da situação ao inserir um mal entendido em que Jack crê que Emma iria contar as intimidades dele para um repórter. Assim que isso acontece, o filme parece esquecer a gravidade do que Jack fez (de novo, realisticamente ele teria acabado com a carreira de Emma) e constrói toda a situação como se Emma que devesse desculpas a Jack e as ações dele fossem um mero vacilo sem grandes consequências. Tudo isso soa manipulativo e desonesto, tentando forçar um enlace romântico quando não devia ter um e sequer temos motivos para torcer para que o casal termine junto, já que Jack se comportou como um babaca e Emma passa o filme inteiro agindo como uma lunática.
Os momentos de humor raramente funcionam, gerando mais vergonha ou irritação do risadas de fato. Gemma (Kimiko Glenn), por exemplo, deveria ser a amiga engraçada da protagonista que dá conselhos absurdos, mas ela é tão fútil, autocentrada e desagradável que mais causa incômodo do que gargalhadas. As cenas que o texto tenta fazer rir pela conduta desengonçada de Emma não funcionam porque é tudo tão exagerado que a protagonista não soa apenas como uma garota atrapalhada, mas como alguém tão incapaz de entender conduta humana básica que chega a ser surpreendente que ela consiga viver em sociedade.
Com personagens desinteressantes, humor que não funciona e
uma visão problemática sobre relacionamentos, Pode Guardar um Segredo? é um desastre do qual praticamente nada se
salva.
Nota: 3/10
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Um comentário:
Esse filme, com certeza, não é uma boa comédia romântica. Concordo muito nos pontos do texto sobre a conversa sobre assédio, como essa mulher perfeita fisicamente quer se passar como uma mulher comum e outros questionamentos.
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