A trama acompanha Luca, uma jovem criatura marinha que tem curiosidade em saber como é a vida na superfície. Um dia ele acidentalmente sai da água e descobre que assume uma forma humana quando não está molhado e decide explorar o mundo humano ao lado de Alberto, também um garoto monstro marinho que deseja se aventurar no mundo humano. O problema é que os humanos odeiam as criaturas marinhas, então eles precisam ter muito cuidado para não serem descobertos.
Há aqui uma metáfora sobre preconceito, sobre precisar esconder quem é para ser aceito e não sofrer violência. Nesse sentido, funciona como um símbolo para a população LGBTQIA+ que precisaria ficar “no armário” e muitos elementos do filme sustentam essa noção. O oceano surge aqui como esse espaço que limita o protagonista, que o obriga a se manter nas profundezas por medo de não mostrar ao mundo quem realmente é, inclusive com os pais de Luca querendo forçá-lo a viver em águas ainda mais profundas sob o argumento de protegê-lo. De maneira semelhante, o fato de Alberto viver enclausurado em uma antiga torre que parecia ser uma prisão no meio de uma ilha indica a sensação de aprisionamento de ter que viver sem poder ser quem se é de verdade.
A questão é que, assim como em Soul, o meio do filme abandona boa parte das metáforas e temas complexos para ser uma aventura bem genérica de amadurecimento, igual a tantas outras animações que assistimos. A partir do momento em que eles chegam na vila humana tudo passa a se enquadrar no molde da narrativa sobre as férias que mudaram a vida de um jovem, com direito a uma competição cuja vitória resolverá todos os problemas e um riquinho esnobe genérico como oponente. Tudo é quadrado e previsível demais (como também aconteceu em Dois Irmãos), longe daquela Pixar que nos surpreendia com tramas que nunca sabíamos exatamente onde tudo ia levar como Ratatouille (2007), Wall-E (2008), Up: Altas Aventuras (2009) ou Divertida Mente (2015).
O filme só se recupera próximo ao fim, quando volta a trabalhar com mais consistência os temas de preconceito e autoaceitação que apresenta, incluindo momentos de impacto emocional que remetem aos melhores momentos da Pixar, como a cena em que Alberto se revela para Giulia e Luca, ao invés de apoiá-lo e diminuir o medo da garota, escolhe ficar “no armário” e age com preconceito contra Alberto. É um momento forte, que remete ao modo como muitas pessoas, movidas por medo, acabam reproduzindo contra seus iguais o mesmo preconceito que ouvem daqueles que os odeiam. O desfecho, apesar de uma mensagem positiva de aceitação, ainda tem o cuidado de não romantizar demais o mundo em que vivemos, reconhecendo que algumas pessoas sempre terão preconceito contra quem é diferente e precisamos escolher quem temos ao nosso redor.
Construindo metáforas
inteligentes sobre autoaceitação, Luca nunca
aproveita plenamente o potencial de suas ideias, preferindo uma estrutura relativamente
derivativa em seu miolo, algo que infelizmente vem se tornando comum nas
produções da Pixar.
Nota: 6/10
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