A narrativa conta o passado de Snake Eyes (Henry Golding), que viu o pai ser assassinado quando era criança e passou a vida em busca de vingança. Ele recebe uma oportunidade de descobrir o passado quando o misterioso Kenta (Takehiro Hira) promete revelar a identidade do assassino se Snake conseguir se infiltrar no misterioso clã ninja Arashikage e roubar uma valiosa joia deles. Para tal, Snake deve se aproximar e obter a lealdade de Tommy (Andrew Koji), o atual herdeiro do clã.
Enquanto personagem, o principal atrativo de Snake Eyes sempre foi a aura de mistério ao redor dele, já que nunca víamos seu rosto nem ouvíamos sua voz por conta do voto de silêncio que ele tinha feito. Assim, contar a origem do personagem não é necessariamente uma boa ideia por desfazer aquilo que o tornava interessante. Claro, uma história bem contada poderia dar ainda mais impacto ao porquê de tanto mistério, mas não é o caso aqui.
A narrativa é inicialmente muito apressada em fazer Snake entrar para os Arashikage e passar nos testes, não dando o devido tempo para a devida construção da amizade entre ele e Tommy, o que seria necessário para dar impacto quando eles inevitavelmente se colocam em polos opostos. Ao mesmo tempo, lá pela metade, tudo cessa para poder inserir elementos de “construção de universo” posicionando toda a trama no meio de um conflito maior entre Joes e Cobras.
Os temas principais retornam lá pelo clímax quando o filme simplesmente decide empurrar com a barriga para um possível segundo filme os elementos principais da transformação de Snake. Sim, vemos ele se tornar Arashikage e receber seu icônico traje, mas a destruição do clã, o voto de silêncio e o ódio mútuo em relação a Tommy/Storm Shadow ficam para a próxima. É o tipo de problema que tem sido recorrente na Hollywood contemporânea, de filmes feitos para gerarem múltiplas continuações e que são lançados como produtos fragmentados, incompletos, que não conseguem se sustentar por conta própria e não tem garantias de que a história será finalizada (como aconteceu com a trilogia O Senhor dos Anéis que foi filmada de uma vez só).
Vimos isso em produções como A Múmia (2017), Monster Hunter (2020) ou Mortal Kombat (2021). Produtos tão preocupados em estabelecer elementos para continuações e spin offs que se esquecem de fazer funcionar o filme que estão realizando naquele momento e se a audiência não se conectar com aquela história. Nem toda narrativa precisa ser desenvolvida ao longo de múltiplas continuações e esse ímpeto de diluir uma história para render mais filmes sequer tem rendido bem nas bilheterias (como nos casos citados acima) então é inacreditável que Hollywood ainda não tenha aprendido a lição.
A trama ainda é prejudicada pelo fato de que muitos personagens tomam decisões estúpidas. Mesmo sabendo que a joia dos Arashikage é um artefato de grande poder e que Kenta trabalha para uma organização terrorista internacional, Snake não parece ver problema em dar a eles algo tão poderoso em nome de sua vingança apesar da trama querer posicionar o protagonista como alguém nobre e honrado. Do mesmo modo, é estúpido que Kenta e a Baronesa deixem Snake sozinho com o assassino do pai para que ele possa descobrir que a Cobra foi o responsável e Snake se volte contra eles. Os vilões poderiam simplesmente ter matado o sujeito diante de Snake e dado a questão como encerrada, mas não, resolveram arriscar dar tudo errado sem motivo nenhum.
Igualmente sem motivo são as decisões de Akiko (Haruka Habe) em poupar Snake mais de uma vez ao longo do filme. Ela sempre desconfiou dele e colocou o clã acima de tudo, mas decide interromper o teste final de Snake para salvá-lo, arriscando até expulsão do clã. Posteriormente, ao flagrar Snake roubando a joia, Akiko tem uma chance clara de matá-lo (de novo, naquele momento ela confirmou todas as piores suspeitas sobre Snake e coloca o clã acima de tudo) e ainda assim hesita. Por tudo que foi construído a respeito da personagem não há nada na narrativa que justifique essas decisões além da pura necessidade de roteiro.
Henry Golding já se mostrou um charmoso protagonista de comédias românticas em produções como Podres de Ricos (2018) ou Uma Segunda Chance Para Amar (2019), mas aqui não consegue dar conta da raiva contida, obstinada e da dimensão trágica de Snake. Além disso, o ator sofre com um sotaque estadunidense inconsistente, ocasionalmente escorregando para seu sotaque britânico nativo. Já Andrew Koji se sai melhor em construir o rancor crescente de Tommy em relação à Snake, bem como a personalidade impetuosa e irascível que acaba levando o personagem à ruína.
O pior, no entanto, são as sequências de ação. Contando com alguns dos melhores atores/artistas marciais em atividade hoje como Iko Uwais (assistam Operação Invasão), Andrew Koji ou Kenji Tanigaki, era se esperar que tivéssemos ótimas cenas de luta que aproveitassem o enorme talento desse elenco. O problema é que o diretor Robert Schwentke (responsável por alguns filmes da franquia Divergente e pela hecatombe RIPD: Agentes do Além) filma tudo com a mesma câmera epilética e montagem picotada que torna tudo caótico (de um jeito negativo), ininteligível, artificial e nauseante desperdiçando completamente os atores que tem. Como eu falei em meu texto sobre o péssimo 22 Milhas (2018) chega a ser um desrespeito ao talento desses atores filmá-los em ação de uma maneira tão displicente e desconjuntada. É como se alguém tivesse uma Ferrari, mas só dirigisse na primeira marcha.
No fim das contas, G.I Joe Origens: Snake Eyes não funciona
como uma história de origem para o personagem título, nem como uma introdução
ao universo dos G.I Joe ou tampouco como um filme de ação.
Nota: 3/10
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